* Victor Nogueira (texto e fotos)
“Há inúmeros lugares onde um ser humano se pode perder, mas não há nenhum tão complexo como uma biblioteca. Mesmo um livro solitário é um local capaz de nos fazer errar, capaz de nos fazer perder. Era nisto que eu pensava enquanto me sentava no sótão entre tantos livros.” (Afonso Cruz, Os Livros que devoraram o meu pai: a estranha e mágica história de Vivaldo Bonfim)
Se desumbigara da cama quando a lua se deitava e desmandara-se da fundura, das profundezas da noite. Encomboiara povoandando manhã cedinho, ainda o sol não fumegava, as linhas se abrindo na frente do trem incessantemente fugando do horizonte em ponto infindo mais além, enquanto para trás este parecia serpente ondeando em oscilações, embalando em tricotagem, tricotagem, tricotagem ... Na viagem relativamente longa foi calando o tempo mergulhando folha a folha na tessitura dum livro, por entre ruas empalavradas umas a seguir às outras, quando não parava ao virar duma frase. Então o coração lhe mordia em fogo lento, uma ardência, pois não sabia se no fim encontraria apenas o desamor dela, sofridoramente, A merengava em pensamentos cravoandando pelas núvens brancas, por vezes trançadas de lágrimas, os olhos cetinando o corpo da armada desamada. Sentado no banco divaguava o seu desejo, aguardando o ensejo. Assim voandando ia vogandando nos trilhos sem atilhos, o pensamento vadiando ancorado a ela, entre o lume e o espeto.
As árvores perpassavam rápidas ao olhar e reparava que têm raízes e por isso não voam como as gaivotas; quanto muito sem a leveza das aves podem perdurar séculos ou milénios, estáticas, mais ou menos desencarnadas e desgarrando para o céu, como se fossem sequoias, oliveiras ou imbondeiros.
A encontrou bem em pé no cais, seu somriso, finos trilhos ao canto dos olhos, a voz rendilhada o envolvendo em todos os poros e cavidades ou interstícios, o repuxando para ela. Como rio correndo para a concha do mar. Os gestos represados eram uma torrente virgulada em crisálida e a esperança uma caleidoscópica nave aberta à imensidão dos dias e ao silêncio das noites e ao estralejar dos sentidos, sem muros nem barreiras na cidadela prenhe de desaperturas.
paço de arcos 2014.10.24
se desomemdificou
pois não se desmulherengava
apenas merengava com os olhos
pelas ruas divaguando
e na cama a fama
não se descamava
nem desencravava
carvoando
e assim se perdirruavam
pendirruados
paço de arcos 2014.10.24
com embaraço não dás o braço
o abraço ou o beijo
sem ensejo
e
emrodilhas o desejo
enrodilhado
estilhaçados os brocados
setúbal 2014.10.18
nos teus poemas
em floreado bailado
alado
partilhas as sapatilhas
sem atilhos
atalhas
em atalhos
para toda a gente
e
ninguém
no cais
fenecem os marinheiros
setúbal 2014.10.18
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