* Victor Nogueira
2022 05 08 - Foi para a cidade do Porto que confluíram os meus avós, vindos de Mora, no Alto Alentejo, de Chaves, em Trás os Montes, de Barcelos, no Minho, e de S. Mamede Infesta, ali perto, em Matosinhos. Os meus inúmeros tios nasceram em Mora ou no Porto, embora o meu pai frisasse que era de Cedofeita (tal como a minha mãe) e os meus inúmeros primos maternos são de Barcelos.
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Nascido em Angola, antes dos 20 anos (quando vim de Luanda para Lisboa para frequentar "Económicas") vivi por duas vezes no Porto: em 1949 e em 1963/64.
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Aos 16 anos considerava a cidade tripeira triste, cinzenta, provinciana ("uma aldeia grande", como me dizia o meu avô Luís), um contraste radical com Luanda, mas sentia nas suas ruas um calor humano que não encontrava em Lisboa de que eu gostava, uma cidade aberta, soalheira e cosmopolita, "das muitas e desvairadas gentes", no dizer de Fernão Lopes.
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No Porto, á 2ª feira nos eléctricos sabia-se qual tinha sido o resultado alcançado na véspera pelo "Glorioso". Tinha ganho se fosse tudo risonho, tinha perdido, se o ar fosse mais sombrio. Isto seria impensável em Lisboa, onde na altura pontificavam o Benfica, o Sporting e o Belenenses, enquanto no Porto o Boavista não ensombrava os "dragões".
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Desde miúdo naturalmente um dos meus clubes era o Futebol Clube do Porto, conjuntamente com o Futebol Clube de Luanda (sua sucursal) e a Académica de Coimbra, neste caso talvez porque o meu pai admirava o fado de Coimbra (tal como a música coral alentejana e soviética) e as memórias estudantis conimbricenses, das quais havia vários livros em nossa casa, como o "In illo tempore", de Trindade Coelho.
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Hoje costumo dizer que sou do Glorioso desde os tempos em que este não vencia campeonatos, então repartidos entre os pardais do Malfica que nunca mais se assumem como vermelhos, continuando "encarnados", e as verdes lagartixas.
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Nunca fui "doente": gosto que o Porto ganhe, mas não caio de cama nem entro em parafuso contra os árbitros, se perder. Em toda a minha já longa vida assisti apenas a um jogo de futebol ao vivo e foi no Porto, em 1963, porque o Correia Martins, um colega dos meus pais e amigo da família em Luanda, de férias em Portugal, me convidou e pagou o bilhete para assistir a um desafio de futebol .. com os dragões.
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Em 1956 ou '58 o Porto lá conseguiu vencer um campeonato e fiquei surpreso com a festa que houve em Luanda, com enormes cortejos automóveis festejando e buzinando com imensos entusiasmo, alvoroço e alegria.
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Talvez como aquela de 1974 09 08, registada em Évora, numa das numerosas cartas para a minha namorada do Baixo Alentejo, na margem esquerda do Guadiana:
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«No café, ontem, a "Capital" aberta sobre a mesa, ia lendo a notícia, antes, o discurso do Spínola, uma grande emoção subindo por mim: finalmente a independência para o meu País. Angola livrar-se-á, finalmente, da tutela asfixiante de Lisboa. Mas... quem vencerá? O capitalismo internacional ou os povos de Angola, Guiné e Moçambique? O reconhecimento do direito à independência é já um primeiro passo, mas a luta continuará. Pois é, minha linda, mas não tinha ninguém com quem partilhar a minha alegria.
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Ao contrário desta malta que, desde há pouco, em longa fila de automóveis, buzinando estridentemente, sobe a rua Serpa Pinto, circundando várias vezes o Giraldo e segue pela R. S. João de Deus. Vão sorridentes e acenantes, agitando bandeiras azuis e brancas, as pessoas concentrando‑se sorridentes nos passeios. Pergunto ao meu vizinho o que se passa e a resposta vem breve: "O Juventude" passou à 2ª divisão!" Ah!Ah!Ah!»
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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)