domingo, 22 de setembro de 2013

( a poesia nas palavras em setembro 04 )

22 de Setembro de 2013 às 13:47

* Victor Nogueira

7. PROSEANDO

BREVE CRÓNICA DAS VENTURAS, DESVENTURAS E AVENTURAS QUE ENVOLVEM JOÃO DO MAU TROVEJAR E A SENHORA RAINHA D.URRACA DA PERDIÇÃO OU DE COMO AS APARUDÊNCIAS PODEM (DES)ILUDIR COMO SE VERÁ SE PACIÊNCIA E JEITO HOUVER.

E a primeira aparudência, disse o contador de histórias, é mesmo esta, pois trata-se dum relato que envolve outras personagens que são o João Bimbelo também conhecido por João Baptista Cansado da Guerra e a Sedutoramente Inominável Princesa do Meio Caminho (Des)Andado Com Sabor a Cravo e Canela, da Pele Doce e Mais Repousante Que Mil Calmantes, Mais Bela e Sedutora Que Mil Sóis Para Lá das Luas. E o contador de histórias fez uma vénia ao público que enchia a praça, o barrete varrendo o chão antes de se atirar ao ar para dar cinco rápidas piruetas, até que ficou nova mente em pé prosseguindo sentado no fosso da orquestra:

A peça que hoje ides ver conta-vos sobre dois complicadinhos, que andam por aqui às voltas, às voltas, deixando correr o tempo como a água por uma vasilha furada. E dizendo isto o nar­rador de histórias sumiu-se, dando lugar a uma cena toda imaginada.

Ao centro, uma mesa com toalha rendada e baixela de prata, iluminada por um candelabro de mil-velas; em surdina uma envolvente e suave música. O ar estava parado, suspenso, e nem uma agulha bolia na quieta melancolia dos pinheiros do caminho, ao longo dos quais (ou do qual?) se avistam dois personagens, um de passada larga e blusão atirado pelosombros, a boca cerrada como lâmina, e outro de passinho lento, com vestes de outro tempo, oscilando entre a seriedade e o riso. De súbito, oh! céus, o ar ficou ainda mais parado quando o olhar de ambos se cruzou, tão parado que ambos levaram a mão ao respectivo pescoço exclamando em uníssono: Oh! minha (oh! meu) que é isto que me trespassa o coração, me cria esta afobação, me provoca esta sufocação, me enche de transpiração, me tira a quietação?!!!

Inquietos  e deslumbrados, os nossos personagens entraram numa dança do ora avanço eu, ora recuas tu, ora rio, ora choras, ora apareces tu, ora desapareço eu, enchendo o ar de poeira e levantamento que obscureceram a cena, não obstante a claridade do dia e a beleza da praça.

Vai daí o narrador voltou ao proscénio com um enorme espanejador para pôr tudo nos assentos e os is nas pontas, permi­tindo o regresso da calmaria, que veio encontrar os nossos personagens sentados no chão, lado a lado ou frente a frente, as pernas cruzadas como os índios quando se sentam em círculo aspirando a fumaça do cachimbo da paz.

Mas não havia paz pois havia demasiada gente à volta, cada um com sua faladura ou com sua ouvidura pelo que os nossos personagens voltaram à cena inicial, em busca da hora bela e serena, à volta da mesa  com toalha de linho rendada e baixela de prata. E João Bimbelo acercou-se de Joana Ratinho, inebriado pelo seu perfume. João trazia em suas mãos um alaúde e Joana dedilhava a cítara que havia  pertencido a Circe e Vénus, ambos entoando uma cantiga de amigo serena e calma, intitulada PORQUÊ TANTO SILÊNCIO E PALA­VRAS?,  cujo mote era o seguinte:

Se o ar é tão belo e calmo
E o mar tão verde e sereno
Porquê esconder que te amo
Seduzido girassol moreno ?

Era uma canção bela, como belo é o canto da sereia que chama os marinheiros que ousam desbravar os caminhos do mar; era uma canção suave e delicada como delicado é o vento que acaricia o rosto dos viandantes. Era uma canção bela, porque a pergunta, era um casulo, uma crisálida que encerrava em si mil águias como borboletas esvoaçando em torno do arco íris num campo descoberto. De súbito João e Joana suspenderam o seu canto e fitaram-se como quem descobre a fragilidade do nascer do sol, porque haviam desco­berto, nas voltas por vezes ensombrantes, que eram simultaneamente amador e coisa amada.

Deste modo foi desvendado o mistério da princesa, andado que fora o meio caminho que possibilitou que João e Joana saltassem a frági1 barreira que os separava na imensidão dos dias, enquanto a música se desenvolvia num crescendo arrebatador  que polvilhava o ar de estrelas e o céu de aves onde finalmente a brisa e os regatos corriam livremente.

Para lá do silêncio inominável de Joana, o narrador che­gou ao proscénio porque talvez não fosse ainda o tempo dos nossos personagens juntarem sua porta e panela, embora fosse esse o desejo de João. E chegando ao proscénio, narrou João que era chegado o tempo de ambos, ele e ela, se beijarem livremente, porque já era chegado o tempo de juntar a corte de cada um e de, gomo a gomo, desfolharem o cetim aveludado que os envolvia, de procurarem a sombra fulva, ardente e fresca do sol, de buscarem o sabor agridoce e almiscarado da cisterna, de traçarem em seus corpos o mapa do dese­jo, de encherem o ar com o perfume inebriante do mosto..

