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* Victor Nogueira
Sobre o cinema
Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são.
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(excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973)
http://mundophonographo.blogspot.pt/2007/08/sobre-o-cinema.html
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Dois filmes sobre o Amor
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Nas minhas idas a Lisboa, acabadas as reuniões, vou até ao cinema. Gosto de ir às sessões do fim de tarde. Duma das últimas vezes gostei muito da Idade da Inocência: um filme muito bonitinho, de Martin Scorcese, mas duma extrema violência, passado na alta sociedade nova iorquina da passagem do século. Sob o manto diáfano das boas maneiras e dos sorrisos, a extrema violência da hipocrisia e das convenções sociais, da escolha da segurança e do bem-estar em detrimento da loucura do amor e da paixão.
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Outro filme que vi foi M.Butterfly. A Madame Butterfly é uma ópera que canta os amores dum ocidental por uma japonesa, que se suicida quando aquele a abandona, comoventemente para o público ocidental. Com base nisso, o filme narra a paixão (verídica) dum diplomata francês (interpretado por Jeremy Irons) pela intérprete de M.Butterfly no Teatro de Pequim. E o que parecia uma grande paixão, iniciada na China e prosseguida em Paris, anos mais tarde, não passaria duma sórdida história da paixão e degradação dum homem apaixonado por outro homem, ambos presos e condenados por espionagem.
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Claro que uma leitura linear pode levar-nos a perguntar como pode um diplomata desconhecer que na China os papéis femininos eram interpretados por homens (como aliás na Europa, nos tempos de Shakespeare ou de Gil Vicente) ou como pode um homem manter uma relação amorosa com uma mulher (afinal homem) que simula uma gravidez ( que implica a existência de relações sexuais ) sem que alguma vez durante anos o suspeite? (Aliás caso semelhante teria acontecido em Portugal com a história da generala).
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Mas é o próprio francês que nos dá a resposta, quando afirma que se apaixonou não por um homem, mas sim por uma mulher criada por um homem (e quem melhor que um homem pode saber o que um homem pretende duma mulher, perguntar-se-á? Ou, na mesma ordem de ideias quem melhor que uma mulher para saber o que uma mulher espera de um homem? ). E no fim é o francês que se suicida, num acto teatral, travestido de Madame Buterfly, enquanto o espião chinês é deportado para a China).
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Afinal todo o amor (ou a paixão?) não será senão uma encenação, uma ilusão dos sentidos, uma elaboração mental, uma construção ( social ? ) que em certa medida a sabedoria popular expressa em ditos do género O amor é cego ou Quem o feio ama, bonito lhe parece ?! O que me levaria ao programa do Júlio Machado Vaz, Sexualidades, que já não via há muito tempo, ontem dedicado ao namoro e ao casamento ou ajuntamento, ao (des)conhecimento das pessoas, aos papeis masculinos e femininos, com filhos, filhas e algumas mães e nenhum pai. Por sinal todas as mães presentes (nenhuma divorciada ou solteira) com ausentes mas compreensivos maridos.
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É impressionante como a maioria dos homens e das mulheres (esposas e mães incluídas) se educam mutuamente, não para a liberdade e o respeito mútuo, não para a entreajuda e a solidariedade, mas para a negação disto tudo. Aqueles seriam pais e filhos diferentes da maioria, apesar de tudo.
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É difícil ser diferente, querer construir uma relação à margem das convenções sociais, que não libertam mas aprisionam. (MMA - 1993.09.20)
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Um Amor Inevitável
O filme conta com humor a história dos (des)encontros do Harry e da Sally. No primeiro detestaram-se, porque nada tinham em comum (o que não foi o nosso caso), no segundo tornaram-se amigos (o que aconteceu connosco) e no terceiro casaram-se (o que ainda não sucedeu connosco). O primeiro encontro é numa viagem que fazem juntos, para a universidade, durante a qual Harry afirma que é impossível um homem e uma mulher atraente serem amigos porque surge sempre o desejo de sexo pelo meio. Na sequência do segundo encontro, anos mais tarde, Harry confessa a um amigo que é amigo de Sally e como não há mais nada pelo meio não precisa de mentir-lhe e podem falar e estar á vontade um com o outro. Á terceira casam-se mesmo.
O filme tem cenas deliciosas. Numa delas, na fase em que eles são apenas amigos, á mesa dum restaurante Harry gaba-se do seu sucesso entre as mulheres, o que leva Sally a interrogá-lo sobre os fundamentos da sua presunção. Perante a convicção dele de que um orgasmo não se simula, ela, na cadeira, com a voz e gestos, "representa" uma cena de amor e orgasmo, finda a qual termina voltando á pose anterior como se nada se tivesse passado perante a estupefacção dos comensais e o embaraço do presunçoso. Pois é, nesta sociedade pretensamente dominada pelos homens, a estes cabe a presunção da iniciativa, mas nem sempre a conseguem fechar com chave de ouro!
