* Victor Nogueira
2023 01 12 - Foto victor nogueira - Pôr do Sol em Vila do Conde (2022 12 09 IMG_1456)
Vista a partir da Meia-Laranja; para lá da ponte sobre o Rio Ave divisam-se a Capela de N. Sra do Socorro e o relógio de sol, alusivo aos Descobrimentos, na Praça D. João II.
A Praça D. João II, nas margens do Rio Ave, inaugurada em 2001, comemora os Descobrimentos Portugueses, nela figurando os padrões das “cinco partidas do mundo”, o lago da sereia, vários chafarizes em forma de globo e, em destaque, um grande relógio de sol. O nome da Praça evoca o nome do rei que ordenou a construção da Alfândega Régia, edifício localizado nas proximidades
«Memória dos 500 anos dos Descobrimentos Portugueses e da participação de Vila do Conde na Epopeia Marítima, foi concebida pelo escultor José Rodrigues, marcada pela afirmação vertical de um mastro e do velame de nau sulcando ondas geométricas, com uma sereia pontuando um mar encantado e onde o firmamento se espelha.ª
VER «Viagem à Rosa dos Ventos - zona ribeirinha de Vila do Conde»
202201 12 - AO VOLANTE DO CHEVROLET PELA ESTRADA DE SINTRA, por Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa
Ao volante do Chevrolet pela estrada de Sintra,
Ao luar e ao sonho, na estrada deserta,
Sozinho guio, guio quase devagar, e um pouco
Me parece, ou me forço um pouco para que me pareça, Que sigo por outra estrada, por outro sonho, por outro mundo,
Que sigo sem haver Lisboa deixada ou Sintra a que ir ter,
Que sigo, e que mais haverá em seguir senão não parar mas seguir?
Vou passar a noite a Sintra por não poder passá-la em Lisboa,
Mas, quando chegar a Sintra, terei pena de não ter ficado em Lisboa.
Sempre esta inquietação sem propósito, sem nexo, sem consequência,
Sempre, sempre, sempre,
Esta angústia excessiva do espírito por coisa nenhuma,
Na estrada de Sintra, ou na estrada do sonho, ou na estrada da vida…
Maieável aos meus movimentos subconscientes do volante,
Galga sob mim comigo o automóvel que me emprestaram.
Sorrio do símbolo, ao pensar nele, e ao virar à direita.
Em quantas coisas que me emprestaram eu sigo no mundo
Quantas coisas que me emprestaram guio como minhas!
Quanto me emprestaram, ai de mim!, eu próprio sou!
À esquerda o casebre — sim, o casebre — à beira da estrada
À direita o campo aberto, com a lua ao longe.
O automóvel, que parecia há pouco dar-me liberdade,
É agora uma coisa onde estou fechado
Que só posso conduzir se nele estiver fechado,
Que só domino se me incluir nele, se ele me incluir a mim.
À esquerda lá para trás o casebre modesto, mais que modesto.
A vida ali deve ser feliz, só porque não é a minha.
Se alguém me viu da janela do casebre, sonhará: Aquele é que é feliz.
Talvez à criança espreitando pelos vidros da janela do andar que está em cima
Fiquei (com o automóvel emprestado) como um sonho, uma fada real.
Talvez à rapariga que olhou, ouvindo o motor, pela janela da cozinha
No pavimento térreo,
Sou qualquer coisa do príncipe de todo o coração de rapariga,
E ela me olhará de esguelha, pelos vidros, até à curva em que me perdi.
Deixarei sonhos atrás de mim, ou é o automóvel que os deixa?
Eu, guiador do automóvel emprestado, ou o automóvel emprestado que eu guio?
Na estrada de Sintra ao luar, na tristeza, ante os campos e a noite,
Guiando o Chevrolet emprestado desconsoladamente,
Perco-me na estrada futura, sumo-me na distância que alcanço,
E, num desejo terrível, súbido, violento, inconcebível,
Acelero…
Mas o meu coração ficou no monte de pedras, de que me desviei ao vê-lo sem vê-lo,
À porta do casebre,
O meu coração vazio,
O meu coração insatisfeito,
O meu coração mais humano do que eu, mais exato que a vida.
