Este postal é - creio - uma fotografia retirada dum dos dois filmes que há dias vi sobre as campanhas de alfabetização, as tais em que eu gostaria de ter participado em Agosto último se ... Esta cena do filme era comovente: uma mulher que até aí não sabia comunicar por escrito, conseguir fazê-lo. A procura das sílabas, o gesto hesitante, o voltar atrás para corrigir ou desenhar melhor a letra !!! Deve ser bestial um tipo descobrir que sabe ler, não achas? (1974)
Escrevivendo e Photoandando
No verão de 1996 resolvi não ir de férias. Não tinha companhia nem dinheiro e não me apetecia ir para o Mindelo. "Fechado" em Setúbal, resolvi escrever um livro de viagens a partir dos meus postais ilustrados que reavera, escritos sobretudo para casa em Luanda ou para a mãe do Rui e da Susana. Finda esta tarefa, o tempo ainda disponível levou me a ler as cartas que reavera [à família] ou estavam em computador e rascunhos ou "abandonos" de outras para recolher mais material, quer para o livro de viagens, quer para outros, com diferente temática.
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Depois, qual trabalho de Sísifo ou pena de Prometeu, a tarefa foi-se desenvolvendo, pois havia terras onde estivera e que não figuravam na minha produção epistolar. Vai daí, passei a pente fino as minhas fotografias e vários recorte, folhetos e livros de "viagens", para relembrar e assim escrever novas notas. Deste modo o meu "livro" foi crescendo, página sobre página. Pelas minhas fotografias descobri terras onde estivera e juraria a pés juntos que não, mas doutras apenas o nome figura na minha memória; o nome e nada mais. Disso dou por vezes conta nas linhas seguintes.
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Mas não tendo sido os deuses do Olimpo a impor me este trabalho, é chegada a hora de lhe por termo. Doutras viagens darão conta edições refundidas ou novos livros, se para tal houver tempo e paciência.
Sobre a terra, no horizonte, cinza por debaixo da brancura das nuvens, como se estas fossem ondas do mar encapelado. Entre estas e o cinzento que tudo cobre, uma réstia de azul claro. Lá em baixo, no parque verde, um homem brinca com o cão; algumas árvores já estão despidas de folhas, com os ramos descarnados, enquanto a maioria ainda este coberta de verde e duas têm as folhas da cor do amarelo do Outono. Faz frio: dento de casa o termómetro marca 19º C.
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Neste preciso momento o sol, algures para lá a minha janela, a caminho do poente, deve ter rompido pelas nuvens porque uma claridade imensa invadiu o escritório, mas já desapareceu voltando o tom sombrio, enquanto escrevia as palavras anteriores. Como se diz em português, «Foi sol de pouca dura»
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O correio electrónico traz apenas news letters e alguns mail interessantes mas não dirigidos especialmente a mim. Por outro lado estou cada vez mais cansado da virtualidade das pessoas na internet e de manter nove blogues e três grupos sociais.
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Estou triste e desanimado e vou deitar-me. Se acordar a tempo irei buscar os jornais e à Baixa. Tenho de tratar da Contabilidade do prédio, introduzindo os dados no computador, o que ainda não fiz por causa do acidente que tive em Abril. Precisava de sair, de espairecer mas não gosto de andar sempre sozinho!
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Foto Victor Nogueira (Guincho - Cascais)
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01 - Os Vampiros
(José Afonso)
No céu cinzento
Sob o astro mudo Batendo as asas Pela noite calada Vem em bandos Com pés veludo Chupar o sangue Fresco da manada Se alguém se engana
Com seu ar sisudo E lhes franqueia As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
A toda a parte
Chegam os vampiros
Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas
Trazem no ventre
Despojos antigos
Mas nada os prende
Às vidas acabadas
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São os mordomos
Do universo todo
Senhores à força
Mandadores sem lei
Enchem as tulhas
Bebem vinho novo
Dançam a ronda
No pinhal do rei
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Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
No chão do medo
Tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos
Na noite abafada
Jazem nos fossos
Vítimas dum credo
E não se esgota
O sangue da manada
Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
John Reed (1887 / 1920) foi um jornalista norte-americano, membro do Partido Socialista dos EUA e um dos fundadores do Partido Comunista dos Trabalhadores (dos EUA), após a Revolução Bolchevique, que acompanhou e deu origem ao seu livro "Os 10 Dias que Abalaram o Mundo", o qual esteve na base de películas cinematográficas como "Outubro", de Sergei Eisenstein (1927), e "Reds", de Warren Beatty (1981). Tendo também acompanhado a Revolução Mexicana de 1910, como repórter, sobre ela escreveu "México Insurgente", que esteve na base de filmes como "Que Viva México", de Sergei Eisenstein (1932), e "México Insurgente", de Paul Leduc (1971). John Reed, que como repórter cobriu a 1ª Guerra Mundial, participou activamente e tomou partido naqueles dois processos revolucionários. A sua luta nos EUA e a sua participação em manifestações operárias esteve na base da sua prisão. Foi colaborador do periódico socialista "The Masses", publicada de 1911 a 1917. São as suas experiências e vivências que estão na base dos contos insertos em "A Filha da Revolução e Outros Contos".
