Foto victor nogueira - Mindelo - Lugar da Igreja com o campanário da Igreja de S. João Evangelista 2016.10.07
Esta Rua da Igreja, que desce do Lugar do Outeiro até ao Largo onde entronca com a rectilínea Rua da Praia, que liga a EN 11 à Praia da Gafa, é uma via sinuosa, estreita, de largura variável no seu percurso, com as antigas casas de lavoura, como rua de (antiga) aldeia que é.
Como passa por baixo do viaduto ferroviário, prefiro utilizá-la em alternativa à Rua da Praia, que frequentemente tem as cancelas fechadas à passagem regular do Metro de Superfície, com filas de carros,por vezes longas.
Hoje fiz um teste científico com a pequena Dona Gertrudes. Estava a velhinha espojada no tapete e puz-lhe um boneco em cima dos olhos. A curiosa idosa jogou as mãos ao boneco e removeu-o dos olhos atirando-o com desdém para o lado. Como não queria que esta experiência fosse empírica mas sim ciêntífica, testei uma segunda vez. Coloquei boneco em cima dos olhos da anciã e mais uma vez, de imediato, o agarrou e jogou no chão como se uma beata de cigarro ilegal.
Dona Gertrudes já sabe que tem olhos e mãos e que coisas podem ser retiradas de coisas.
Mais tarde, estava eu a descascar fruta, olhando para a velha sentada na espreguiçadeira.
Vejo-a dobrar-se, agarrar o tapete com as duas mãos, esforçando-se por baixar ainda mais a cabeça ao nivel do chão, para espreitar debaixo do tapete.
Dona Gertrudes já sabe que existem coisas por baixo de coisas e quer saber que coisas são.
Foto do artista, tipo passe. Lisboa c. 1968 - A camisola inicialmente tricotada pela minha tia Lili, a meu pedido foi desmanchada tricotando ela uma nova, com outro desenho: gola alta.
Num dos anos em que fui a Luanda nas Férias Grandes, a D. Vitória em cuja casa de hóspedes eu vivia em évoraburgomedieval, foi mostrar, com elogios, o quarto do senhor Nogueira a duas das novas hóspedes, uma das quais, soube depois, ao ver esta foto que por lá estava, ficou de imediato encantada pelo retratado.
Victor Barroso Nogueira Ah. Ela, a Lili, era modista e fazia roupa para todos, os sobrinhos e as irmãs mais novas. :-)
Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.
Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.
Se um português marinheiro,
dos sete mares andarilho,
fosse quem sabe o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.
Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.
Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu,
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.
Que perfeito coração
no meu peito morreria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.
foto de família - O zé luís (1951 ) 1987) em Lisboa, com a bicicleta.
É TEMPO DE CHORAR
É tempo de chorar
silenciosamente
os nossos mortos
irmãos encerrados
encurralados
É tempo de chorar
enquanto
para lá desta hora
a vida se renova
por entre
………………..os bosques e
………………..os regatos
……………….. ........... sussurantes
………………...do imaginar o son(h) o estilhaçado
É tempo de chorar o tempo que voa!
.
……… (IN MEMORIAM do meu irmão Zé Luís, morto de morte matada
por ele próprio e por muitos outros no tempo
que para ele terminou naquela tarde de
26 de Fevereiro de 1987 ............................. )
Victor Nogueira - Poesia
1989.Fevereiro.03 - Setúbal
VER GALERIA PHOTOGRAPHICA EM Ecce Homo - fotografia e poesia
Tenho por norma, quando ando com ela ao colo, suportar o seu peso no meu antebraço direito.
Tenho também por norma, quando vejo a sua face, dar-lhe beijinhos. Quando a tenho ao meu colo a face está muito presente.
O que sucede? Tenho receio de lhe estar a encher o lado esquerdo da face de um carinho desproporcional, negligenciando seu lado direito.
Eu não acredito em signos, nem religiões, nem chacras energéticas do posicionamento das sanitas. Mas a verdade é que por vezes dou por mim a pensar de que forma carinho a mais no seu lado esquerdo lhe pode afectar a futura personalidade.
