quinta-feira, 4 de maio de 2023

Na morte de Luís Carmelo (1954-2023)

 


* Victor Nogueira

O tempo escorre, mais ou menos rápido, mais ou menos lento. as memórias esvaecem-se, ficam talvez algumas lembranças e os registos, escritos ou fotográficos. As redes sociais permitem por vezes o entusiasmo do reencontro, o desfiar/desfilar  do passado, nítido ou  simples borrões, esmaecidos. Dia após dia o  sol e a lua prosseguem a sua imperturbável marcha e tudo vai de novo caindo no esquecimento, cada um na sua vida ou com os novos círculos de amizades entretecidas. Do passado, restam muitas vezes apenas a neblina, cada vez mais cerrada, fiapos, gotículas, poalha cinzenta ou dourada.

Nas minhas memórias de exílio em évoraburgomedieval o Luís é um dos personagens que nelas surge, na minha intensa correspondência que então mantive, durante anos, sobretudo com a Celeste. 

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Amanhã o Luís Carmelo inaugurará na sala de convívio do Instituto uma exposição de pintura, englobando dez quadros seus. Lá andava hoje afanosamente com o Pedro, arrumando-os nos expositores, mostrando-me, numa breve escapada que lá dei, a lista das altas individualidades a quem enviará convites. E eu sinto-me constrangido e nada entusiasmado. É tão pobrezinha a exposição! E depois, as pessoas irão ou não. A sério ou a brincar, o Pe. Borges, s.j., entusiasmou-o a fazer a exposição. Logo se verá o que dali resultará. (MCG -1973.01.30)

A exposição do Carmelo foi inaugurada hoje. Não estive lá, apenas ouvi uma grande musicada quando ao fim da tarde passei pelo Instituto, em missão de serviço. Disse-me o Carlos [Nunes da Ponte] que nenhum jesuíta foi à inauguração e que o pintor estava com um certo ar tímido. (MCG - 1973.01.31)

Hoje num intervalo fui ver a exposição do Carmelo. Não desgostei, embora a temática não seja muito variada. Por lá andava também o amigo Diogo [Guerreiro], muito preocupado em saber o significado dos quadros e da lua que em todos aparecia. (MCG - 1973.02.01)

 

Escrevo-te aqui nos "Manuéis" [Restaurante na R. Raimundo] enquanto espero o peixe grelhado. Vamos lá ver que tal o GORAZ. Em frente a mim o [Luís] Carmelo aguarda também o seu almoço. O dia está chuvinhante. Vou para Lisboa daqui a pouco no comboio das 14.45. Cerca das 18 lá estarei. O entusiasmo não é grande, pois tenho presente o sossego que não tenho. Estarei de volta 5ª feira. (MCG 1973.10.30)

E então, que me dizes ao aumento do preço do petróleo e seus derivados? (Lá para Abril deve haver mais. Olarilas!). A velhota dos jornais ali ás portas do Arcada já desabafou comigo esta manhã: não haver um raio que os partisse! Há 10 dias encomendara uma garrafa de gás; está cozinhando a lenha. Que só na 3ª feira. "Os patifes, os espertalhões, já sabiam disto e obrigam-me a pagar o gás mais caro!" Como dizia o Carmelo, muito solene e sisudo na sua pose á mesa do café: "Isto está cada vez pior!"  (MCG - 1974.01.003)

 A mesa do café não é propriamente um local de recolhimento e, em sentando se o primeiro, logo chegam os outros. Resultado: muitas vezes os trabalhos têm de ser interrompidos. (MCG - 1973.11.12)

Ali ao lado o Carmelo submete o Carlos [Nunes da Ponte] a testes de inteligência. Pelas mesas vizinhas malta conversa ou estuda; as vozes do Camilo [Monteiro] e do João Luís [Garcia] sobressaem aqui na mesa atrás de mim. (MCG - 1973.11.16


in  Viagens, memórias e registos

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Em 1973/74 a malta dos três primeiros anos resolveu retomar a associação [dos estudantes doç ISESE]  através de eleições e pressionavam-me para que encabeçasse a lista.

 

Realizávamos então reuniões clandestinas numa sala das traseiras do Café Parque, junto à Praça de Touros, para preparar o processo eleitoral e programa da lista. Dos conspiradores lembro-me que também faziam parte o Tó Veladas, o Carrageta, o Manuel Gonçalves, o João Garcia e creio que a Maria Antónia, entre outros. Entretanto aconteceu o 25 de Abril e em Plenário Geral de Estudantes realizado a 26 de Abril de 1974 estes elegeram uma I Comissão Coordenadora das Actividades da AEISESE, constituída por representantes de cada um dos anos, malogrando a tentativa da Direcção do ISESE impor uma nova Comissão Administrativa. Esta I Comissão Coorenadora era constituída por:

 

Victor Manuel Barroso Nogueira da Silva (5º ano) - Coordenação e Contactos com o Movimento Associativo Estudantil, partidos políticos  e outras entidades

João Luís Garcia (3º ano)

Luís José Pereira Carmelo (2º ano)

Manuel Cunha Rego (4º ano), posteriormente substituído por Diamantino Pardal Ribeiro

José Maria Simões Ribeiro (1º ano) - Tesouraria

Faria Monteiro (1º ano) - Tesouraria

 

Esta Comissão Coordenadora esteve em funções até 23 Maio de 1974, data em que RGA (Reunião Geral de Alunos) ratificou o pedido de demissão  de Vitor Nogueira, João Garcia e Luís Carmelo, sendo eleita nova Comissão Coordenadora

 o Coordenadora

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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)