Allfabetização

Este postal é - creio - uma fotografia retirada dum dos dois filmes que há dias vi sobre as campanhas de alfabetização, as tais em que eu gostaria de ter participado em Agosto último se ... Esta cena do filme era comovente: uma mulher que até aí não sabia comunicar por escrito, conseguir fazê-lo. A procura das sílabas, o gesto hesitante, o voltar atrás para corrigir ou desenhar melhor a letra !!! Deve ser bestial um tipo descobrir que sabe ler, não achas? (1974)

Escrevivendo e Photoandando

No verão de 1996 resolvi não ir de férias. Não tinha companhia nem dinheiro e não me apetecia ir para o Mindelo. "Fechado" em Setúbal, resolvi escrever um livro de viagens a partir dos meus postais ilustrados que reavera, escritos sobretudo para casa em Luanda ou para a mãe do Rui e da Susana. Finda esta tarefa, o tempo ainda disponível levou me a ler as cartas que reavera [à família] ou estavam em computador e rascunhos ou "abandonos" de outras para recolher mais material, quer para o livro de viagens, quer para outros, com diferente temática.

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Depois, qual trabalho de Sísifo ou pena de Prometeu, a tarefa foi-se desenvolvendo, pois havia terras onde estivera e que não figuravam na minha produção epistolar. Vai daí, passei a pente fino as minhas fotografias e vários recorte, folhetos e livros de "viagens", para relembrar e assim escrever novas notas. Deste modo o meu "livro" foi crescendo, página sobre página. Pelas minhas fotografias descobri terras onde estivera e juraria a pés juntos que não, mas doutras apenas o nome figura na minha memória; o nome e nada mais. Disso dou por vezes conta nas linhas seguintes.

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Mas não tendo sido os deuses do Olimpo a impor me este trabalho, é chegada a hora de lhe por termo. Doutras viagens darão conta edições refundidas ou novos livros, se para tal houver tempo e paciência.

VN

terça-feira, 21 de novembro de 2017

imbondeiro e 2 poemas

Foto Jaime Alves - imbondeiro e 2 poemas

Presença Africana de Alda Lara -

E apesar de tudo,
Ainda sou a mesma!
Livre e esguia,
filha eterna de quanta rebeldia
me sagrou.
Mãe-África!

Mãe forte da floresta e do deserto,
ainda sou,
a Irmã-Mulher
de tudo o que em ti vibra
puro e incerto...

A dos coqueiros,
de cabeleiras verdes
e corpos arrojados
sobre o azul...
A do dendém
Nascendo dos braços das palmeiras...

A do sol bom, mordendo
o chão das Ingombotas...
A das acácias rubras,
Salpicando de sangue as avenidas,
longas e floridas...

Sim!, ainda sou a mesma.
A do amor transbordando
pelos carregadores do cais
suados e confusos,
pelos bairros imundos e dormentes
(Rua 11!... Rua 11!...)
pelos meninos

de barriga inchada e olhos fundos...

Sem dores nem alegrias,
de tronco nu
e corpo musculoso,
a raça escreve a prumo,
a força destes dias...

E eu revendo ainda, e sempre, nela,
aquela
Longa história inconsequente...

Minha terra...
Minha, eternamente...

Terra das acácias, dos dongos,
dos cólios baloiçando, mansamente...
Terra!
Ainda sou a mesma.

Ainda sou a que num canto novo
pura e livre,
me levanto,
ao aceno do teu povo!

Benguela,1953 (de Poemas,1966)

http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_africana/angola/alda_lara.html

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de António Jacinto - Carta de um contratado

Eu queria escrever-te uma carta
amor
uma carta que disesse
deste anseio
de te ver
deste receio de te perder
deste mais que bem querer que sinto
deste mal indefinido que me persegue
desta saudade a que vivo todo entregue...
Eu queria escrever-te uma carta
amor
uma carta de confidências íntimas
uma carta de lembranças de ti
de ti
dos teus lábios vermelhos como tacula
dos teus cabelos negros como dilôa
dos teus olhos doces como macongue
dos teus seios duros como maboque
do teu andar de onça
e dos teus carinhos
que maiores não encontrei por aí...

Eu queria escrever-te uma carta
amor
que recordasse nossos dias na capôpa
nossas noites perdidas no capim
que recordasse a sombra que nos caía dos jambos
o luar que se coava das palmeiras sem fim
que recordasse a loucura
da nossa paixão
e a amargura nossa separação...

Eu queria escrever-te uma carta
amor
que a não lesses sem suspirar
que a escondesses de papai Bombo
que a sonegasses a mamãe Kieza
que a relesses sem a frieza
do esquecimento
uma carta que em todo Kilombo
outra a ela não tivesse merecimento...