Mais uma máscara, neste Carnaval
de 2013 que em Setúbal pregou a partida à meteorologia não despejando catadupas
de água,
Nunca apreciei o Carnaval que era
tema de redações do estilo O Carnaval, A Primavera ou "Que
queres ser quando fores grande" Não me recordo de alguma vez ter-me
mascarado, quanto muito apenas uma caraça. Nas redações lá vinha a inevitável
referência "à carne a vala", da folia que antecedia a quaresma
das cinzas até à 6ª Feira Santa - em que se não podia ouvir música, antes
meditar na Paixão e Morte de Cristo, Nosso Senhor que ressuscitaria em grande
no Domingo de Páscoa, aquele em que pelo menos uma vez no ano se devia
comungar.
Mas retornando ao Carnaval,
sempre me causou uma certa perplexidade que em Portugal, sociedade machista de
pegas, toiros, engates e mulheres submissas ao estilo faduncho do "Não
Venhas Tarde!", de Carlos Ramos, homens pretensamente másculos se
disfarçassem de mulher. Do que recordo do Carnaval são as criancinhas
mascaradas e das brincadeiras estúpidas e de mau-gosto, como atirar farinha,
ovos ou urina para cima dos transeuntes. Farinha que em Luanda se lançava na
rua ou para dentro dos automóveis, obrigando-nos a fechar os vidros e trancar
as portas
Em Luanda havia também corsos
carnavalescos indígenas, animados e multicolores, que foram proibidos após o
início da guerra colonial em 1961.
Não me lembro de haver corsos carnavalescos
em Portugal antes do 25 de Abril como hoje existem, uma caricata e tola
imitação do Brasil, onde nesta altura está sol e faz calor - como em Luanda,
enquanto que em Portugal está frio e muitas vezes chove, obrigando as "corsantes"
quase despidas a tiritarem e baterem os dentes, como assisti uma vez na Moita,
em tarde de frio e chuva..
E "prontus",
amanhã tiro as máscaras e volto às fotos de perfil habituais.
O poema que se segue foi escrito
em Sousel e não em Évora.
Pesquisando na net nada encontrei
- nem fotos nem filmes sobre o carnaval em Luanda antes da independência. Devo
ter por aí fotos do Turismo de Angola da altura, mas não dá para procurar
agora. Encontrei apenas este curto filme sobre o Carnaval na Ilha de
Moçambique, nos anos 60 do passado milénio.
Ilha de Moçambique, anos 60, Carnaval no Macuti
Ah! Também encontrei filmes sobre o Carnaval de Ovar, da mesma época.
Notas soltas
(2010.02.15)
[15-02-2010 20:21:24] : Aqui tem chovido e feito muito frio, mas anteontem esteve um dia cheio e sol
.[15-02-2010 20:22:04] : Os cortejos carnavalescos é que devem estar lindos:
[15-02-2010 20:23:13] : as mulheres vão nos carros alegóricos quase despidas, como se estivéssemos no trópico sul e devem tremer de frio e encharcadas e os carros desfeitos
[15-02-2010 20:24:07] Em Portugal é agora hábito organizar os carnavais como no Brasil.
[15-02-2010 20:24:59] : Alguns têm muita fama, como os de Ovar e de Torres Vedras
[15-02-2010 20:27:15] : Agora no Brasil e em Angola faz muito calor mas aqui na europa faz frio
[15-02-2010 20:31:43] : Aqui as pesssoas mascaram-se e atiram farinha e ovos para cima das pessoas
[15-02-2010 20:32:39] : Os ovos é uma estupidez, pois as pessoas ficam todas sujas e por vezes com a roupa estragada
[16-02-2010 16:06:53] : Afinal não fui a Lisboa. À última da hora apercebi-me que ainda não é 4ª feira, mas sim 3ª feira, último dia de Carnaval.
Tempo de Carnaval
(2010.02.17)
É já noite. Terminou o Entrudo e
amanhã já é 4ª feira de Cinzas. O tempo tem estado frio, cinzento e chuvoso,
pouco apropriado a festividades e cortejos carnavalescos macaqueados do Brasil.
Lembro-me dum ano em que fui à Moita, numa tarde fria de inverno e as moças, em
trajes reduzidos, bailavam ao som da frialdade. Talvez me dê para colocar no Galeria
& Photomaton vídeos do Carnaval em Ovar e em Torres Vedras. A este
assisti uma vez quando a caminho das Caldas da Rainha me vi forçado a parar
devido aos condicionamentos do trânsito automóvel durante o desfile. Talvez de
ambos os carnavais tenha fotos que ainda não estão digitalizadas.
Em Setúbal houve desfile no
Parque das Escolas ou de José Afonso, ao qual o Rui assistiu com a Susana,
duma das janelas da casa dele. Eu fiquei em casa, que o tempo esteve desagradável.
