2021 05 08 Gilberto Silva - Foto victor nogueira - Festa do Avante, 1999
Um dia destes telefonou-me o Gilberto, falando-me de si. Prometi telefonar-lhe, mas entretanto fiquei surdo, tinham de escrever-me as falas para comigo, mas recuperei algum tempo depois. Dizia para com os meus botões: "Tenho de telefonar ao Gilberto, tenho de ir ao Barreiro vê-lo». Soube há pouco que o Gilberto faleceu hoje.
O Gilberto foi um homem solidário, generoso, prestável, com uma fala mansa e sorridente que, muitíssimo mais que meu camarada e companheiro de muitas décadas de lutas políticas e sindicais, foi meu amigo e de quem procurei ser amigo, a quem muito devo: a sua atenção, o seu gesto solidário, a sua prestimosidade. À Celeste e à Nádia, o meu abraço fraterno.
O LUGAR DA CASA, por Eugénio de Andrade
Uma casa que fosse um areal
deserto; que nem casa fosse;
só um lugar
onde o lume foi aceso, e à sua roda
se sentou a alegria; e aqueceu
as mãos; e partiu porque tinha
um destino; coisa simples
e pouca, mas destino
crescer como árvore, resistir
ao vento, ao rigor da invernia,
e certa manhã sentir os passos
de abril
ou, quem sabe?, a floração
dos ramos, que pareciam
secos, e de novo estremecem
com o repentino canto da cotovia.
CANTO MOÇO, por José Afonso
Somos filhos da madrugada
Pelas praias do mar nos vamos
À procura de quem nos traga
Verde oliva de flor no ramo
Navegamos de vaga em vaga
Não soubemos de dor nem mágoa
Pelas praias do mar nos vamos
À procura da manhã clara
Lá do cimo duma montanha
Acendemos uma fogueira
Para não se apagar a chama
Que dá vida na noite inteira
Mensageira pomba chamada
Companheira da madrugada
Quando a noite vier que venha
Lá do cimo duma montanha
Onde o vento cortou amarras
Largaremos pela noite fora
Onde há sempre uma boa estrela
Noite e dia ao romper da aurora
Vira a proa minha galera
Que a vitória já não espera
Fresca brisa, moira encantada
Vira a proa da minha barca
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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)