quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Notícias do Mindelo: aventuras, venturas e desventuras

* Victor Nogueira
(texto e fotos, excepto as imagens com livros)



Ontem o dia esteve soalheiro e as nuvens dariam interessantes fotos ao pôr-do-sol, mas não saí de casa. Hoje o céu esteve límpido e acabei por não sair pelo motivo que mais adiante será exposto. 

Há pouco o carteiro entregou-me três livros de poesia remetidos pelo meu amigo Filipe Chinita e por ele autografados: "Do tamanho das nossas vidas", "a(s) mãos ambas sobre o corpo (d)o amor" e "deste temporal de (te) amar".  Aprecio na sua poesia a contenção depurada e (quase) ascética com que se exprime.



Sem televisão por cabo não posso ver os canais FoxCrime, RTP Memória e FoxMovies, os que mais me interessam com a RTP2, mas apenas a TDT. No entanto desde há dias só consigo apanhar a RTP2, mas sem. possibilidade de ver em diferido senão os poucos programas da RTP Play, no computador. Mas mesmo isto foi à viola, pois a NOS cortou o acesso gratuito à Internet pelo hotspot, sem limite de tráfego - com alta velocidade, oferta de verão - e repentinamente passei a tê-lo empastelado, a 124 kb/s, o que me dificulta a edição dos blogs e os downloads ou uploads ou impede o visionamento de filmes e vídeos on line. Uma seca.


Para agravar de vez em quando fico sem acesso e sou redirecionado para comprar pacotes suplementares de acesso rápido. Como não estou para isso pois seria uma fortuna ao fim do mês, lá me restabelecem a ligação a ... 124 kb/s e assim ciclicamente. Para tornear este handicap "oferecem-me" acesso rápido XL pelo hotspot sem limite de tráfego mediante mais 15 € mensais para além do que já pago normalmente, o que não é pouco. E vivam a "democracia" e a "liberdade" que dizem ser a Web, com esta obrigação de subscrever outros serviços que não utilizo, a que não tenho acesso fora da minha residência habitual  ou que não me interessam, tudo isto para ... engorda de tubarões.



No quintal tem sido tempo de arrancar a maioria das plantas, de podar a palmeira e de preparar a terra para as sementeiras que serão quando for a próxima Lua Nova. Preparava-me para sair, aproveitando o tempo soalheiro, deslocando-me a Vila do Conde ou mais adiante para tomar café com a menina da Póvoa. Mas de repente um cheiro incomodativo feriu a minha pituitária e apercebi-me que no campo defronte de mim começara a adubagem do terreno com água choca, isto é, com água das pocilgas, pelo que resolvi fazer a reportagem fotográfica da faina agrícola. 


Uma tarde destas quando saí ainda o milheiral estava ali, mas quando regressei ao anoitecer já fora tudo colhido mecânicamente. Já não há desfolhadas, eiras e cantorias ou milho rei.



O milho verde, cantado por José Afonso ...

Milho verde, milho verde
Milho verde maçaroca
À sombra do milho verde
Namorei uma cachopa

Milho verde, milho verde
Milho verde miudinho
À sombra do milho verde
Namorei um rapazinho

Milho verde, milho verde
Milho verde folha larga
À sombra do milho verde
Namorei uma casada

Mondadeiras do meu milho
Mondai o meu milho bem
Não olhais para o caminho
Que a merenda já lá vem

Os trabalhos hoje foram pois a adubagem do campo seguida da sua aragem, o depósito e o arado puxados por tractores, cada um com seu condutor, o ar empestado. O que me recorda as moscas, que aqui mais parecem carraças ou sarna, habituadas  que estão ao gado, aparentemente imunizadas aos insecticidas domésticos. E desde ontem provocaram-me uma intensa comichão com três babas que me puseram no braço, aparentemente resistentes ao Fenistil e aos anti-histamínicos.. Nem tudo são rosas e doce lirismo nos bucólicos campos (en)cantados por poetas e poetisas.

E pronto, vou tratar do jantar, linguado grelhado com salada e sopa de legumes ali da horta do quintal. São servidos ? Ah! também há ainda um pedaço de bolo que me trouxe uma vizinha, que pela textura mas não pelo gosto supunha ser pão-de-ló mas me esclareceu que era bolo de folar. 