Mas no sábado, pelas ruas e no Centro Comercial do Jumbo as crianças andavam
mascaradas.
Em Luanda no Carnaval atiravam
fuba (farinha) às pessoas, pelo que andavam com os vidros dos carros fechados,
ou esguichavam-nas com água. Para além disso havia os cortejos carnavalescos,
feitos pelos negros dos musseques, que foram proibidos após o início da guerra
em 1961 e que agora foram retomados. Aqui em Portugal há a mania de atirarem
com ovos para cima das pessoas; um ano ia a passear com uma amiga minha, em Oeiras, e ela
ficou com o cabelo todo empastado e o fato estragado, pelo que acabou então o
passeio.
E pronto, a conversa por hoje
está feita, com a sugestão de algumas hiperligações para posts relativos ao
Carnaval.
O quarto onde tenho dormido em
casa do senhor Cachopo - o da frente - é barulhento. ([1])
Toda a noite se ouvem motorizadas roncando e homens cantando com todas as
cordas vocais desafinadas. Numa das vezes ouvi cantar os versos duma das
canções dos "ensaiados",
no Carnaval. (MCG - 1973.04.02)
No Porto, 1963
(1963.02.24 a 27)
À tarde fomos todos dar uma
volta, a pé. Diverti-me imenso. Em casa, com duas pistolas de água, estivemos a
guerrear-nos. (…) As ruas estavam cheias de aficionados do S. L. Benfica e do
F. C. Porto, que hoje jogavam non Porto. Este último perdeu por 2 x 1, cedendo
o comando da classificação ao primeiro (Diário III 1963.02.24
Fui a casa do avô Luís passar o
dia. À tarde ele, eu e as minhas tiasinhas fomos lanchar ao Café Astória.
A Maria não foi. Depois de chegarmos a casa continuei a minha guerra com
pistolas de água, com a Maria. ([2])(Diário III 1963.02.26)
É hoje o último dia de férias do Carnaval.
Falei, pelo telefone, com a Maria. (Diário III 1963.02.27)
Em Luanda, 1959
(1959.02.10)
Mascarei-me de “cowboy”.
vesti as minhas calças à “cowboy”, camisola às riscas, um lenço ao pescoço,
máscara e um cinto com uma pistola. O cinto e a pistola tive no Natal.
O Zé não se mascarou.
(…) Depois andámos a ver a
animação que reinava pelas ruas. Mas que era pouca, porque ameaçava chover. Um rapaz
forçou o vidro da nossa carrinha e atirou com fuba lá para dentro.
(…) Ontem à tarde também vi dois
mascarados. Um deles levava uma máscara preta, uma toalha verde a tapar-lhe a
cabeça, umas calças remendadas, uns trapos a embrulharem as mãos, um casacão e
um cajado. O outro levava uma máscara de gato, um chapéu de palha, umas luvas
até aos cotovelos, umas calças com um pano multicolor, uma tábua e um saco roto
com latas vazias. Eles iam de tal maneira mascarados que nem sequer se via a
cor da pele nem os cabelos, para ver se eram brancos, pretos ou mestiços.(Diário II, 959.02.10)
Outras visões
(2013.02.12/13)
Ana Albuquerque Apesar
de não ser apreciadora da época carnavalesca, sempre te digo que nos anos 60, o
Carnaval do Estoril era muito badalado e tinha carros bem mais produzidos do
que alguns que agora desfilam. As vedetas convidadas eram quase sempre actrizes
francesas ou italianas.
Clara Roque Esteves Olá
amigo. Eu também nunca fui fã do Carnaval. Recordo, na juventude, os meus
bailes de garagem com os amigos do MEU GRUPO. (sempre vivi muito em grupo...).
Fazíamos uns disparates banais, dançávamos e nada que não fizéssemos em outras
circunstâncias. Dos tempo de África nem memórias tenho do Carnaval.
Depois...sorte porque as minhas filhas também nunca foram fãs. Portanto, o
Carnaval era uma oportunidade de sair de Lisboa e passar esses dias fora. O fotógrafo
não está mal. Obrigada pela partilha. Ah, este Carnaval foi igual aos outros,
apenas um encontro de família, conversa e conversa...
