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5 - - Pelos coutos de Alcobaça
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No século XII D.Afonso Henriques teria prometido a Frei Bernardo de Claraval a concessão de vastas terras caso conquistasse Santarém aos mouros. Feito conseguido, promessa cumprida, até porque a influência da novel Ordem de Cister junto do Papa era importante para que este reconhecesse a independência do Condado Portucalense. Ordem que se caracterizava pela austeridade de vida, em contraste com a daquela donde haviam provindo, a de Cluny. E assim, em terra de fronteira, os abades se viram donos de planícies, esteiros, pântanos, serras, portos e braços de mar, que havia necesidade de povoar, quanto mais não fosse para serem um tampão às arremetidas dos maometanos. Esta ordem de Cister provinha da de Cluny, a qual derivara dos Beneditinos. Cada uma delas procurara ser mais austera que a anterior, entretanto caídas na opulência. No entanto com o passar dos tempos entre os cistercenses o ascetismo e a frugalidade foram sendo esquecidos, de tal modo que nos finais do século XVIII William Beckford refere a luxúria dos abades, amantes da pinga e da comezaina. Talvez sejam frades destes que tenham originado a expressão Comer que nem um abade!
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Nesse tempo o mar chegava a Óbidos, Alfeizerão e Cela; o assoreamento destas regiões, contudo, obrigaram à secagem dos pântanos, tornando o ar saudável e o solo fértil. A exploração das terras foi feita directamente pela Abadia de Alcobaça, nas granjas, ou indirectamente, através dos coutos, estes sob orientação técnica dos abades, ao qual se acolhiam foragidos da justiça, onde a do rei os não podia buscar. A prática dos cistercenses resultava duma das regras da ordem, a qual privilegiava o estudo e o trabalho, este como fonte do abastecimento dos seus monges, em contraposição às ordens mendicantes, que também proliferavam na idade média, e que viviam das esmolas. Contudo, o poder da Abadia acabou por ser de tal ordem que nos seus domínios não se gritava aqui d'el rei, mas sim aqui do abade! Nem mesmo D.João I ousou atender às reclamações das populações de alguns coutos perante as prepotências da abadia, como pretendia o povo de Évora de Alcobaça.
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Com o tempo a exploração dos coutos e do trabalho de outrem ganhou mais importância, sendo aqueles em nome de 13, cada uma das vilas com sua câmara e pelourinho. além de hospital da misericórdia. Algumas desenvolveram-se, mas outras, como a de Paredes, desapareceram. A abadia tinha os seus próprios portos para escoar os seus produtos: Alfeizerão, Parede, Cela Velha, Pederneira, S. Martinho do Porto ... Em frente deste último ficava Salir do Porto, este pertencendo às terras da Rainha, tal como Óbidos..
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Dalgumas vilas se fala noutro local, pelo que não se repetirão aqui: Alfeizerão, Aljubarrota, Cela, S. Martinho do Porto e Pederneira.
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Assim, nas linhas seguintes referir-se-ão os coutos de Alvorninha, Évora de Alcobaça, Santa Catarina, Cós, Maiorga e Turquel e povoações como Alcobertas.
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Por toda a região existem vestígios manuelinos, em pelourinhos, pórticos de igrejas e algumas janelas, conjuntamente com inúmeras lendas, umas de carácter religioso, outras envolvendo os mouros que por algum tempo ocuparam esta região. (Notas de Viagem, 1997.12.09)
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Alvorninha
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No caminho para Rio Maior resolvi desviar-me para Almofala e Alvorninha. Da primeira não vi rasto, mas a segunda revelou-se uma pequena povoação simpática, no meio da serra, com duas igrejas, a matriz, com um portal manuelino, e a da Misericórdia, consagrada ao Espírito Santo, alpendrada (galilé), ao cimo duma escadaria, tendo adjacente o que terá sido o hospital, agora ocupado por uma sociedade recreativa. O interior desta última igreja está coberto de azulejos não figurativos. Junto à outra igreja, de N. Sra. da Visitação, com um portal manuelino, existem um cruzeiro (1940) e um painel de azulejos que relembra a passagem de D. Afonso Henriques por estas regiões, bem como o amanho das terras. Testemunho das comemorações dos 400 anos da independência de Portugal e dos 300 da restauração da sua restauração.
