Allfabetização

Este postal é - creio - uma fotografia retirada dum dos dois filmes que há dias vi sobre as campanhas de alfabetização, as tais em que eu gostaria de ter participado em Agosto último se ... Esta cena do filme era comovente: uma mulher que até aí não sabia comunicar por escrito, conseguir fazê-lo. A procura das sílabas, o gesto hesitante, o voltar atrás para corrigir ou desenhar melhor a letra !!! Deve ser bestial um tipo descobrir que sabe ler, não achas? (1974)

Escrevivendo e Photoandando

No verão de 1996 resolvi não ir de férias. Não tinha companhia nem dinheiro e não me apetecia ir para o Mindelo. "Fechado" em Setúbal, resolvi escrever um livro de viagens a partir dos meus postais ilustrados que reavera, escritos sobretudo para casa em Luanda ou para a mãe do Rui e da Susana. Finda esta tarefa, o tempo ainda disponível levou me a ler as cartas que reavera [à família] ou estavam em computador e rascunhos ou "abandonos" de outras para recolher mais material, quer para o livro de viagens, quer para outros, com diferente temática.

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Depois, qual trabalho de Sísifo ou pena de Prometeu, a tarefa foi-se desenvolvendo, pois havia terras onde estivera e que não figuravam na minha produção epistolar. Vai daí, passei a pente fino as minhas fotografias e vários recorte, folhetos e livros de "viagens", para relembrar e assim escrever novas notas. Deste modo o meu "livro" foi crescendo, página sobre página. Pelas minhas fotografias descobri terras onde estivera e juraria a pés juntos que não, mas doutras apenas o nome figura na minha memória; o nome e nada mais. Disso dou por vezes conta nas linhas seguintes.

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Mas não tendo sido os deuses do Olimpo a impor me este trabalho, é chegada a hora de lhe por termo. Doutras viagens darão conta edições refundidas ou novos livros, se para tal houver tempo e paciência.

VN

domingo, 1 de dezembro de 2019

snoopy - escrever é um trabalho duro


Escrever é um trabalho penoso

Snoopy, personagem dos "Peanuts", criação de Charles Schulz, é o beagle de estimação de Charlie Brown. Apesar de ser um cachorro, datilografa histórias, e até joga no time de beisebol. Entre as identidades que assume em suas obras estão Joe Cool e um aviador combatendo o Barão Vermelho. Woodstock: Um pássaro que é o melhor amigo de Snoopy. (Wikipedia)
Estrumpfes (Schroumpfs), personagens criados por Peyo (PierreCulliford).

Reflexões sobre um amor perdido
Bolas!


  
Livro 1 / Parte I / Capítulo I / Página 1
Que maravilhoso começo!


"Isto é uma loucura", gritou ela
"Mas eu amo-te", disse ele.
Até a máquina odeia os meus contos.



Era uma noite negra, escura e tempestuosa!"


Era uma noite de breu e tempestuosa
O meu novo romance começa mal.


Ai, sim?!
Que simpático ...
Woodstock fez-me uma coberta com todas as palavras rejeitadas dos meus escritos!


E assim terminou a sua vida.
Assim o fiz.
Consumi dois anos a escrever esta biografía.
E  ainda bem que a terminei, pois esqueci-me do que estava escrevendo.





Edite recusou casar com ele por ser muito gordo.
"Porque não fazes uma dieta?", sugeriu-lhe um amigo. "Tens de escolher entre a Edite e um bolo se não podes ter ambos."
Huummm!
É exaltante quando se escreve algo que sabemos ser um achado!


Minha querida.
Perguntaste-me se te amo.
Mas só posso dizer uma coisa.
Yeah.


