* Victor Nogueira
Desertos estavam os salões
no Palácio adormecido
a vida apenas figurada em azulejos.
Brilhante era a tarde e para lá das vidraças
verdes eram os campos
onde saltaricavam rolas
A Ribeira da Laje, um lençol de água esverdeada que lenta escorria
- onde sinuosamente fluíam os robalos.
Como em mim era o dia.
Lado a lado percorremos os corredores, o jardim,
entre-avistámos a pérgula
procurando a saída para a rua
cálida e serena.
Toda a tarde estive em ti como ave inquieta
Toda a tarde caminhei a teu lado
frágil canavial agitado pela brisa
riacho silencioso serpenteando por entre as pedras
Toda a tarde me calei no burburinho do meu verbo
e procurei em ti
o sol no teu olhar
a serenidade no teu sorriso
o acetinado do teu braço no meu ombro
o meu descanso na concha da tua mão
a harmonia da tua voz cristalina.
Toda a tarde caminhámos lado a lado
e agora, que partiste,
ficaram em mim a sede, a solidão e o desassossego..
Como Carta de Ítaca
de Ulisses fraco poema este é:
paupérrima carreirinha de palavras
estioladas como as flores no jardim
sequiosas de água que dessem vida à secura,
Na memória do jardim,
onde lado a lado apenas
caminhámos
crescem as sombras do anoitecer
em diluição da paleta do arco-íris.
Quando partes
fica em mim a nossa ausência
e no mar alteroso, preso ao chão que me rodeia
nascem âncoras em cadeia,
nenúfares onde as libélulas que esvoaçoam não poisaram.
Oeiras e Paço d Arcos, 2017.03.28