terça-feira, 18 de outubro de 2016

manhã de outono com ilusões de óptica


* Victor Nogueira

Não está poeticamente outonal nem soalheira e dourada a manhã, mas invernalmente cinzentonha e chuviscosa. Para lá da vidraça mas para cá do horizonte voam pássaros em cerradas e velozes formações, a  rasar o solo. Tudo é silêncio, salvo o zumbido nos meus ouvidos, quebrado pelo hoje raro sobrevoo desta ou daquela aeronave, e o baque rápido e compassado  do meu dedilhar nas teclas - com intervalos de silêncio para refazer adequadamente esta ou aquela expressão ou palavra.

Os regos do cegado milheiral convergem para o edifício branco lá longe, tal como as hastes remanescentes do milho se alinham em rectilíneas fileiras, junto ao solo.  Olho novamente pela janela e a mata verde escura parece-me mais próxima e não tão longínqua. Mas nem este é o Castelo de Dunsinane, nem aqui mora Macbeth. Logo, aquela não é a Floresta de Birnam. 

Levanto-me, aproximo-me da vidraça e de facto, envoltas pelo nevoeiro, as árvores e as casas que bordejam o campo parece terem aumentado de tamanho e parece estarem muito mais próximas, como se estivessem agora ao alcance dum braço estendido. Vou buscar a Canon e pelo visor tudo  me parece como habitual, às distâncias habituais. O terreno do quintal está despido e castanho - dentro em breve germinarão  as nabiças - as folhas dos feijoeiros vão-se desverdando em tons de amarelo  - é tempo de colher as últimas vagens - e algumas dálias laranja e rosas avermelhadas como vinho tinto timidamente tentam dar alguma cor ao tristonho meio-ambiente que me cerca. 

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Águas passadas não movem moinhos? Bem ... enquanto passaram podem ou não tê-los movido e assim ajudado ou não a produzir a farinha para o pão que alimenta o corpo sem o qual o espírito não existe. (Victor Nogueira)