quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,

Maria Emília (1920 - ...), Manuel (1921 -... ), José Luís (1951-1987), Victor Manuel (1946 - ... ) - Em Luanda - Foto de Família ~~Aniversário ~~~~~~~~~~
Fernando Pessoa - (Álvaro de Campos) ~~~~

No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas
lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...

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Clara Roque Esteves Uma bela foto de família. Saudosismo faz-nos bem à alma. Regenera-nos o presente.A foto é a preto e branco, o presente a preto só. Obrigada, Vitor. Beijinho.
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Ana Albuquerque Um abraço Victor Nogueira, recordar também é viver! 
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Hajrudin Durmanovic · Amigo/a de Cecília Barata
*************
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Judite Faquinha Ó Victor, ainda com situações diferentes... tu em Angola, eu em Portugal, mas por vezes o nosso passado são como uma cópia, também fui criada no campo em contacto com a terra também festejavam os meus anos... a minha inocência dava para perguntar ao meu pai, porque não era assim todos os dias, enfim muitas coicidências, entre a tua história e a minha...só que eu era filha unica, que me deixava bastante infeliz! Só que hoje continuo com os meus sonhos e eluzões, quando eu partir irão comigo. Beijocas amigo.
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Joana Espanca Bacelar É muito bom recordar os tempos da nossa meninice. Gosto da foto e muito deste poema.Bj
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Clara Roque Esteves Belo retrato de família! África nossa no seu melhor.
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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)