Continuo a ler de Andrew Marr "História do Mundo", de que me falara o Nunes da Ponte um dia destes. É um livro escrito numa linguagem acessível e fluente, com alguns factos que desconhecia. Contudo, a despropósito, seja qual for o período da História, lá surgem referências aos crimes soviéticos ou de Estaline, para além de afirmar - ao tratar da Guerra Civil Americana - que se não fosse a chegada dos norte-americanos à Europa os "alemães" teriam vencido a Grande Guerra. Presume-se que se refere aos desembarques na Sicília e na Normandia, "esquecendo" as derrotas ds nazis em Estalinegrado e em Kursk, que essas sim, apressaram a intervenção do "amigo" americano. Está-lhes na massa do sangue o TINA (there is no alternative) para o capitalismo, mesmo que falem dos crimes e mortandades deste, para tentarem dar credibilidade "isenta" ao pró-capitalismo.. 


É como sucede também num outro livro que acabei de ler um dia destes - "As decisões mais inesperadas da História" - de Luc Mary (cuja capa já é por si mesma elucidativa), que começando na Antiguidade com a Grécia, Roma e Cartago, lá vem com descarados anti-comunismo e anti-sovietismo ao abordar episódios do séc XX. Mas como a obra de Andrew Marr está a ser distribuída em volumes semanais, tenho de aguardar para verificar como nela será abordado o século XX.


OS TRABALHOS NO CAMPO DE MILHO

1. Antes e depois da colheita



2. - Adubagem




3. Aragem






(nas fotos acima vê-se em duas "folhas" o campo que está estrumado e o que não estava ainda)



 

4. - Fim dos trabalhos





A desfolhada em Lumiares (Armamar), com trilha sonora do poema de Ary dos Santos, A "desfolhada portuguesa", interpretada por Tonicha, causou enorme escândalo em 1969, ao vencer o Festiva da Canção da RTP. musicado o texto de Ary por Nuno Nazareth Fernandes 

Corpo de linho 
lábios de mosto 
meu corpo lindo 
meu fogo posto. 
Eira de milho 
luar de Agosto 
quem faz um filho 
fá-lo por gosto. 
É milho-rei 
milho vermelho 
cravo de carne 
bago de amor 
filho de um rei 
que sendo velho 
volta a nascer 
quando há calor. 

Minha palavra dita à luz do sol nascente 
meu madrigal de madrugada 
amor amor amor amor amor presente 
em cada espiga desfolhada. 

Minha raiz de pinho verde 
meu céu azul tocando a serra 
oh minha água e minha sede 
oh mar ao sul da minha terra. 

É trigo loiro 
é além tejo 
o meu país 
neste momento 
o sol o queima 
o vento o beija 
seara louca em movimento. 

Minha palavra dita à luz do sol nascente 
meu madrigal de madrugada 
amor amor amor amor amor presente 
em cada espiga desfolhada. 

Olhos de amêndoa 
cisterna escura 
onde se alpendra 
a desventura. 
Moira escondida 
moira encantada 
lenda perdida 
lenda encontrada. 
Oh minha terra 
minha aventura 
casca de noz 
desamparada. 
Oh minha terra 
minha lonjura 
por mim perdida 
por mim achada. 

As picadas das moscas continuam a incomodar-me com prurido e comichão ou coceira e só um grande esforço me impede de coçar o braço até ficar em chaga. "Verdes são os campos / da cor do limão / ... " e blá blá. Antes "A Mosca", suplemento humorístico do extinto Diário de Lisboa mais as Redacções da Guidinha e os Cartoon de João Abel Manta.. Ao menos divertiam-nos e despertavam riso e bom humor.



EM TEMPO - No alto da serra, lá no cimo da montanha, encerrada, Penélope continua a desfiar de noite a teia que de dia não fia ! Não haverá madrugada de nevoeiro que a descerre e nos valha em alvoreada alvorada?




José Afonso em Canto Moço ou ...

Somos filhos da madrugada
Pelas praias do mar nos vamos
À procura de quem nos traga
Verde oliva de flor nos ramos
Navegamos de vaga em vaga
Não soubemos de dor nem mágoa
Pelas praia do mar nos vamos
À procura da manhã clara

Lá do cimo de uma montanha
Acendemos uma fogueira
Para não se apagar a chama
Que dá vida na noite inteira
Mensageira pomba chamada
Companheira da madrugada
Quando a noite vier que venha
Lá do cimo de uma montanha

Onde o vento cortou amarras
Largaremos p'la noite fora
Onde há sempre uma boa estrela
Noite e dia ao romper da aurora
Vira a proa minha galera
Que a vitória já não espera
Fresca, brisa, moira encantada
Vira a proa da minha barca.



a sesta, de van gogh



salvo a "Teia" e "Antes e depois da colheita", as fotos foram tiradas em 2016.10.25 / 26 

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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)