E assim modo se apartaram as sombras que ensombravam o caminho e a claridade encheu o mundo na ventura da aventura por eles talhada, porque João e Joana se haviam finalmente encontrado para lá da fragilidade dos seus receios e das suas mágoas, tornando-se cavaleiro e dama um do outro.

Deste modo havia João enviado suas mensagens à Sedutoramente Inominável Princesa e na volta soubera que também ela estava enamorada dele, que era tempo de finalmente descansarem um no outro, pondo termo a uma guerra que durava desde o seu achamento numa cur­va da estrada, quatro luas atrás.

Por isso o viageiro pegou nas suas histórias e fechou o desencanto porque finalmente João e Joana se haviam encontrado e em si o porto e a maré que cada um deles buscara no outro, enterrando definitivamente o senhorito do Mau Trovagir e a senhora Rainha D. Urraca, personagens embirrantes sem razão  de ser.


1989.09.30
SETUBAL

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4.  QUADRAS SOLTAS E RIMANCE

CRONICA DA MUI BELA E NOBRE BIBLIOTECA MUNICIPAL,
EM VERSO HEROICAMENTE CELEBRADO COM INTERVENÇAO
ALGUMAS E ALGUNS ILUSTRES PERSONAGENS, COMO SE 
VERÁ

Pois a Biblioteca Municipal
Tem um projecto muito controverso,
Alguma coisa lá corre bem mal
Merecendo  uma cantiga em verso

E1a tinha uma bibliotecária
De seu nome Idília das Mercês:
Mandaram-na p’ra cima do telhal,
Ora adivinhem quem foi o maltês.

Vai daí o juiz do Tribunal
Mandou rectificar a prepotência,
Mas o pretenso dono do pombal
Não quis, fiquemo-nos pela evidência.

Emalaram os livros e os peixes
Ficou a biblioteca de emergência
E tem calma, oh! leitor, não te queixes
Se na procissão não houver urgência.

P’ra renovação do nobre edifício
Juntaram-se três Donas, arquitectas,
Cada uma com seu belo artifício,
Todas com bem encantadores aspectos.

A Noêlia, azeda e bem altinha,
A rapozinha, Lídia, rebiteza,
E, céus, a M. Tomé  bonitinha,
Com seu ar calmo, calado, princesa.

O reboco já se foi retirando,
Surgindo o tabique e a estrutura,
Pois o operário lá vai trabalhando
Com o seu engenho e arte dura.

Um arquitecto sem bom ajudante
É como nascer o sol sem luar;
Tudo tem de ser feito de rompante
Pois o povo é chamado a votar.

Mas na Câmara é preciso calma:
Sempre novas ideias, p’ra mudar.
Nisto não há não quem nos leve a palma,
Não vale apertar ou chatear.
.
João Abel é bom desenhador
Estudioso, sabe do ofício.
Mas p’ra Manuela é gran dor
Seja tão calmo, é bem mau suplicio

Calada, com silencioso andar,
Na sala aparece a Manuela,
Séria ou risonha, com mau penar
Se o Carapeto deu escapadela.

Ora dizes tu, ora mando eu!
Melhor ou pior lá se vão mexendo
P’ra que o desenho não seja breu
Nem se  gaste mal o tempo, perdendo.

Ele é tamanho riscado e viagem
Que por vezes há grande confusão
Para que não se fique em má tiragem
Com os apertões da vereação.

Ora, os desenhos são mais de mil,
P'ro Picoto lá se vai o sossego;
Emenda, raspedela, que baril,
É bem obra de muito grã  carrego.

Há sempre uma  coisa  p’ra aumentar
Um pormenor, outro levantamento,
Bem sofrem, com arquitecto a puxar
E o desenhador em grande tormento..

Não se fala do Engenheiro Guerra?
Calcula p’ra não haver aguadar;
Com o Pinela, a sapata em terra,
Não vá a construção no chão ficar

Enfim, aqui fica breve resumo
Da novela da nossa BIBLIOTECA
Mas acreditem, sairá bom sumo,
Casa boa, imponente, sem marreca.


1989.09.14/15
SETUBAL

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9 - SONETOS

É BOM TER QUEM AFAGUE NOSSA VIDA
MUDAM-SE OS TEMPOS MANTENHA-SE O AMOR
NA TERRA O AMOR É UMA IDEIA

ver em sonetos - 01

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COM DESCONCERTO, HÁ NA VIDA TEMPO 
FOGOSO É O FOGO DA JUVENTUDE
O AMOR É UMA COMPANHIA 

ver em sonetos - 02

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DE PEDRA SOIS VÓS, COISA DURA
JOÃO BAPTISTA CANSADO DA GUERRA
CAMINHANDO INTERROGATIVAMENTE

ver em sonetos - 03

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É A GUERRA O MONSTRO QUE CEIFA A VIDA
O MUNDO É COMPOSTO DE FAZENDA E MUDANÇA
RICO OU POBRE ESTÃO SEM PAZ, NA GUERRA
SER  AMIGO É COLORIDO PRESENTE

ver em sonetoS - 04

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A VIDA É VARIADO GOSTO  E DESGOSTO
CANTAI OLIVAIS, CANTAI DE ALEGRIA

ver em sonetos - 05

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AUTO RETRATO  EM PASSATEMPO  
O AMOR É BEM QUE SUAVIZA
NO MUNDO ALGO SE PERDE OU MAL CRIA

ver em sonetos - 06

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vem de ( a poesia nas palavras em setembro 03 )


CONTINUA EM ( a poesia nas palavras em setembro 05 )


cartoon de autor não identificado
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