* Victor Nogueira
Viva quem vive. O silêncio tem a dimensão ... Que dimensão? A do universo? A da ausência? Qual o conteúdo do silêncio? Tocam à porta. É uma rapariga, uma jovem, a vender peixe. Se fosse pão, comprava. Não traz a mão na anca nem a canasta do pescado à cabeça, mas sim na furgoneta.
Silêncio! Um avião prateado sulca os ares, descendo lentamente para aterrar. O céu esta neblinado, azul acinzentado com nuvens esbranquiçadas. Tudo é silêncio, fora e dentro de mim, em redor de mim. São horas de tratar do almoço.
O tempo esta frio. Duma frialdade que enregela as mãos e os ossos, até ao tutano. Sonhei contigo mas desta feita nada ficou em memória, salvo a tua presença ausente, invisível no enredo dos son(h)os. Como se notícias do bloqueio fossem! Escuta:
Notícias do Bloqueio II
Estão suspensas as palavras
Proibidos os gestos
de ternura, amizade e amor.
O silêncio invade as ruas
entra nas casas
senta-se á mesa da gente.
Que sentido tem dizer
amor
amiga
camarada
companheiro?
Que sentido tem
abrir as mãos e os olhos
e perguntar qual o significado do
que vemos, ouvimos, entendemos e sentimos?
Gaivotas loucas, alvoraçadas, enchem os ares
de movimento e ruído
enquanto a vida escorre pelos dedos
indiferente
medíocre
submissa. (Setúbal, 1985.10.02 )
Passada é a hora do almoço. Insípido foi ele: ervilhas com chouriço e ovos escalfados. Os ingredientes não eram de bom sabor. Não chove. Pego em mim, fecho as janelas, abro o portão, tiro o Fiesta e vou até à beira-mar. Com o silêncio dentro de mim.
NOTÍCIAS DO BLOQUEIO - I
Do Victor Manuel para alguém, saudações
Não as notícias do meu amigo
mas apenas um aceno
entre a espontaneidade e a reserva
com maior ou menor lucidez e serenidade
neste deserto mais ou menos florido
neste caminho quotidianamente (des)feito
.
por entre os farrapos das alegrias
..................................dos sonhos
..................................das imaginações
por coisa nenhuma
um apelo
um gesto
.....................apenas
uma simples palavra
Olá amiga! (Setúbal 1985.08.11)
Mindelo, 2019.10.17
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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)