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Alvorninha foi uma vila importante, mais notável que as Caldas da Rainha, mas essa grandeza esfumou-se com o passar do tempo e das águas.
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Nos arredores, numa encosta, o edifício duma quinta, que não sei se será a de S.Gonçalo. (Notas de Viagem, 1997.12.09)
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Trabalhia e Senhora da Luz
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De Trabalhia retenho uma capela (de S. Braz ou de N. Sra da Esperança ?) e meia dúzia de casas. Mais adiante, após a passagem por Alvorninha, a minha atenção é desperta por uma capela junto à estrada, na esquina do caminho que leva a Quintão. A capela, com uma varanda alpendrada, está ao abandono e pela janela vê-se o interior, com teias de aranha, um crucifixo e uma jarra com flores. Trata se da Capela da Senhora da Luz, com a data de 1858 inscrita. (1) (Notas de Viagem, 1997.12.09)
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Vestiaria
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Quase a chegar a Alcobaça, a 3 km, procuro pela igreja matriz de Vestiaria, da Senhora da Ajuda, que encontro ao cimo duma rampa, sendo destacável o seu portal manuelino. O interior é despido, tal como sucede na igreja de Cela-a-Nova. Adjacente, o cemitério. Na base da rampa, numa garagem, uma sede de campanha do PS, neste tempo de campanha autárquica, aberta mas sem vivalma.
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A esta igreja está ligada uma lenda, mais uma, envolvendo uma imagem desaparecida. Conta-se que alguns religiosos acossados pela peste procuraram abrigo no mosteiro de Alcobaça, transportando uma imagem da Senhora da Ajuda. Mas quase à chegada pararam num lugar alto, supondo que os bons ares afastariam os malefícios da peste. Esperança baldada, pelo que o último a morrer a enterrou em sítio ermo, na crença que alguém a descobrisse no futuro, o que veio a suceder, no local se erguendo a igreja de que falámos.
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Prosseguindo a descida, numa curva da estrada, avista-se o mosteiro de Alcobaça, lá em baixo no vale.
(Notas de Viagem, 1997.12.09)
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6 - Nova viagem pelos coutos de Alcobaça
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Das antigas vilas dos coutos de Alcobaça faltava visitar as de Santa Catarina, Turquel e Évora de Alcobaça. A maior parte da viagem fez-se por estradas secundárias, estreitas, esburacadas, atravessando zonas por vezes despovoadas e outras onde predomina o povoamento em pequenos aglomerados dispersos no fundo dos vales ou pelas encostas verdejantes. Este é cada vez mais um país de auto-estradas ligando os principais centros populacionais, com menosprezo crescente pelas ligações por onde não passam turistas, importantes homens de negócios ou camiões TIR!
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Couto (Côto)
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Perto da Tornada, pela Rua dos Queridos acima, dirigimo nos ao Couto ou Côto,(5) que nada de notável nos mostra: um cruzeiro e um poço com bomba de água, ambos à beira da estrada. Da toponímia registo a estrada da Laje e as ruas dos Lagares, do Forno, do Vale Velho, do Ramalhal, do Moinho Velho, da Eira, das Flores e da Associação, para além da travessa Estreita e do Beco da Belavista. Já fora da povoação deparo com a Rua do Sol Nascente.
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À noite um modesto fio com lâmpadas presas ilumina a escuridão, enquanto se ouve a chinfrineira de música solta por altifalantes roufenhos, chamando a atenção para duas tendas à beira da estrada, donde se evolam núvens de fumo, junto à sociedade recreativa (ARECO). Trata-se da pomposamente denominada Festa do Chouriço, anualmente realizada em 7 e 8 de Fevereiro. Numa das tendas vendemse-se produtos secos e na outra, junto a umas mesas com bancos corridos, serve-se pão com chouriço assado e sopa de pedra, sendo o pão cozido em três fornos colocados sobre um atrelado.
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A sociedade é o ponto de encontro dos coutenses e na sala do bar encontram-se azulejos polícromos com cenas campestres. No ginásio situam-se as casas de banho, com nota de humor: azulejos azuis fazem a diferenciação de sexos - numa, representa-se uma mulher meio agachada, de saia levantada, noutra, um homem direito de calças semi-arregaçadas!