Na estrada de Sintra, perto da meia-noite, ao luar, ao volante,
Na estrada de Sintra, que cansaço da própria imaginação,
Na estrada de Sintra, cada vez mais perto de Sintra,
Na estrada de Sintra, cada vez menos perto de mim…
2020 01 12 O meu tio Joaquim António, que morreu com 20 e poucos anos (1913 / 1936), escrevia poesia, poesia triste, porque, tuberculoso, sabia que em breve morreria. Herdei dele, no espólio da minha mãe, dois cadernos manuscritos de poemas seus. Mas não é dele mas de António Nobre este poema, embora este tipo de poesia não seja a minha praia.
A minha mãe também escrevia poesia, por vezes alegre, alguma publicada em jornais do Porto, e contos, alguns publicados num jornal de Luanda. Mas destes últimos nenhum ela guardou.
Virgens que passais - António Nobre
Virgens
que passais, ao Sol-poente,
Pelas estradas ermas, a cantar!
Eu quero ouvir uma canção ardente,
Que me transporte ao meu perdido lar.
Cantai-me, nessa voz omnipotente,
O sol que tomba, aureolando o Mar
A fartura da seara reluzente,
O vinho, a graça, a formosura, o luar!
Cantai! Cantai as límpidas cantigas!
Das ruínas do meu lar desaterrai
Todas aquelas ilusões antigas
Que eu vi morrer num sonho, como um ai....
Ó suaves e frescas raparigas,
adormecei-me nessa voz...cantai !
2020 01 12 foto victor nogueira - grafito em Setúbal, no Bairro do Troino (2018.07.24)
VER
Murais em Setúbal 17 - Grafitos 01 - As Palavras
2019 01 12 foto victor nogueira - no Promontório e fortaleza de Sagres, em 1996
De Lagos para Ocidente o trânsito é menor, com pequenas praias ao longo da costa, até ao Cabo de S. Vicente, após Vila do Bispo. Sagres é um promontório escalvado, ventoso, desértico, com muralhas e o que me parece ser um enorme relógio de sol no solo, com pequenos areais abrigados em pequenas enseadas.
Vila do Bispo tem um ar simpático, destacando se a igreja de uma alvura cintilante, com pequenas casas em redor, perto do promontório de Sagres.(Memórias de Viagem, 1997.08.21)
Vila do Bispo - Foto à igreja, onde se velava um morto, e a várias casa antigas. Sagres - Nada de especial. Compramos postais e as pessoas são simpáticas. Em Portimão e Sagres as pessoas têm sido normalmente afáveis e simpáticas.(Memórias de Viagens, 2000.04.17)
2017 01 12 Quando vieres - Maria Eugénia Cunhal
Quando vieres
Encontrarás tudo como quando partiste.
A mãe bordará a um canto da sala...
Apenas os cabelos mais brancos
E o olhar mais cansado.
O pai fumará o cigarro depois do jantar
E lerá o jornal.
Quando vieres
Só não encontrarás aquela menina de saias curtas
E cabelos entrançados
Que deixaste um dia.
Mas os meus filhos brincarão nos teus joelhos
Como se te tivessem sempre conhecido.
Quando vieres
Nenhum de nós dirá nada
Mas a mãe largará o bordado
O pai largará o jornal
As crianças os brinquedos
E abriremos para ti os nossos corações,
Pois quando tu vieres
Não és só tu que vens
É todo um mundo novo que despontará lá fora
Quando vieres.
Maria Eugénia Cunhal in "Silêncio de Vidro", Lisboa, 1962
(Álvaro Cunhal, 14 anos mais velho que a irmã, estivera na prisão durante 11 anos e fugira 2 anos antes do Forte de Peniche, em 1960. Forçado a sair de Portugal, fez parte da Direcção do PCP no exterior (Moscovo e Paris), regressando em 1974. Torturado na prisão, esteve encarcerado em 1937, 1940 e 1949-1960, num total de 15 anos, oito dos quais em completo isolamento.