Victor NogueiraClara Roque
Esteves e Ana Albuquerque Pesquisando na net nada encontrei -
nem fotos nem filmes sobre o carnaval em Luanda antes da independência. Devo
ter por aí fotos do Turismo de Angola da altura, mas não dá para procurar
agora. Encontrei apenas este curto filme sobre o Carnaval na Ilha de
Moçambique, nos anos 60 do passado milénio.
Ah! Tb encontrei filmes sobre o
Carnaval de Ovar, da mesma época.
Clara Roque Esteves Amigo,
por acaso visitei a Ilha de Moçambique nos anos sessenta, fora da época
carnavalesca. Honestamente não registei memórias de Carnaval em África e vim de
Moçambique entre os 17 e os 18 anos, como já te disse. Frequentava desde os 15
discotecas ou bailes de garagem. Por cá, o mesmo programa. O Carnaval foi
sempre pretexto para férias. Obrigada pelo video, vou abri-lo agora. Beijinho.
Manuela Silva Na minha
infância e juventude, Carnaval era a véspera da Quaresma, que aí vinham 40 dias
de silêncio, orações e terços, jejuns às sextas, e carne quase nenhuma durante
esses 40 dias. E pronto. Carnaval era o dia em que se podia exagerar em tudo,
carne, vinho (para os adultos, claro), chegando mesmo a cometer o pecado da
gula com prazer redobrado, pensando nas carências que aí vinham. Apenas assisti
uma vez a um desfile fora de Portugal.
Nem música se podia ouvir durante
a Quaresma, imaginem!
Clara Roque EstevesManuela Silva,
em Coimbra estive alojada num lar de freiras. Mas já estava na faculdade e elas
não tinham hipótese de nos controlar... Vitor Victor Nogueira,
já consegui ver o video da Ilha de Moçambique. Uma delícia enquanto recordação.
Carnaval "à branco"...rásparta!
Judite Faquinha Eu
nunca liguei ao carnaval, é uma brincadeira que não me diz nada...dentro dos
meus trinta anos cheguei a mascarar-me para seis jovens poderem sair e aos
bailaricos, eu ia e as mães deichavam-nas ir porque iam comigo e o meu
marido!!! O filme da ilha de Moçambique na caça sub/ aquática, está linda adoro
ver!!! tenho uma amiga de Moçambique!!! Eu hoje fui ver o carnaval a Setubal, e
ao Pinhal Novo mas, não me diz nada os foliões não lhe acho qualquer graça bjs
Carlos Rodrigues Bom
o enterro do Carnaval já foi no dia 12 e só hoje vi a tua postal fotografado
fotografado em flagrante delito. Já Pessoa, com ou sem Carnaval, foi muitas
vezes apanhado no Martinho da Arcada em " flagrante de Litro "...O
Poeta tem ferramentas que nem a ferramenta sabe. A propósito nem todos os
Carnavais Portugueses são Brasileiros, em Torres Vedras terra de boas cepas
ainda se bebe do puro, quer dizer com matrafonas, caricaturas, Rei e Raínha
Nacionais e esse Carnaval já vem do tempo da outra Senhora, é anterior ao 25 de
Abril, a crítica social e os Corsos não vem de agora. Obrigado e diverte-te, o
Carnaval continua...
Galeria Fotográfica
Carnaval em Luanda –
postal ilustrado – CITA, anos ‘60
Porto – Coliseu dos
Recreios – Carnaval (1967 03 24)
Évora, 1980 (foto Victor Nogueira)
Setúbal 1983 (fotos
Victor Nogueira)
Setúbal 1984 (fotos Victor Nogueira)
Setúbal 1985 (foto
Victor Nogueira)
Setúbal e Palmela
1986 (?) (foto Victor Nogueira)
[1]
Largo da Torre do Relógio, uma igreja arruinada
[2]
- Trata-se da Maria Fernanda, que por essa altura se despediu, pois ia para a
terra, em Pico de S. Cristóvão (Vila Verde) para cuidar da mãe, doente, que
precisava dela. (Diário III pag 148).
Foto de família - o regresso a Luanda, em Maio de 1974, após a "licença graciosa".
Completamente alheia ao terramoto que foi o 25 de Abril, a minha mãe regressou a Luanda.
