segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

De Nova Lisboa a Luanda, de autocarro (1962) (2/3)


* Victor Nogueira

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De Nova Lisboa a Luanda por terra (2)
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-------Saímos de Nova Lisboa às 8 horas em ponto. A viagem decorreu normalmente e, para mim, não foi muito maçadora, pois tive oportunidade de conhecer novas terras e novas paisagens. Pouco depois de passarmos o Vale do Queve um taxi carro ultrapassou nos, parando à frente do autocarro. Era uma senhora que havia perdido a carreira, por chegar atrasada, e apanhara um táxi, que numa espécie de maratona lá nos conseguiu alcançar. Seguimos viagem, já com a tal senhora. Entre o Cachimbombe e o Hengue vimos um casamento de pretos. As duas noivas iam vestidas de branco, seguidas por numeroso séquito, batendo palmas e cantando.
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Almoçamos no Hengue. A comida não era nada famosa e o arroz mais parecia uma pasta -. Ainda estive para guardar um bocado para cola.

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Levantámos ferro, se assim se pode dizer, cerca das 13:40. A paisagem é maravilhosa, em nada se parecendo com a que percorremos no dia seguinte. Mas o melhor é irmos por partes.

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A meio da tarde avistámos duas aldeias do Colonato Europeu da Cela, chegando pouco depois à encantadora vila de Santa Comba Dão, onde merendámos. Gostei bastante da vila e tive bastante pena de a [não] ter visitado, bem como os aldeamentos, mas a carreira não anda às ordens dos passageiros e sim estes às ordens daquelas. Paciência. Ainda assim passámos pelas aldeias de Carrasqueira e Sta. Isabel Isto, com os filmes que o sr. Boaventura teve a gentileza de nos mostrar, sempre nos dá uns certos conhecimentos, embora vagos, sobre este Colonato.

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Antes de chegarmos à Quibala passamos por uma povoação de açorianos, o Catofexe Chegámos à Quibala já ao anoitecer, não tendo visitado a vila. No dia seguinte também não tivemos oportunidade ensejo de o fazer, pois às 6:30 já estávamos a caminho.

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Esquecia me de dizer que pernoitámos na Quibala, numa pensão, ou lá o que é, perto da igreja. O que eu reparei na Quibala foi que há quase mais postos de gasolina que casas (exagero!)

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Passámos por um cemitério arruinado, que deve ser do tempo do Salvador Correia [século XVII]. Contudo não o posso afirmar, pois não tive oportunidade (outra vez!) de observar as ruínas de perto.

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Matabichámos no Munenga, onde acabou o pão de ló que trouxemos daí. [Caala] Ainda assim durou bastante (...). Até esta altura parecia que a paisagem se queria associar ao meu estado de espírito, pois o tempo estava muito enevoado. Onde o sol deu um arzinho da sua graça foi no Dondo mas as núvens não devem ter gostado, pois até hoje e mesmo em Luanda tem estado um tempo triste, embora às vezes bastante quente. Almoçámos aqui no Dondo e demos uma volta pela vila.

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Como até aqui e daqui a Luanda, a paisagem é triste e monótona, em nada se comparando com a do Centro. Só imbondeiros, com os seus braços descarnados, e capim, sempre capim. A única nota alegre são as elegantes palmeiras, que por aqui há bastantes, bem como exóticos cactos candelabro. (...) Chegámos a Luanda à tardinha. Estava ansioso por ver o meu pai, mas fiquei desolado com o acolhimento que nos dispensou. Podia ao menos ter afivelado um sorriso e feito um acolhimento mais caloroso. (BGF - 1962.09.25)


De Nova Lisboa a Luanda por terra (3)

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-------A viagem de regresso decorreu bem. Almoçámos no Hengue e dormimos na Quibala e no dia seguinte almoçámos no Dondo. Na quinta feira a paisagem e o dia estavam óptimos. Mas no dia seguinte grande parte da manhã esteve enevoada. À tarde o sol mostrou um arzinho da sua graça. É pena que tudo fosse monótono, com árvores secas, capim e mais capim e imbondeiros. Tudo a condizer com a minha disposição nessa altura.

E cá estou de novo em Luanda. Parece que ainda ontem estávamos nós a embarcar no [paquete} Infante D. Henrique. No entanto, já lá vai mais dum mês. (ASV - 1962.09.24)

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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)