GRAVURA - Álvaro Cunhal - Desenhos na prisão
2016 01 12 Charles Perrault (Paris, 12 de janeiro de 1628 – Paris, 16 de maio de 1703)
2014 01 12 - foto victor nogueira - dia invernal, em Setúbal
Cá estou sózinhito no alto da torre no cimo duma encosta vislumbrando de vez em quando os carros passarem lentos lá em baixo na avenida, após o parque verde - agora passa um autocarro - enquanto as gaivotas se recolheram e não fazem voos planados no céu acastelado de núvens cinzentas.
Verde é a relva no parque, mas de ramos esquálidos e despidos a maioria das árvores, intilantes as áleas. Os cafés do outro lado têm as esplanadas vazias, que não "prendem" os raros passantes, agora sem guarda-chuva.
Tirando o dedilhar no teclado, tudo é silêncio, até silenciosos estão os meus pensamentos.
Setúbal não conta e as amizades do inFaceLock são meras virtualidades. Pensava que hoje estaria sol, mas não, está frio e de chuva, e eu engripado e gelado. Bem convido as amizades mas elas ou estão longe ou presas de interditos ou com os pensamentos muito para além desta janela, muito para lá do horizonte que neste momento é um luzeiro de luzes cintilantes, a maioria amarelas, algumas de anúncios brancos ou vermelhos, como os do Jumbo, dentro em breve nova catedral do consumo - allegro - que rebentará com o resto do comércio, não só no centro histórico como no resto da cidade.
Esparsos, espaçados, são os carros na avenida ou mais além, noutra rua. Ainda mais para lá o movimento raro das luzes dos automóveis na auto-estrada. O céu, esse agora está dum cinza arroxeado e o asfalto é um entrecruzar de faixas cintilantes como lantejoulas. Está de chuva, num tempo cinza e gelado. É pois tempo de inverno !
2013 01 12 O poema musicado de Ary dos Santos interpretado por Simone de Oliveira em 1969 no Festival da RTP que escandalizou o regime fascista por dizer que "quem faz um filho fá-lo por gosto"
Corpo de linho
lábios de mosto
meu corpo lindo
meu fogo posto.
Eira de milho
luar de Agosto
quem faz um filho
fá-lo por gosto.
É milho-rei
milho vermelho
cravo de carne
bago de amor
filho de um rei
que sendo velho
volta a nascer
quando há calor.
Minha palavra dita à luz do sol nascente
meu madrigal de madrugada
amor amor amor amor amor presente
em cada espiga desfolhada.
Minha raiz de pinho verde
meu céu azul tocando a serra
oh minha água e minha sede
oh mar ao sul da minha terra.
É trigo loiro
é além tejo
o meu país
neste momento
o sol o queima
o vento o beija
seara louca em movimento.
Minha palavra dita à luz do sol nascente
meu madrigal de madrugada
amor amor amor amor amor presente
em cada espiga desfolhada.
Olhos de amêndoa
cisterna escura
onde se alpendra
a desventura.
Moira escondida
moira encantada
lenda perdida
lenda encontrada.
Oh minha terra
minha aventura
casca de noz
desamparada.
Oh minha terra
minha lonjura
por mim perdida
por mim achada.
2013 01 12 - Ah! Depois do escândalo que foi no tempo do fascismo Ary dos Santos escrever que "quem faz um filho fá-lo por gosto", já depois de Abril um deputado do CDS - João Morgado - em 1982 na Assembleia da República ao debater.se a interrupção voluntária da gravidez afirmou que «A igreja Católica proíbe o aborto porque entende que o acto sexual é para se ver o nascimento de um filho».
Vai daí, a poetisa Natália Correia, ao tempo deputada pelo PSD, retorquiu
Já que o coito diz Morgado
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menino ou menina
e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca truca,
sendo só pai de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou parca ração! uma vez.
E se a função faz o órgão diz o ditado
consumado essa excepção,
ficou capado o Morgado.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)