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Pointe Noire (Africa Ocidental Francesa)
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Ponta Negra é bonita mas Luanda é mais. Tenho falado francês. Aqui trabalha se todos os dias, até ao domingo. (MEB - 1958.08.12)
Vim a Ponta Negra pela 2ª vez. Isto é uma cidade muito pacata. A vida é monótona. Espero aqui voltar 3ª vez. A maioria da população é portuguesa. (...) Tenho ido bastantes vezes ao cinema. Aqui num mês fui mais vezes ao cinema do que durante um ano em Luanda. (MLF - 1959.07.27) Os pretos, como não sabem o meu nome, chamam me "Le Portugais", tanto na loja como na rua. (...) Um deles disse que eu tinha cara de francês. Que pouca sorte a minha. (MEB - 1959.07.27)
Eu não sei escrever cartas sem ser em estilo telegráfico, pois a minha vida aqui é sempre igual. (MNS - 1959.08.05)
Em Ponta Negra a minha vida era quase sempre a mesma. (...) Nas primeiras semanas eu ia brincar a casa do Zé Vieira e vice versa. Geralmente praticávamos tiro ao alvo ou caçávamos pássaros com espingardas de chumbos. Um dia, por certas razões, deixei de ir a casa dele e vice versa (outra vez!) Em casa dele andei várias vezes de bicicleta.
Lia quase todos os dias umas quatro horas e passava uma ou duas horas a falar francês com o lavadeiro. Ultimamente passava muito tempo na loja a falar francês com os clientes. Algumas vezes ia a casa da Maria Alice, a noiva do Correia Martins. Almocei lá uma vez e jantei no dia em que o C.M. a pediu em casamento.
À noitinha o sr. Gaspar e o João iam ao Correio e à Livraria e eu aproveitava e ia com eles. Algumas vezes saia também com o João.
Ao princípio eu dormia com o João, mas depois, por causa dumas discussões que tive com ele, mudei para o quarto do lado.
Ia todos os domingos à missa, excepto no último. E ia sempre à missa das 8 horas. Só umas duas ou três vezes é que a D. Alice foi comigo.
Assisti aos aniversários do Zé Vieira, duma rapariga conhecida do João. Almocei duas vezes em casa do Zé Vieira. Na véspera da minha partida fui convidado por ele, mas recusei.
Quase todas as terças feiras ia ao Correio comprar selos e despachar as cartas. Escrevi vinte e uma cartas: cinco ao pai (3), três ao José João (2), oito à mãe (6), duas à Gininha (0), uma ao avô Zé Luís (0), uma à Maria Luísa (0), uma ao Espinheira Rio (1). Os números entre parênteses indicam o número de cartas que recebi em resposta. Não recebi resposta a nove cartas.
Fui a dez matinées e onze soirées. Vi 25 filmes. Todas as terças feiras e algumas vezes à quarta havia dois filmes à noite, num dos cinemas.
Em Ponta Negra comprei quatro livros e uma lembrança, além de várias coisas que necessitava. (MEB - 1959.09.04)
Li o livro "Fabíola", do Cardeal Wiseman. Trata das perseguições aos cristãos no século IV. À tarde fui ver o filme "Cinq Fusils à l'Ouest", no Vox. De manhã fui ver a parada militar. Além do desfile dos soldados, desfilaram "jeeps", ambulâncias do exército, camiões de transporte de tropas e carros blindados. Os tanques de guerra não desfilaram. Sobrevoaram a cidade quatro aviões militares. Foram condecorados três oficiais. (Diário II - 1959.07.14) Quando tocaram a "Marselhesa" [hino nacional francês] andava eu a passear dum lado para o outro. Só depois é que soube que me devia ter perfilado. (Nota - Diário III - pag. 117) (1)
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1 - Da casa de Pontas Negra pouco me recordo já. Era um edifício grande, com dois pisos e um quintal nas traseiras. No piso térreo os armazéns e a loja e no superior a casa de habitação. Na loja vendia-se de de tudo e ainda hoje o cheiro a panos e a bacalhau traz-me à memória a loja e o seu conteúdo. Pouco mais me recordo para além do que ficou acima registado e nas poucas fotografias. Lembro-me qua havia um lavadeiro preto, o que me causou alguma perplexidade então, pois tal tarefa em Luanda era feminina. Com este empregado tinha longas conversas em francês.
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