Em 1966 vim para Portugal, prosseguir estudos universitários, num país que então já era para mim o "estrangeiro"
As minhas idas a Luanda a partir de 1967 acabavam em "tragédia" com o meu pai, contra a minha vontade, puxando a conversa para a política e eu lhe contrapunha que aquela era uma guerra perdida e que a independência de Angola era inevitável, quer com um regime multi-racial como o preconizado pelo MPLA, quer com um regime da minoria branca, como o de Ian Smith na Rodésia do Sul,
Se havia "censura" em Portugal, a partir de 1961 ela passou a ser férrea em Angola, até aí mais liberal, com a autêntica manipulação de que "Angola é nossa", mesmo influenciando quem até aí não era afecto a Salazar e defendia a independência de Angola face a Portugal.+
A ironia é que o regresso tenha sido feito no transatlântico "Infante D. Henrique", da Companhia Colonial de Navegação (CCN), e que a tragédia tenha sido o chamado "retorno" a Portugal de centenas de milhares brancos e negros, pouco depois, muitos dos quais nunca tinham estado em Portugal ou que de alma e coração, como o meu pai, se consideravam não portugueses, mas angolanos, que a long time ago haviam preconizado a independência de Angola multirracial, como defendia o MPLA.
A tragédia é que muitos brancos acabassem a defender a UNITA, um movimento racista e trIbalista, apoiado pela PIDE e pela a União Sul-Africana, a do "apartheid".
Porque em abono da verdade se diga, nem o Manuel nem a Maria Emília, alguma vez foram racistas ou defenderam o apartheid.
Foto jj castro ferreira - baía de Luanda - c. 1959
* Victor Nogueira
Em 1961 para a disciplina de Português escrevi uma redacção sobre Luanda, semanas depois do 4 de Fevereiro e do 15 de Março, que marcam o início da Guerra Colonial ou de Libertação, então ausentes deste texto, como sendo de menor ou nenhuma consciência das futuras implicações e consequências.
Sendo na altura um adolescente,o texto de então não reflecte nem regista que praticamente desde o início Luanda era um porto de saída do tráfico negreiro para as plantações e engenhos das Américas e que a finalidade de Salvador Correia e da sua Armada era simplesmente colocar o tráfico esclavagista nas mãos do Brasil, com a expulsão dos Holandeses. Nada disto era dito ou dado a conhecer nas aulas de Português ou de História ou referido nos livros que tinham de passar pela "censura". Nem há qualquer referência à outra Luanda, a dos musseques, sem condições de habitabilidade e salubridade.
~~~~~~~~~~~~~~
«A cidade de S. Paulo da Assunção de Luanda foi fundada em
1575 pelo Governador e Capitão Mor das Conquistas do Reino de Angola, Paulo
Dias de Novais na ilha fronteira. Decorrido um ano o burgo foi transferido para
o continente, onde foi crescendo ao redor do Morro de S. Miguel, tendo sido
elevado à categoria de cidade pelo Governador Geral Manuel Cerveira Pereira.
(1606)
As primeiras perturbações causadas pelos holandeses à
florescente cidade deram-se em 1624. Até 1648 o sossego não se restabeleceu.
Neste ano Salvador Correia de Sá e Benevides, que havia reconquistado várias
terras do Brasil, aos holandeses, foi encarregado de libertar Angola do jugo
holandês. A 15 de Agosto, com 900 homens de armas, tomou de assalto o Forte de
S. Miguel. Desde este dia (Assunção de Nossa Senhora) a cidade tomou
o nome de S. Paulo da Assunção de Luanda.
A cidade, muito danificada pelos holandeses, reedificou se
rapidamente, sendo actualmente [1961] uma das primeiras de Portugal.
Em alvarás de 1662 foram concedidos aos moradores da cidade
os mesmos privilégios dos cidadãos da cidade do Porto, em consideração aos
serviços prestados à Restauração de Angola. Desde então o seu brasão de armas,
no qual figuram a Virgem e S. Paulo, ficou "para sempre registado nos arquivos da Torre do Tombo", entre
os das outras cidades e vilas portuguesas.
A cidade desenvolveu-se rapidamente após a sua fundação. No
século XVII possuía quatro fortalezas, além das de Santo António, S. Miguel,
Penedo e Santa Cruz, seis igrejas, Conventos dos Jesuítas e dos Terceiros
Franciscanos, Hospital da Misericórdia e muitas habitações. Foi neste século
que se erigiu a Ermida de N. Sra. da Nazaré, em memória da Batalha de Ambuíla
(1665). No século XVIII construíram-se muitos edifícios de vulto, como sejam o
Forte de S. Pedro da Barra, o Quartel de Infantaria (demolido) o Palácio do
Governo (1761) e a Alfândega (1770/79). O actual Quartel da
PSP (Polícia de Segurança Pública) foi fundado em 1754, sendo nesse
tempo o Quartel de Cavalaria.