Desta feita partilho um dos seus contos, [de que Carlos Rodrigues, em comentário a esta NOTA, captou a essência: "uma crónica ou ficção interessante sobre a sobrevivência e astúcia ou a inocência de uma aparente " ingénua da província" mas que, corajosamente, enfrenta, a seu modo, a dura realidade Nova Yorkina do tempo, capaz de desfazer todos os seus sonhos de infância."]
JOHN REED – VER PARA CRER
in http://daliedaqui.blogspot.pt/2015/01/john-reed-ver-para-crer.html
Carlos RodriguesNão é bem o John Reed dos " 10 dias que abalaram o mundo ", mas uma crónica ou ficção interessante sobre a sobrevivência e astúcia ou a inocência de uma aparente " ingénua da província" mas que, corajosamente, enfrenta, a seu modo, a dura realidade Nova Yorkina do tempo, capaz de desfazer todos os seus sonhos de infância. Também gostei das imagens de Sergei Eisenstein e recordei o filme dele no Império, talvez o primeiro que vi, após o 25 de Abril: " O couraçado Pomtkin ", anteriormente impossível de ser exibido em Portugal, ou por ser o primeiro que vi não censurado,, só por isso o apreciei mais do que qualquer outro dos proibidos até então. Obrigado, Vitor. Bom Domingo.
Silvia MendonçaReds é um filme estadunidense de 1981, um drama biográfico dirigido por Warren Beatty e baseado na vida de John Reed, um jornalista e escritor socialista norte-americano que retratou a Revolução Russa em seu livro Dez Dias que Abalaram o Mundo. Isso é fato! O filme retrata a vida do jornalista norte-americano John Reed, desde a época em que era repórter do periódico socialista The Masses no início do século XX, até a fundação do Partido Comunista dos Estados Unidos. Sua vida conjugal com Louise Bryant, também merece destaque especial na primeira parte do filme. O filme prossegue, mostrando a participação de John na Revolução Russa em 1917, seus contatos com importantes lideranças e as divergências internas que já aparecem no movimento comunista da União Soviética. Dessa participação John realizou a mais famosa cobertura jornalística da revolução, imortalizada no livro Os dez dias que abalaram o mundo, um clássico sobre a história da Revolução Bolchevique, altamente elogiado por Lenin. Durante a existência da União Soviética, John sempre foi tratado como uma espécie de herói na visão internacionalista do socialismo. Morreu em Moscou vítima de tifo com 44 anos. Trata-se do único estrangeiro, que morrendo na União Soviética, teve seu corpo enterrado com grandes honras nas muralhas do Kremlim, ao lado do mausoléu de Lenin.
Curiosidades durante o filme:
Durante as filmagens,
Beatty ensinou aos figurantes russos sobre a exploração capitalista a fim de inspirá-los. De acordo com a revista Total Film de 2004, esta foi a quarta "pior decisão na história da filmografia": os figurantes entraram em greve exigindo melhores pagamentos.
O filme recebeu uma indicação em cada categoria de atuação no Oscar de 1982, feito que só foi realizado novamente 31 anos depois com o filme O Lado Bom da Vida em 2013, e mais recentemente com o filme Trapaça em 2014, ambos do cineasta David O. Russell.
O escritor Henry Miller e o educador radical e pacifista Scott Nearing, então com 98 anos de idade, fizeram participações como testemunhas da época em que se ambienta o filme.
Warren Beatty começou a filmar as entrevistas com as "testemunhas" no início de 1970.
Gene Hackman fez parte do filme como figurante no papel de Pete Van Wherry. A cena em que ele diz a Jack Reed que Louise Bryant não trabalhava mais para ele foi filmada cem vezes. Hackman disse que não filmaria a centésima primeira e foi atendido.
Victor Barroso NogueiraSilvia Mendonça Grato pelo complemento no teu comentário. Carlos Rodrigues Captaste a essência do conto que acrescentei ao texto preliminar desta minha nota. Claro que os contos desta colectânea são "cenas" inspiradas no quotidiano de John Reed, e situam-se quer nos EUA, quer no México, quer na Europa, durante a I Guerra Mundial. Há neles uma empatia pelos "desprotegidos" e ironia sobre os enfatuados, como noutro conto, sobre americanos ou ingleses que decidem participar na carnificina da I Grande Guerra, movidos não por ideais mas apenas no tradicionalismo ou basófia. No final da nota está uma hiper-ligação para o conto que deu nome à colectânea - "A Filha da Revolução", que reproduzo
Viriato F. SoaresObrigado pela partilha Victor, vou ler com atenção, o filme que vi no cinema há anos, não reflecte com exactidão a realidade histórica!
Victor Barroso NogueiraViriato F. Soares Outubro, de Eisenstein, baseia-se na crónica de John Reed. Reds (Vermelhos) é uma biografia de Reed, como se vê no comentário de Silvia Mendonça, onde naturalmente surge tb a Revolução Russa de 1917.
Margarida Piloto GarciaÉ um longo texto que muitos não terão paciência para ler. Eu, como leitora inveterada, li-o num ápice e voltei a relê-lo mais pausadamente para lhe captar toda a essência. Obrigada Victor por esta partilha extremamente interessante.