quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Rimances do Kant_O_XimPi (1) por Victor Nogueira

 a Sábado, 6 de Novembro de 2010 às 0:18
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.* Victor Nogueira
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RIMANCE DE JOAO BAPTTSTA

Andando João Baptista
Mal descansado da guerra
Caminhava pela pista
Do mar ao cume da serra,

Bem ao longe avistou
Um Paço no horizonte;
Pela ponte atravessou
Chegando ao cimo do monte.

Viu uma bela Princesa
Que na fonte se banhava,
Por ela ficando acesa
A flama que incendiava,

    - Que fazeis aqui senhora
    Dona da pele morena?
    A noite será cantora
    Se vossa mão for serena.

    - Por alguém vim em caminho
    Com muitas naus voando
    Mas não ficarei sozinho
    Se convosco for ficando.

Ouçam qual foi a resposta
Calmosa, doce, brilhante,
Sem temor de lua posta,
Precioso diamante.

    - Num crescendo de calor
    Nesta fonte mergulhada
    Por vós espero, senhor
    Não me deixeis assombrada.

    - Belo é vosso cavalgar
    Vosso desejo um espanto
    Vinde comigo arrulhar
    Alegre, mas sem quebranto.

E com esta fala doce
Se prendeu o cavaleiro
Contente como se fosse
Um artista, jardineiro.

    - Andando me fui chegando
    Para convosco encantar
    E ao ver-vos nesse encanto
    Passo a descansar.

    - Pois vosso olhar é botão
    Em busca do sol e do mar;
    Sereís bela sem senão
    Vinde comigo bailar.

    - E convosco bailo a noite
    Dedilhando esta guitarra
    Não há quem não se afoite
    Vendo a fruta sem a parra.

 Da fala ficou suspenso
 Um punhal no coração
 Com olhar lembrando imenso
 0 vale da solidão,

 Veio o gesto finalmente
 Negro de rosa dourado
 Rosmaninho com semente
 Em seu rosto acobreado,

 Cem mil águias voaram
 Mais, seguidas dum faisão
 E com leveza abalaram
 Silentes que nem trovão.

     - Convosco não bailo eu
     Bem gosto da liberdade,
     Ide-vos embora, oh! meu,
     Sou presa da soledade.

 Com esta fala malina
 A pensar ficou João.
 Era uma fala felina
 D'ensombrar o coração,

 Dez mil pássaros em viagem
 Sem nada no horizonte,
 Fechada aquela portagem
 Como arvore sem ponte,

     - Sinhá moça, a vida é jogo
     Sabemos nós muito bem;
     Ele há fumo sem fogo
     Sempre que tal nos convém.


 Como era belo seu sorriso
 D'encantar o navegar!
 À Princesa achou preciso
 Ver de novo seu falar.

     - Como tu desejas ficam
     Estrelas no meu olhar:
     Doçuras, beijos que picam,
     A brisa e o marulhar,

 Com esta fala ficou
 A Infanta Gabriela,
 Um pintarroxo voou
 P’ra lá do castelo dela.


1991.06.19 (2)
SETUBAL
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RIMANCE DO CONDE NIÑO


Ia o Visconde Niño
Pelo caminho real
Com andar bem pequenino
Por causa do areal.

Cavalgava noite e dia
Por rio, vale e montes,
Quando o sol refulgia
Bebia água das fontes.

Um falcão no ar voava
Em busca do céu d'anil
Com o seu olhar buscava
Mui para lá do redil.

Numa curva do caminho
Oh! céus, cantando estava
Só, num ermo sózinho,
Quem pelo Niño chamava.

Era uma fada princesa
Com um manto de jasmim
Envolto em muita sageza
Num campo de alecrim.

Com pós de perlimpimpim
Seus cabelos penteava
Enquanto um bom lagostim
No fogaréu se cozinhava.

Bom, soberbo, valioso,
Cálido refrigerante,
Um apelo precioso,
Raro, belo, cativante.

Parou Niño, o Visconde,
Em pose primaveril;
Ao chamamento respondeu
Mui garboso, senhoril.

Com um gesto desenvolto
Tirou, de breu, o capuz,
Com o cabelo revolto
Guardou o arcabuz.

O cavalo à rédea solta
Ali ficou a pastar,
Sua verde crina envolta
Na doce brisa do ar.

A viseira levantada,
Pé em terra, sem temor,
Ao coração descansado
Cantou pacificador:

"Sinhá moça, és tão linda!
Com teu corpo donairoso
Comigo vem na berlinda
Mais teu mosto precioso;

Ao ver-vos sinto o luar
Aquecer-me sem ardor."
Disse o Conde sem pasmar,
armado em versejador.

"De vós não quero eu ser
Prisioneira, cativa,
Ide-vos, ensandecer
Qualquer outra nativa."

"Eu não vos quero guardar
Como o vento vós sois livre,
Assim ide cavalgar
Que não sóis do meu calibre!"

De negro ficou o céu,
De branco, o Visconde Niño,
Na montanha um escarcéu
Mui descontente o malino!

"Chorai, gaivotas, chorai,
Por dona tão altiva,
Na tempestade vogai
A nau presa, fugitiva."

No seu cavalo real
O herói vai abalar.
O canto acaba mal
Se o Conde não ficar?!


1991.Maio.23/28 - Setúbal
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RIMANCE de D.LUCIANO ROBERTO RODRIGO


D. Luciano é marinheiro
Navegando em alto mar;
É bem malino artilheiro
Sem terra onde aportar,

D.Roberto é pregoeiro
Caminhando pela terra dentro
Com bom fato sem dinheiro
Guardando novas do vento.