No século passado os principais edifícios foram o Mercado da
Quitanda (1818), o Cemitério do Alto das Cruzes (1806) e o Hospital de D. Maria
Pia. Neste século [XX] construíram se outros edifícios grandiosos, como o Banco
de Angola, o Liceu Salvador Correia, [o Liceu] D. Guiomar de Lencastre (em
construção), a Escola Industrial, a Igreja de S. Paulo (em construção), o
edifício da Fazenda e Contabilidade, o porto de mar, o Aeroporto Craveiro
Lopes, os cinemas "Restauração" -
um dos melhores do Império Português - e "Miramar", ampliação do Hospital D. Maria Pia, o Seminário, o
Colégio [feminino] de S. José de Cluny e muitos outros prédios de envergadura,
além de modernos "arranha céus".
Vista do mar, a cidade parece como que disposta em
anfiteatro, em escadaria. No primeiro plano a Avenida Paulo Dias de Novais,
ladeada de palmeiras e com prédios de cinco e mais andares. E, em planos
sucessivos, vê-se uma amálgama de prédios modernos a par de prédios de dezenas
de anos.
Distinguem se duas partes na cidade: a Baixa e a
Alta. Na Baixa, de traçado antigo, na maioria das vezes, encontramos
a zona comercial, com modernos prédios e prédios antigos, de séculos. Esta é o
coração da cidade, com as suas casas comerciais, armazéns, pastelarias, cinemas
e os seus prédios de apartamentos.
Na Alta, de traçado moderno, encontram se largas
avenidas arborizadas, como as dos Combatentes, Paiva Couceiro e Brasil,
ladeadas umas por monstros de cimento armado, os arranha céus, outras por
graciosas moradias térreas, na sua maioria ajardinadas.
Como isto contrasta com a Luanda de há 20 anos [a Luanda dos
anos 40], uma Luanda triste, de ruas escuras e mal calcetadas, casas de
adobe, baixas e frias!!! Muito se fez nestes vinte anos, mas há ainda muito a
fazer. Tem bairros operários, de funcionários, para indígenas, populares, e
bairros elegantes, [como o de Miramar].
Aos domingos os habitantes deslocam-se para as praias de
Luanda, como sejam as da Ilha do Cabo, Samba, Corimba e tantas outras. À noite
frequentam-se as elegantes "boites" e
exibem se filmes nos cinco principais cinemas da cidade.
Enfim, Luanda é uma cidade moderna, que se desenvolveu prodigiosamente e
que muito mais se desenvolverá num futuro próximo. Pode orgulhar-se, com
justiça, de 1ª cidade do Ultramar Português e 3ª de Portugal.» ( [1])
[1]
- Dum exercício de Português (5º ano Liceal), no Colégio Cristo Rei, dos Irmãos
Maristas, em Luanda.
~~~~~~~~~~~~~~~~~~
Em 1963 registava eu no meu Diário:
«Em Luanda inaugurou se um novo cinema, o Ngola. É o segundo
desde que estou na Metrópole. O outro foi o S. João. Já são sete cinemas,
embora dois não sejam de 1ª categoria: o Nacional [cine teatro] e o Colonial.
(Isto sem contar os cinemas de bairro! Estou certo que irei encontrar grandes
diferenças na minha querida cidade.» (1963.11.22 - Diário IV)
~~~~~~~~~~~~~~~~~~
Em 1967 o meu entusiasmo era menor:
«Tenho tido as mais desencontradas notícias da cidade de S.
Paulo e da Virgem, vulgo Luanda: a mesma pasmaceira de sempre, o atraso de vida
do costume, muitos prédios e ruas novas. Talvez não sejam tão desencontradas
como isso.» (ADP - 1967.11.21)
O aceso à ilha fazia-se através dum aterro fronteiro ao morro de S. Miguel, aterro esse que a cindiu em duas. Nessa zona, na restinga, situavam-se restaurantes e cervejarias, como o “Mar e Sol”, algumas boîtes/dancings, residências de habitação e o Clube Desportivo Nun’Álvares, com a sua piscina e campos de jogos. Mais para diante encontrava-se uma sanzala de pescadores em torno da Igreja de N. Senhora do Cabo e, mais para norte, o Parque Florestal, com as suas praia e zonas para picnics e merendas.
