quinta-feira, 17 de outubro de 2019

em torno do silêncio


* Victor Nogueira

Viva quem vive. O silêncio tem a dimensão ... Que dimensão? A do universo? A da ausência? Qual o conteúdo do silêncio? Tocam à porta. É uma rapariga, uma jovem, a vender peixe. Se fosse pão, comprava. Não traz a mão na anca nem a canasta do pescado à cabeça, mas sim na furgoneta. 

Silêncio! Um avião prateado sulca os ares, descendo lentamente para aterrar. O céu esta neblinado, azul acinzentado com nuvens esbranquiçadas. Tudo é silêncio, fora e dentro de mim, em redor de mim. São horas de tratar do almoço. 

O tempo esta frio. Duma  frialdade que enregela as mãos e os ossos, até ao tutano. Sonhei contigo mas desta feita nada ficou em memória, salvo a tua presença ausente, invisível no enredo dos son(h)os. Como se notícias do bloqueio fossem! Escuta:

         Notícias do Bloqueio II

        Estão suspensas as palavras
        Proibidos os gestos
                   de ternura, amizade e amor.
         O silêncio invade as ruas
                   entra nas casas
                   senta-se á mesa da gente.
         Que sentido tem dizer
                   amor
                   amiga
                   camarada
                   companheiro?
         Que sentido tem
                   abrir as mãos e os olhos
                   e perguntar qual o significado do
                   que vemos, ouvimos, entendemos e sentimos?
         Gaivotas loucas, alvoraçadas, enchem os ares
         de movimento e ruído
         enquanto a vida escorre pelos dedos
                   indiferente
                   medíocre
                   submissa. (Setúbal, 1985.10.02 )

Passada é a hora do almoço. Insípido foi ele: ervilhas com chouriço e ovos escalfados. Os ingredientes não eram de bom sabor. Não chove. Pego em mim, fecho as janelas, abro o portão, tiro o Fiesta e vou até à beira-mar. Com o silêncio dentro de mim.

 NOTÍCIAS DO BLOQUEIO - I

 Do Victor Manuel para alguém, saudações

 Não as notícias do meu amigo
 mas apenas um aceno
 entre a espontaneidade e a reserva
 com maior ou menor lucidez e serenidade
 neste deserto mais ou menos florido
 neste caminho quotidianamente (des)feito
 .
 por entre os farrapos das alegrias
 ..................................dos sonhos
 ..................................das imaginações
 por coisa nenhuma
 um apelo
 um gesto
.....................apenas
 uma simples palavra
 Olá amiga!      (Setúbal 1985.08.11)


Mindelo, 2019.10.17

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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)