Caldas da Rainha
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Caldas da Rainha era para mim uma cidade onde a burguesia e a minha madrinha Cristina Santos iam veranear e como tal supunha que os seus edifícios teriam alguma monumentalidade e qualidade arquitectónica. Pura ilusão. A cidade é pequena e a parte antiga é triste, feia, incaracterística. No entanto persistem casas interessantes, algumas delas estilo arte nova. A parte nova, essa é igual à de outras cidades. O que me surpreendeu foi a existência de muitas "rotundas", maiores ou menores, com estátuas ou esculturas modernistas, (1) e alguns viadutos. Aliás Caldas é uma terra de ceramistas. Como não podia deixar de ser também tem os seus bairros pobres, como o das Morenas. Pelas ruas ainda se vêm carroças puxadas por um pachorrento e por vezes lazarento jerico ou mula.
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Tal como se referiu quando se falou de Óbidos, o desenvovimento das Caldas foi paralelo à decadência daquela vila, abandonada pela Corte e pela fidalguia devido às termas "milagrosas", ares mais salubres e mais convidativa ao veraneio e lazer.
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Edifício característico é o dos Pavilhões do Parque, do século XIX, com ar nórdico, erguendo-se aos céus, destinados a hotel, agora muito degradados, que inicialmente estariam agregados ao Hospital Termal fundado no século XV pela Rainha D. Leonor, que tem uma estátua insípida junta ao Parque. (2) Neste o Museu José Malhoa, contendo essencialmente pintura e escultura "naturalistas", como a do próprio José Malhoa, para além de Tomás da Anunciação, Silva Porto, Columbano e Henrique Pousão, e cerâmica de Bordallo Pinheiro. Numa sala central encontram-se estátuas características do Estado Novo, enaltecedoras de reis e descobridores.
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O Parque D. Carlos, que remonta ao século XIX, frondoso e fresco, onde agrada deambular, com um lago central, possui uma esplanada com péssimo serviço, como aliás muitas vezes sucede em casos similares, e estátuas espalhadas pelo relvado. Visitável o Museu da Cerâmica, como a tal do Zé Povinho e do manguito, figura popular tal como a Maria Paciência, que vi no Museu de Rafael Bordalo Pinheiro em Lisboa. Mas para além da cerâmica "característica" de Bordalo Pinheiro, tradicionalmente associada às Caldas, com motivos veggetais e de animais e das figuras de movimento, encontram-se novos motivos de expressão quer na cerâmica, quer na escultura e desta algumas passaram a figuar a minha pequena colexção de artesanato.
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No Museu José Malhoa existe também uma secção de cerâmica, com objectos da Real Fábrica do Rato e outros locais, como os dos Bordallos, Maria dos Cacos ou Manuel Mafra, a destes menos exuberante e multicolor e mais bisonha que a dos primeiros. No Museu da Cerâmica existe um atelier com azulejos e olaria executados pelas crianças das escolas da região, num projecto integrado.
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Para além da olaria e cerâmica vidrada, satírica ou naturalista, embora renovada, a estatuária. Para além das bienais de arte e da presença escultórica em tudo quanto é largo ou praceta, dois museus-atelier recolhem a obra de dois escultores locais: António Duarte (3) e José Fragoso.
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De referir a doçaria tradicional: beijinhos, cavacas, trouxas de ovos e lampreias.
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Achei interessante mas não entusiasmante a torre sineira manuelina, quadrangular, da Igreja do Pópulo, com um relógio em cada uma das faces e um telhadinho de duas águas por cima de cada um dos lados da torre. Este templo era a antiga capela do Hospital e nas traseiras deste encontra se uma frondosa mata e o antigo Paço Real. De referir a Praça da República (4). Trata-se duma praça sobre o comprido, como a do Giraldo em Évora, mas menos monumental e sem arcadas, constituída por edifícios de dois ou três pisos, com varandas de sacada no primeiro andar, onde todas as manhãs se realiza o mercado de frutas e legumes, de que me lembrava apenas da Pastelaria Bocage. Aqui existiam também uns Armazéns do Chiado, tal como em Coimbra, e o antigo edifício da Câmara Municipal, com sino, hoje posto de turismo. Doceiro, também se situa aqui na Praça da Fruta um Café Bocage
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A cidade possui um chafariz célebre, o das Cinco Bicas, na rua Diário de Notícias, embora lhe prefira o da Estrada da Foz, sendo ambos do século XVIII. (Notas de Viagem, 1997/1998)
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1 - Esculturas provenientes das bienais aqui realizadas, promovidas pela Câmara local.
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2 - O Hospital construído à custa de rendas e jóias da Rainha, no tempo de D. Joãp II, que por esse facto não consta tenham ficado na miséria. Imagine-se a riqueza de reis e rainhas! A traça actual deve se a Manuel da Maia, um dos arquitectos reconstrutores de Lisboa após o terramoto de 1755. Contudo, posteriormente, foi-lhe acrescentado um novo piso, salvo erro já no século XIX
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3 - Foi este escultor que fez a máscara mortuária e o molde em gesso da mão direita de Oliveira Salaza, sem que posteriormente alguém se tivesse interessado por isso ou pago o trabalho.
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4 - Largo, Praça ou Rua da República, 5 de Outubro e Miguel Bombarda encontram-se um pouco por todo o Portugal! Tal como o Marquês de Pombal.
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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)