Este parque florestal de acesso automóvel condicionado tinha uma agradável praia, embora com alguns fundões, num dos quais ia morrendo afogado. Não sabendo nadar, em miúdo fui ao fundo várias vezes e quando pensava que já lá ficaria senti agarrarem-me o pulso, puxando-me para terra enquanto me diziam: "Tiveste sorte, pois pensava que estavas a brincar." Com efeito, uma das brincadeiras de alguns miúdos era esbracejarem, fingindo que estavam a afogar-se. E assim fiquei algum tempo estendido no areal da praia, respirando em grandes haustos, sem nada contar aos meus pais.
Numa das fotos estão os meus pais e duas amigas da família. À esquerda a D. Alice Quaresma e à direita a D. Noémia Castelo. Do casal Castelo já falei noutro post: Em Luanda, no Parque Florestal da Ilha do Cabo. A D. Alice era viúva dum capitão do exército. Conseguiu ser aprovada no exame de condução automóvel, após imensas tentativas malogradas, e eu comentava que lhe haviam concedido a carta por antiguidade. No dia seguinte convidou a minha mãe para dar uma volta, mas deve ter pregado grandes sustos pois a minha mãe disse-nos que nunca mais sairia com ela ao volante. Já em Portugal, depois do 25 de Abril, a D. Alice comentava-me que não percebia como eu conseguia ler tantos jornais por dia, pois ela lia uma página e ficava cansada, que ler tanto me fazia mal à minha saúde.
E para
terminar, uma descrição minha dum dia no Parque Florestal da Ilha do Cabo
1. - Parque Florestal da Ilha do Cabo (Luanda)
1963/64
Ouve-se o marulhar das águas. Além, um tractor. No mar [na
baía] um barco evoluciona e as gaivotas mergulham pescando. Um barco de guerra
entra na baía. É o F331. Uma criança chora. Provavelmente alguém desabafou a
sua fúria sobre ela. Mas o ruído predominante é o do marulhar das ondas. A
temperatura ideal seria a de agora. Ali os trabalhadores pousam as pás à sombra
de um pinheiro. Lá longe, do outro lado, a chaminé da SECIL [fábrica
cimenteira] deixou de lançar para a atmosfera o elegante penacho de fumo
branco. Mas, será que está trovejando? Eis que uma breve aragem faz com que as
folhas das palmeiras entrem nesta sinfonia da natureza. Não, aquilo deve ser um
avião e não a trovoada. Mas parece estar sempre no mesmo sítio. Através dos
pinheiros, naquela curva, divisa-se ainda o navio de guerra. Nesta sinfonia há
instrumentos que não consigo identificar. Que paz, nada de yé-yés; só,
completamente entregue à contemplação desta maravilha, sempre diferente, que é a natureza.
Os pescadores acabam de puxar o dongo [canoa, piroga] para a
praia. O Zé come pão-de-ló. Hoje resolveu ocupar o meu lugar de comilão mor.
Duas gaivotas, elegantes na sua alvura, passeiam à beira-mar. Aquele barco
ancorado dança vagarosamente ao sabor das ondas. Gostaria de poder descrever
isto tudo, não em prosa, não em verso, mas musicalmente.
Notas finais: lado negativo: moscas, praia suja, água fria.
In «Victor Nogueira - Viagens - memórias e registos - volume I – África»
Com Alice Quaresma e Noémia Castelo
Os Nogueira da Silva e os Almeida, no aniversário do Rui Almeida, em 1962. O Rui era afilhado dos meus pais e a mãe dele era muito bonita e o pai, mestre-de-obras, trabalhava para o meu pai na construção civil
Com o casal Castelo
***
Pescador (1)
Pescadores lançando a
tarrafa (postal ilustrado VN)
Este era um dos métodos de pesca. O outro consistia em várias pirogas lançarem
a rede, recolhendo-a depois carregada de peixe. O meu pai comprou uma tarrafa
aos pescadores da ilha, que teciam ou remendavam as redes sentados no areal. No
paredão da Praia do Bispo havia quem na maré cheia pescasse à linha ou com
cana, mas nunca tive paciência para estar ali quieto à espera que o peixe
mordesse, apesar do meu pai me ter oferecido uma cana de pesca.
Pescador da Ilha do Cabo cosendo as redes - desenho de Hipólito de Andrade