Eu queria escrever-te uma carta
amor
uma carta que te levasse o vento que passa
uma carta que os cajus e cafeeiros
que as hienas e palancas
que os jacarés e bagres
pudessem entender
para que se o vento a perdesse no caminho
os bichos e plantas
compadecidos de nosso pungente sofrer
de canto em canto
de lamento em lamento
de farfalhar em farfalhar
te levasse puras e quentes
as palavras ardentes
as palavras magoadas da minha carta
que eu queria escrever-te amor...

Eu queria escrever-te uma carta...
Mas ah meu amor, eu não sei compreender
por que é, por que é, por que é, meu bem
que tu não sabes ler
e eu - Oh! Desespero - não sei escrever também!


http://www.jornaldepoesia.jor.br/aj.html
 — comYolanda BotelhoManuela Vieira da SilvaJudite Faquinha e 42 outras pessoas.

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24 comentários
Comentários
Manela Pinto lindoooooooo, obg vitor pelos bons momentos de poesia que me ajudam a ter força para continuar
5 de Junho de 2013 às 16:12
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Manuela Miranda è muito Bom publicar poesia sua e dos outros, mostrar que estamos vivos que ainda há Esperança dentro de nós. A prova disso é esta foto esta Natureza viva cheia de luz e de Força assim como as palavras tem muita Força Obrigada Amigo beijinhos
5 de Junho de 2013 às 16:31
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Maria Jorgete Teixeira Gosto especialmente da gravura, dos poemas, porque África é minha terra mãe! Obrigada, Victor Nogueira!
5 de Junho de 2013 às 16:34
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Manuela Vieira da Silva Belíssimos poemas, adorei ler os dois. Obrigada pela partilha. Quanto à imagem... contemplo, no cimo da árvore me sentei, em posição de lótus, os olhos fechei e logo abraçada fiquei e no calor levada para lá do horizonte onde a vida é a fonte. *_* 
5 de Junho de 2013 às 17:57
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Cremilde Barreiros Aqui perto, numa pequena cidade da Suécia encontrei em Português "A Sagrada Esperanca " de Agostinho Neto!
5 de Junho de 2013 às 18:03
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Lia Branco Que maravilha. Beijinhos, camarada e amigo
5 de Junho de 2013 às 18:06
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Manuela Vieira da Silva Vou às vezes ao vazio;
volto do vazio cheio.
Quando me acerco do Nada,

redescubro o necessário.
Na sensação derramada,
sou sempre um pouco usurário.
Mas do meio do meu frio
nasce um calor, me incendeio.

Berthold Brecht

5 de Junho de 2013 às 18:26
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António Barrenho Belos poemas !! Obrigado Victor 
5 de Junho de 2013 às 18:50
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Idalina S. Dias · Amigo/a de Vânia Cairo
Lindooooooooo, amiguinha  Uma linda tarde! bjs  *

5 de Junho de 2013 às 18:54
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Belaminda Silva Maravilhosos poemas e imagem, que me levam a recordar tantas coisas... fiquei emocionada ao ler estes poemas. Não gostei... Amei!!! Obrigada camarada e amigo! Tem um restinho de tarde muito feliz. Beijinhos 
5 de Junho de 2013 às 19:22
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Vânia Cairo Adorei os poemas e a foto, querido.Gratíssima.Bjo
5 de Junho de 2013 às 20:38
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Maria Lisete Almeida Grata pela partilha destes linsoa Poemas Amigo Victor! Abraç
5 de Junho de 2013 às 21:53
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Vitor Correia Obrigado por partilhares comigo tanta beleza,amigo Vitor.Um abraço
5 de Junho de 2013 às 22:02
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Deolinda Figueiredo Mesquita Victor, poemas muito bonitos, obrigada.
5 de Junho de 2013 às 22:49
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Judite Faquinha Victor, que poemas mais lindos,( MÃE PRETA NÃO SABES NADA ... á uma cañção cantada pelo Paulo de Carvalho, com este titulo
6 de Junho de 2013 às 16:36
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Judite Faquinha Victor, desculpa mas o meu pc está doido... também adorei esta foto, obrigada amigo, por tudo isto que nos encanta, e pela partilha beijocas.
6 de Junho de 2013 às 16:40
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Arminda Griff Lindo! Adoro a tua companhia 
7 de Junho de 2013 às 2:50
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Alice Coelho  
8 de Junho de 2013 às 4:22
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Isabel Reis O sol desperta o mundo e a luz percorre todos os lugares, o amor também assim é. Nasce todos os dias e se renova dentro de nós.
9 de Junho de 2013 às 15:15
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Isabel Dias Alçada Lindo adoro as suas partilhas, 
12 de Junho de 2013 às 17:58
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Margarida Piloto Garcia Obrigada pelos poemas. Gosto imenso de Alda Lara.
12 de Junho de 2013 às 18:34
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Luisa Neves EXCELENTE.  Ver Tradução
12 de Junho de 2013 às 22:25
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Maria Rodrigues 
13 de Junho de 2013 às 10:13
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Gerir
15 de Junho de 2013 às 18:23
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