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À Igreja ascende-se por uma escadaria, donde se avistam os campos em redor; no adro um painel de azulejos regista um enorme poema religoso, que não fixo.
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Santa Catarina
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Por esta povoação passara na vez em que fôramos à Benedita comprar uma botas. Na altura era uma fiada de luzes avistada numa curva da encosta, lá em baixo no vale. No largo principal, chamado do Pelourinho, situa-se uma igreja modernizada, com altares de talha dourada ("outrora é que era bonita", conta me um velhote ilustrado com outros dois sentado num banco), o pelourinho, a antiga casa da Câmara, um solar setecentista (com uma capela arruinada), para além dum modesto jardim com caramanchões e um fontenário. Passeio pelas ruas e registo os seus nomes: o beco do Moinho e as ruas do Lagarão, do Jardim, do Arsenal, do Paiol, do Caixeiro, Direita e da Índia. Deparo com muitas casas arruinadas e outras para venda.
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Entre as várias histórias referidas pelo velhote, que tinha lá em casa um livro assinado contando histórias da região, registo a que se refere ao Casal do Coito (?!), onde eram acolhidas as crianças sem pai nem mãe, para além de esclarecer que a forca se situava num cabeço fronteiro, fora da vila, mas que constava que ninguém fora lá executado.
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Foi esta uma vila importante, embora a importância seja relativa ao tempo e à era; com efeito, em 1527 teria ... 31 moradores na vila e 69 no termo, possuindo até 1834 duas Companhia de Ordenanças para manter a ordem!
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Évora de Alcobaça
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Por maus caminhos, a corta serra, acabamos por chegar a Évora de Alcobaça, depois de passarmos por uma povoação incaracterística, Vimeiro, que foi granja do Mosteiro num vale aprazível.
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Mas é de Évora que falaremos e esta foi uma povoação importante, conservando ainda o pelourinho e duas igrejas com portas manuelinos, tendo a matriz de Santiago-o-Velho, sobre uma porta lateral, um baixo-relevo medieval representando Santiago Mata-Mouros. Na igreja mais pequena, da Misericórdia, na fachada a Sul, um pequeno portal maneirista ostenta uma pequena caveira.
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A rua principal tem alguma simpatia e da toponímia registo as ruas de Cima, do Norte, de Valverde, Nova e do Outão.
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O tempo não deu para nos arredores visitar nem o Convento de Santa Maria Madalena, nos Capuchos, fundado pelo Cardeal D. Henrique, nem o Arco da Memória, no alto da Serra dos Candeeiros, situado nos limites das freguesias de Évora de Alcobaça e do Arimal, a uns quilómetros da Portela do Pereiro, nem o lagar fradesco das Antas.
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Turquel
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Prosseguindo a viagem a corta-mato, para sul, deparamos com Turquel, outrora denominada Villa Nova de Turquel, com prédios modernos, altos, e com mais vida, nos cafés - parece uma povoação mais cosmopolita emodernaça, até no trajar das pessoas. Contudo é uma povoação menos simpática que a anterior, com o pelourinho perdido no meio de casas sem história. A Igreja matriz de N. Sra. da Conceição, mandada edificar pelo Cardeal D. Henrique, tem um portal manuelino mais pobre e não conseguimos nela entrar, apesar dos cânticos que se ouvem, pois as portas interiores encontram-se aferrolhadas. Entre esta e o largo do Pelourinho situa-se a Capela do Senhor do Hospital, da antiga Misericórdia. Nela existe um crucifixo carbonizado que segundo a lenda teria sido deixado por um mendigo que por uma noite se albergara e desaparecera sem deixar rasto. Aliás lendas não faltam na região, relacionadas com mouras, mais ou menos encantadas.
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Na íngreme e calcetada rua da Neta persistem algumas casas rurais, duas delas com escadaria exterior. Registo outros nomes como o do largo do Pelourinho e as ruas do Relego, Principal, do Lagar e do Outão.
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Daqui seguimos de novo para norte, rumo a Alcobaça. (Notas de Viagem, 1998.02.08)
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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)