Por Victor
Nogueira a Segunda-feira, 4 de Novembro de 2013 às 10:04
* Victor Barroso Nogueira
CENAS DO JARDIM
A vida
Anémona do Mar
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1969
04
CENAS DO JARDIM
Foto Victor Nogueira - Évora - coreto no jardim público - comício de Octávio Pato - candidatura à Presidência da República - 1976
No Jardim Público de Évora - foto MENS (1973)
1. Era um jardim
geometricamente desconfortável
artificial
No coreto
a banda tocava.
Além
caridosamente
alguém partilhava com os
"jardineantes"
as goelas do transístor escancaradas
No banco
ao meu lado
uma matrona e uma gaiata conversam
banalmente,
"Puxa a mala um bocadinho mais para
baixo.
Isso! Assim!
Para que te não vejam as pernas"
E eu sorrio-me
por entre a sisudez duma
"Introdução à Vida Política"
Pobres e ridículas gaiatas!
Pobres e ridículas matronas!
2. Era um miúdo esfarrapado
sujo
de rosto envelhecido,
Aproxima-se do guarda, mas o dinheiro
não chega.
Mas o velho, que já terá sido criança,
deixa-lo entrar.
O miúdo envelhecido corre,
Para,
Hesita!
Os olhos sorriem no rosto sujo,
Balancé? Carrocel? Escorrega? Ou avião?
Não poder ele desdobrar-se!
Corre, sobe, escorrega
o mundo é dele
Agarra-lo.
Sobe, desliza, corre, sobe, desliza
sobe; desliza, corre, sobe, desliza
contorce-se
"MÃE, OLHA ESTE MATULÃO SUJO!
VAI-TE EMBORA!"
As avózinhas contorcem os lábios
num rictus de desprezo
os meninos apedrejam com a língua e
crucificam com os lábios.
Ele hesita.
Baloiça, baloiça, baloiça!
Roda, roda, roda,
sobe, desliza, corre, sobe, tropeça,
sobe, desliza, corre!
contorce-se, baloiça, roda
Olhos brilhantes cheios de felicidade!
Um velho num corpo de criança
pequena para a roupa suja
esfarrapada!
As avózinhas contorcem os lábios num
rictus de desprezo
Os meninos, esses apedrejam com a língua
e crucificam com os lábios
Velhas envelhecidas
Garotos moribundos
e uma criança num pequeno corpo de
velho!
Évora 1969.Fevereiro.24
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05
A vida
Sousel 1969.Fevereiro.28
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06
Anémona do Mar
.
De um punhado
de branca areia salgada
fez-se
verde madeiro
.........................vogando
........................................ao
sabor da corrente
na esteira de todos os sorrisos
De ilha em ilha
castelos no ar
que a chuva........gota .......a
........gota
.........................construiu
e o sol dispersou
.
.
Évora/Sousel 1969 Fevereiro 28
CENAS DO JARDIM
Muitas vezes ia ler ou estudar para o Jardim Público em Évora e estes dois textos aqui agrupados são fruto dum olhar crítico sobre o que me rodeava e que eu - entre uma e outra página - observava. O coreto e a mata ficavam na parte de cima do jardim e na parte de baixo do mesmo, perto da Praça de Touros, eram o Parque Infantil e o Campo de Mini-Golfe. Naquele tempo as crianças tinham de pagar a entrada para poderem usufruir dos aparelhos do Parque Infantil.
Anos mais tarde, talvez em 1973, sentados num banco deste mesmo Jardim Público,dei um inocente e fugaz beijo à minha namorada e logo senti a varinha do guarda batendo-me no ombro e avisando que "poucas-vergonhas" daquelas não eram permitidas.
A vida
Anos mais tarde, talvez em 1973, sentados num banco deste mesmo Jardim Público,dei um inocente e fugaz beijo à minha namorada e logo senti a varinha do guarda batendo-me no ombro e avisando que "poucas-vergonhas" daquelas não eram permitidas.
A vida
Neste ano passei o Carnaval na casa da Noémia, em Sousel, um casarão que remontava aos tempos do Senhor D. Manuel I, para grande incómodo da mãe dela, a D. Cacilda, que sempre me olhou de lado. Foi dessa vez em Sousel que "nasceram" este texto despojado e a "Anémona do Mar". Anos mais tarde essa casa surge num outro texto meu. Nesse tempo, as "mães" e não só eram "zeladoras" e policiavam o que entendiam dever ser a moral, a honra e os bons costumes das filhas solteiras, tivessem a idade que tivessem, mesmo que trabalhassem e fossem economicamente independentes da família. Depois de casadas esse policiamento passava para os respectivos maridos e para as vizinhas ou comadres.
Anémona do Mar
Este pretende ser um auto-retrato.
Texto reelaborado em 2017.11.04
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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)