René Magritte - La condition humaine (1935)
* Victor Nogueira, em 2014
Foto Victor Nogueira - Lisboa Expo 98 (1998)
de quantas pétalas é tecido o sol
e de quantas escamas o mar?
quais as malhas que entretelam o lençol
e de que notas se veste o luar?
é difícil a rima,
verso branco que arrima
e anima
oco louco
muito ou pouco ?
e a seara cerealífera
na esfera da espera
na concha do sentido
caracol
pelíicula a película (des)folheada
quantos sentidos se encerram ou libertam ?
de quantos caracteres, signos e palavras
se retiram duma só?
sol rissol solidão metanol briol
solário vário
refrigério
quente ou frio
etc & tal
ou assim e assim
afinal
sem pós de perlimpimpim ?
Paço de Arcos 2014.06.29
Almada Negreiros - A sesta (1939)
Perguntas porque estou ausente, sério,
sentado, contigo, na esplanada,
entretecido em malha parada,
como se no ar houvesse mistério.
A chave da caixa está no saltério,
não frente-a-frente mas lado-a-lado
com o gesto bem articulado
buscando em nós suave minério;
flor, roseiral, de juntos na jornada
reconhecernos nossa voz, teus passos,
sem que minha alma ande penáda,
presa no silêncio dos teus laços.
sem o gesto, o verbo, a chamada,
destemido rio sem embaraços.
2014.07.21 setúbal
Albrecht Dürer - Adão e Eva (1504)
Do cimo do forum está, bem vejo,
brilhante, refulgente, o rio,
entretecendo a roca, o fio,
da serra-mãe, em braçada, um beijo.
Tu comigo, dona do meu desejo,
és senhora do meu abecedário,
ária de ópera, um santuário,
delicado cante no azulejo.
E na arrábida é o Portinho
que além, naquela ponta vês,
com santa margarida bem juntinhos
dos deuses, deidades mil, golfinhos,
vogando cavaleiros sem arnês.
no forte do outão, com pão e vinho.
2014.07.21 setúbal
René Magritte - Les amants (1926)
O forte, no cimo daquele monte,
terrorizante é de S. Filpe
com a serra, o sado, em despique
o vale, palmela no horizonte.
O rio azul, da musa é fonte
E eu, circundando este acepipe,
em ti busco vaza, o trunfo, naipe,
para que entre nós o sol desponte.
É de novo Setúbal a teus pés,
a brisa luminando teu sorriso,
minha pena liberta das galés
como se vogando no paraíso
pintando ou esculpindo no crés
com sapiência, preclaro aviso.
2014.07.21 setúbal
Van Gogh - A sesta (1890)
Em teu brando olhar eu me aqueço,
com sons que no horizonte verdecem,
e as linhas dos teu lábios tecem
mil sóis rendilhados que não esqueço.
Ah! o mar e sol em vós, confesso
afastam-nos dos cais que anoitecem;
no monte, flores, águias, entretecem,
esculpindo nosso amor em gesso.
O mundo todo abarco e nada afasto
dos sábios tendo ciência, sabedoria,
certeira, na caminhada com rasto,
Será tal riqueza da alegoria
que nosso sentir não será nefasto.
antes estralejando de alegria.
2014.07.20 setúbal
Boticelli - Adão e Eva
l
recordo o teu sorriso
desejo meu de nele mergulhar
Na madrugada que tu és
retenho sempre
as finas rugas do teu olhar
o teu porte e a tua voz doce
ridente e cristalina
de menina e moça
donairosa
Mas ...
face à tua reserva
guardo em mim as palavras ...
… e os gestos
Quando partes
sufocam-me o deserto
o vazio em mim
este nó na garganta e no peito
as flores esmaecidas
pela tua ausência.
Ah! Não me convidares
numa só palavra
num só gesto
o da tua mão na minha
e
contigo partirmos
na onda
senda de novos portos
e marés.
Este é, sem ti
fraco poema
malabarismo
oco e apagado verbo
verbo sem veia
que sem rima não rema
- desincendeia.
2014.07.19 setúbal
Pablo Picasso - Os dois acrobatas: Arlequim e sua companhia (1901)
quem me quer não quero eu
quem eu quero não me quer
assim no banco, de breu,
fica jogo por fazer
eu sem sumo assumo:
em branco, tu somas, somes,
e eu no mar sem tua rima,
nu cant'o desconto, canto ...
... e o desencanto conto:
a vera fera o ferro ferra
... em fuga seu encanto
de mim, mal conto e erro
muito pouco nada
2014.07.18 setúbal
Edward Hooper - Nighthawks (1942) - pormenor
(es)vai-se a vida num instante
e corrend'a charneca em flor
estala fogo, crepitante,
na campina, com esplendor.
Soará na brisa sufoco
ou aragem refrigerante;
nas minas santa-do-pau-oco
e na cidade contrastante.
Em rendilhado, no andor,
a teia, tece e ateiam
no mar, as ninfas com seu esplendor,
os marinheiros que doideiam.
Letra a letra nasce a pintura
nota a nota vem a pauta
com jogos, baile de cintura,
de eros e com pã a flauta.
Isto não é boa poesia,
pois em papel se esfarela,
como se em neurastenia
se rompesse a farpela!
De nada valem, meras tretas,
em carreirinhas desiguais,
são lantejoulas, mal rimando,
papoilas, pardais, nos trigais.
2014.07.13 setúbal
Auguste Renoir - O almoço no barco (1913)
os dedos em arremedos
um beijo em solfejo
abraços em baraços
nós sem laços
e na rua
a lua nua`
lassa
cruciforme
baça
sem ti
e o destino
um malão de cartão
no porão
e
a
ínsula
onde a pena ou a "pen" da península
istmo com ritmo
o sábio astrolábio ?
2014.06.04 setúbal
Edward Hooper - Summer evening (1947)
MEMÓRIA DESCRITIVA
no jardim
aragem chinesa ou nipónica
em filigrrana rendilhada
um jogo de luzes em chiaroscuro
dicotómico e caleidoscópico
sombria de sombras
na penumbra em contrastaria
rútilo é o i
entre o gradeamento
e a folhagem
a preto e branco
síntese ou ausência da cor
senza cuore il senso
a cinza e a neve
il silenzio
sem refração
na espiral rectilínea
visto o registo
em curvilínea planura
2014.07.03 Setúbal
Roy Lichtenstein - In the car (c. 1963)
aqui o paredão
ali as rochas
o iodo das águas
sem lodo
e
as velas
a dança ritimica
compassada
das ondas
marulhando
ao vento em filigrana
o teu cabelo bailando
ao fundo o bugio
e o teu sorriso planando
finas rugas no teu olhar
o mar
na praia e na rede
o mistério
e
o suave perfume
do corpo apetecido
e do sorriso
riso liberto
quem mora dentro de nós ?
Paço de Arcos 2014.06.10, talvez no 1º encontro
Hendrick Goltzius - A queda do homem (1616)
Pierre-Auguste Renoir - Bal au moulin de la Galette (1876)
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