ESCRITicAS


AS PALAVRAS
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Rede com dois gumes
letras do nosso pensamento
são
os olhos que nós temos
e os seus lábios os nossos lábios (1)
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Está um domingo chuvoso, frio, cinzento! Mas as palavras não chegam a formar-se na consciência, enovelam-se, enevoam-se, liquefazem-se e a máquina [de escrever] imprime apenas nada que talvez seja muito. Ou tudo. (MLF -Évora  1969.02.23)
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Tinha uma carta já escrita, fluente na minha mente. Chegou a hora de escrevê-la e ela ruiu, as palavras escorregaram por entre os dedos, em todas as direcções, e no papel nada fica senão uma pasta informe (...) (NSM - 1969. Évora - Páscoa)

Pronto. Lá arrefeceu tudo ao pegar na caneta para dizer do meu espírito, do que nele se passa. Esvai-se-me por entre os dedos e nas mãos apenas o resto do que não é. (NSM - Évora - 1971.12.01)

 Daqui desta terra - Aqui estou no meu quarto, buscando para ti as palavras que não encontro, corpo sem imaginação mas irritado e desassossegado pela constipação que me percorre as veias e me enche dum nervoso miudinho. Busco para ti as palavras dos outros, nos livros dos outros, os ponteiros aproximando se das nove e trinta, hora da vinda do homem que levará de mim as letras que cadenciadamente vão surgindo no papel branco que já não é só! Busco as palavras e apenas encontro estas, hoje vazio de ti pela tua ausência, ontem pleno pela nossa presença. São vinte e uma e vinte, hora de parar, os livros espalhados pela mesa, o corpo quebrado, a imaginação e a voz quase secas e frias. Daqui desta terra, para ti noutra terra, te abraço e beijo com ternura e amizade, na memória do tempo que fomos juntos. Aqui estou! (MCG - Évora - 1972.09.21.

O discurso lógico trai a manifestação dos sentimentos; "as palavras são (redes) de dois gumes..." e o discurso lógico uma corrente que nos arrasta para onde não queremos. Um olhar, a mão que se levanta para acariciar um rosto, os dedos entrelaçados, o corpo que sentimos junto ao nosso, a simples presença, o saber-se aqui nesta sala ou na outra, não entendes que tudo isto, na sua simplicidade, diz mais e responde e/ou acalma mais interrogações que todas as palavras? É preciso saber ler para além das palavras ou não recusar essa leitura. Lembro me dum poema do Alberto Caeiro, cuja humildade e simplicidade me atraem, humildade e simplicidade perante as pessoas e as coisas que talvez nunca sejam minhas. Levanto me e vou ali á estante buscá lo. Escolho o poema que transcrever. Hesito na escolha. Será este! (2) (MCG - Évora- 1972.07.14)

A "Natureza Morta" (3) não me parece nem pessimista nem optimista; são apenas os olhos com que vejo Évora. (...) Os meus escritos permitem várias leituras, possibilitadas pela ambiguidade decorrente da disposição das palavras e frases, pela colocação da pontuação ou sua ausência. (MCG - Évora  1972.10.20)

No que digo ou escrevo não há senão a constatação despojada do que me parece ser a realidade. (MMA - Paço de Arcos, 1986.08.31

Não era assim que esta carta estava escrita no meu pensamento. Aliás, no meu pensamento esta carta já teve várias formas. Mais fluidas. Variando conforme o estado de alma e o correr do tempo. Mas quando chegou a altura de fixar a fluidez do pensar, o que fica é esta pálida, imperfeita e distorcida imagem, feita de signos que se alinham em carreirinha uns a seguir aos outros. (FPG - 97.06.18).
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O computador é um instrumento precioso e fácil de utilizar para a a criação literária. É fácil emendar, erradicar completamente as palavras e as frases, sem que fiquem notas manuscritas à margem, palavras riscadas, borrões de tinta, deste modo impedindo o testemunho do nascimento e crescimento da obra até à versão final. E mesmo que se guardem várias versões do trabalho, o resultado não é o mesmo da leitura dum manuscrito ou texto dactilografado, cheio de notas e palavras riscadas e/ou encavalitadas. O estudo do processo criativo do operário das letras torna-se assim difícil, quando não completamente impossível. (Setúbal 2007.08.16)

(1) Poema escrito em Évora - 1971.Novembro
(2) .XLV - Um renque de árvores lá longe, lá para a encosta
(3) Poema escrito em 1972.10.17, em Évora, sobre esta cidade

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