Em África Minha identifico-me com o modo como aquele homem e aquela mulher tentaram e em certa medida conseguiram viver o seu amor respeitando a independência de cada um deles. (MMA - 1993.09.15)
http://aoescorrerdapena.blogspot.pt/2012/01/victor-nogueira-um-amor-inevitavel.html
- Edite Pinheiro, Teresa De Sampaio Lança, Maria Célia Correia Coelho e 19 outras pessoas gostam disto.
Carlos Rodrigues Excelente reportagem cinematográfica. Não vi o Amor inevitável, mas de algum modo há aí cenas que parecem, modestamente, antecipar, a Emanuelle, embora já não me recorde se
Maria Conceição Cerdeira adoro a madame buterfly...opereta :))) e adoro historias de amor no cinema, na vida real nem sempre acabam bem...como no cinema que quase sempre acabam bem, salvo ao que me lembro as "pontes de madisson county" e sobretudo nem sempre conseguimos fazer o aproveitamento /crescimento com sabedoria para as nossas vidas18/8 às 18:38 · · 2
Maria Conceição Cerdeira Um dos filmes que mais me tocou foi O VEU PINTADO...uma verdadeira historia de compaixão e do que deve ser o verdeiro amor...ela simplesmente uma traidora, ele nao desiste dela e leva-a para o oriente naquilo que é a missão humana de vida dele, ser medico na asia, num cenario de pobreza, ela uma mulher preconceituosa e de sociedade acaba por o amar na pior das vivencias e admira-lo
Maria Conceição Cerdeira Vi a guerra das rosas, isso é a historia da minha vida quase lol....um amor /paixão louca que se transforma num odio de vida do outro lado so me falta levar com o candeeiro em cima ahahahah18/8 às 18:46 · · 1
Maria Conceição Cerdeira Viste "dormindo com o inimigo"....igualzinho a mim ahahahha18/8 às 18:48 · · 1
Maria Conceição Cerdeira o perfil psicologico dele, do personagem principal está fantasticamente construido no ecrã lol...até a cena das toalhas obssessivo, ui onde eu vi isso, o facto dela ter TUDO...o que a vida pode oferecer de material, mas viver com um LOUCO...
Maria Conceição Cerdeira O cinema bem feito expõe muito bem emoçoes, sentimentos e casos de vida reais...a dimensão do ser humano :)
Maria Conceição Cerdeira O ultimo filme do Woody Allen "midnight in Paris" da uma chicotada nas convenções também, nao gostei á primeira muito do filme...mas tirei-lhe o significado real e sobretudo a descoberta do EU...ha o que achamos que é ideal na vida até percebermos que algo nos desperta para a nossa essencia VISTE???????????
Maria Conceição Cerdeira um dos filmes mais fantasticos que vi na vida, foi do Claude Lelouch "les Uns et les autres" ...viu????
Victor Nogueira Não estava aqui, Maria Conceição Cerdeira. Sim, vi "Dormindo com o Inimigo" e as "Pontes de Madison County". O do Woody, não, e o do Lelouch, não me lembro.. Mas do Lelouch deixo-te uma crónica minha acerca de "Viver por Viver" :-)
18/8 às 21:13 · · 1 ·
Isabel Reis Martim Scorsese um dos meus realizadores...destes filmes só não vi a M Butterfly ...Africa Minha inesquecível o papel da Meril Streep a minha actriz favorita...cinema um tema muito interessante :)))18/8 às 21:57 · · 1
Diamantina Evaristo Adoro cinema e acho que não sou capaz de seleccionar um só filme como o preferido. Nuns, gosto de umascoisas , noutra de outras.No entanto, talvez o Cinema Paraíso contenha e consiga transmitir toda a magia do cinema.19/8 às 22:11 · · 1
Diamantina Evaristo Vi agora Les amis improbables e gostei bastante. recomendo, vitor!19/8 às 22:12 · · 1
Victor Nogueira
Diamantina Evaristo A magia ... do nosso tempo. Qd os meus filhos eram pequenos fui com eles uma vez ao Condes, em Lisboa, e um deles ficou admiradíssimo com as proporções, habituados que estavam às salas dos centros comerciais, sem os int
ervalos e as conversas neles. Que é hoje para a maioria dos jovens o cinema, com o "cinema" em dvd's, no monitor da TV ou do computador ?
Por outro lado mesmo nas aldeias deste país o cinema ambulante não cativaria ninguém. Noutro registo o cinema paraíso é similar ao Carteiro de Pablo Neruda
Margarida Piloto Garcia Agora não tenho tempo para dizer tudo o que queria. Aliás, para fazê-lo tínhamos horas de conversa. Mas voltarei aqui para dizer algo mais até porque vi todos estes filmes. bj.20/8 às 11:23 · · 1
Pessoas que gostam disto
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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)