D.Rodrigo é narrador
De quadras ou verso branco,
Nas feições levando ardor
De ser como saltimbanco.

Luciano Roberto Rodrigo
Não é herói de novela;
Ide ouvir bem o que digo
Acerca de MarPorTela.

Mulher moça era aguardada
Com vera interrogação:
Seria colega apartada
No tempo da dispersão?

Finalmente a moça veio,
Trigueira como mil sóis,
Era pão, vinho e centeio
Num campo de gira-sóis.

Era outra MarPorTela,
Nunca vista e maneirinha,
Com ar doce, mui singela,
Cravo, rosa, porreirinha,

Era triste seu sorriso;
No seu magoado olhar
Sembrava ter muito siso!
Como iria navegar?!

Sendo mulher pensativa
Com seu ar muito sério
Parecia fugitiva
Com receio do despautério.

Tudo queria muito recto,
Direitinho, com acerto;
Sem mil voltas, mas directo,
P'ra matar o desconcerto.

Era sinhã moça bela,
Moça bela, d'encantar,
Raro se via à janela,
Palavrosa ou a veranear

Ao virar-se para D.Roberto
Seu sorriso era canção;
Papoila em céu aberto
Medrava por ele, não!

Mulher de maravilhar
Andando, mas sempre sózinha;
Ele com ela quis bailar
Liberto como andorinha.

- 01á, doce MarPorTela,
Como vais, bem ou mal?
Sem vagar vem à janela,
Vem bailar no arraial.

Mas a falar só ficava,
Nas mãos rolando o chapéu,
0 mote não encontrava:
Distante ficava o céu!

Pois na mansão dele entrava
Sem lhe lançar saudação;
Era andor que mal ficava
No meio da encenação.

P'ra Princesa tão galante
Mal era tal pedestal;
Parecia bem distante
Do povo, do maralhal.

Luciano Roberto Rodrigo
Tinha dela outra feição,
Bem ele quis ser amigo:
Não achou embarcação.

Se toda a vida é jogo
Biscando boa ou má vaza,
É preciso haver bom fogo
Para não ficar sem asa.

Pois a moça era gentil
Valerosa, bem sonante,
Não seria qualquer ceitil
Falso, de passar avante.

- Viva D. MarPorTela
Que fabricas, que me dizes?
Menina, deix'a sentinela
Não te cuides com juizes!

Luciano Roberto Rodrigo
Por si buscava El Dorado,
Cantando-lhe "Vem comigo,
Com andor bem torneado."

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... ... ... ... ... ...
... ... ... ... ... ...
... ... ... ... ... ...

Bem tocava o clarim!
Luciano em mau concerto,
Roberto perlimpimpim,
Rodrigo sem epicentro.

Palavras, tudo ilusões
De quem castelos no ar
Faz, em tarde com sezões,
Com sorriso a dar-a-dar.

Quem vir nisto semelhança
Com personagem real
Tire d'aí lembrança
Pois adivinha bem mal.

Nem tudo o que luz é d'ouro
Em verde campo florido:
Fica, porem sem estouro,
Rimanso, descolorido

1991.07.09/11
Paco de Arcos/Setúbal
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*****
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Rimance no deserto desertificado

 Sete anos andou João
 Vagueando p'lo deserto
 Sem vinho, água ou pão,
 Indo por destino incerto.

 A mingua d'água mirrava
 Sem o frescor duma fonte
 Em fome se esgotava
 Sequioso duma ponte.

 Em tiras estava o fato
 Sem veludo que se visse!
 Descalço o pé, sem sapato,
 A vida era uma sandice.

 Fizera grande viagem
 Com o coração cinzento
 Sem escudeiro nem pagem
 Ou pedra que fosse assento.

 Pela areia caminhava
 Joelho aqui, pé além.
 Na jornada trauteava
 Sem saber o que lá vem!

 Seu coração era grande
 Para quem lá coubesse
 Cantando mui radiante
 Como se mal não houvesse,

 Seu cavalo não era novo
 Cansado da caminhada
 De Luanda a Porto Covo
 Por terra já navegada,

 Que buscava não dizia
 Calado com seu segredo
 Por ver que não merecia
 Ser mal preso, em degredo.

 Seu caderno era escrito
 Com tinteiro invisível,
 Silencioso, sem grito,
 Em novela incredível.

 Então que é feito bela
 Deste rimance heroina,
 Personagem da novela,
 Tão certa como haver sina?

 Assim perguntava arraia
 Miúda como convém,
 Atenta ao rolar da saia
 Que na cintura mantém.

 Bem pesado é o fado
 De quem quer algo inovar
 Logo está ameaçado
 De não poder inventar!

 Não há princesa no conto
 Assim quero, pois então!
 Por isso aqui aponto
 0 que tenho na razão.

 Bem podeis vociferar
 0 cavaleiro vai sozinho
 Não tem quem acompanhar
 Indo só pelo caminho.

 "Sete anos serviu Labão ..."
 Assim Camões escreveu
 Mas não tem dona João
 Por nenhuma ensandeceu.

 Esta vida é um novelo
 Numa roca a girar
 Sem forma nem modelo
 Nunca para de rodar.

 Aqui nesta lazeira
 Em remanso vai surgindo
 Uma grande cantareira
 Verso a verso subindo.

 Deixemos o cavaleiro
 Seguindo a sua jornada,
 A caneta no tinteiro:
 Até 'manhã, camarada!



1991.06.20
SETUBAL

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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)