* Victor Nogueira
Outrora era muito comum ver nas estradas ou pelas ruas os jericos, mulas ou burros, normalmente puxando carroças que transportavam produtos ou pessoas, por vezes comendo placidamente a palha. Outras vezes transportavam no dorso alcofas ou pessoas, por vezes o nédio abade ou o João Semana, de As Pupilas do Senhor Reitor ou o anafado Sancho Pança, o fiel escudeiro e criado de D. Quixote.
Também estes pachorrentos animais, quando não escouceavam ou teimosamente fincavam os cascos dali não arredando, ajudavam puxando os arados ou movendo as noras para delas se extrair a água, para uso doméstico ou irrigação dos campos..
Eram pois instrumento de trabalho e o meio de transporte da plebe, que a fidalguia andava a cavalo, como D. Quixote, no seu esquálido Rocinante.
Mas presentemente e pelas ruas e pelas estradas raro se encontram equídeos, os jericos sendo uma espécie em vias de extinção, sem que a Humanidade com isso se preocupe, inebriada pelos cavalos mecânicos.
De Alberto Caeiro, Quem me Dera que Eu Fosse o Pó da Estrada
Quem me dera que eu fosse o pó da estrada
E que os pés dos pobres me estivessem pisando…
Quem me dera que eu fosse os rios que correm
E que as lavadeiras estivessem à minha beira…
Quem me dera que eu fosse os choupos à margem do rio
E tivesse só o céu por cima e a água por baixo. . .
Quem me dera que eu fosse o burro do moleiro
E que ele me batesse e me estimasse…
Antes isso que ser o que atravessa a vida
Olhando para trás de si e tendo pena.
De Mário Cesariny, Homenagem a Cesário Verde
Aos pés do burro que olhava para o mar
depois do bolo-rei comeram-se sardinhas
com as sardinhas um pouco de goiabada
e depois do pudim, para um último cigarro
um feijão branco em sangue e rolas cozidas
Pouco depois cada qual procurou
com cada um o poente que convinha.
Chegou a noite e foram todos para casa ler Cesário Verde
que ainda há passeios ainda há poetas cá no país!
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