sexta-feira, 31 de agosto de 2007
De:
1965- Setembro/Outubro - O fim das Férias e o início do Liceu
Isto tocou a uma grande parte de nós. Este ano as férias grandes foram ligeiramente mais curtas. Tive que fazer três exames: o da 4ª classe e os de admissão, à Escola Técnica e ao Liceu.
.Como estudava no C. D.Maria II, foi na Escola 7, ali bem perto da Igreja do Carmo, em que havia um acesso pela Vasco da Gama, e outro pela Luís de Camões. Tudo correra optimamente, e, ao contrário do ano passado, em que fiquei empatado com a Fernanda Bizarro, foi a minha prova a melhor do exame dos jindengue lá do Colégio. Mas isso sempre me fora indiferente, e também, ao contrário do ano passado, tive que ir à oral – penso que era obrigatório.
.E… falando de orais, lembro-me que a Português me foi sorteado sempre o mesmo texto nos três exames “O Frade e o Salteador”- na Escola 7, na Emídio Navarro e no Salvador (acho que a pág. já estava viciada para abrir sempre ali, no mesmo texto) - de um livrinho que a minha mãe sempre guardou religiosamente, e que, embora um pouco gasto, eu ainda conservo aqui por casa.
.Outra coisa que me ficou presente na memória. O prof. que me fez exames no Liceu Salvador e era bem conhecido de montes de gente – o Dr. Loureiro que veio a abrir o S.M. Goretti – que, embora sempre muito simpático, desinibindo e dando um empurrãozinho a quem necessitava, durante a prova escrita de Português não se fartou de assobiar umas modinhas, desde o início até ao fim.
.E aí estava eu aprovado e com três opções a meu bel-prazer. Escolhi o liceu, e, naquele tempo as aulas começavam só a 1 de Outubro.
.Mas ali bem perto, no Bairro das Ingombotas, onde morava, os colegas mais velhos do que eu já me iam informando o que ia acontecer-me. “Sabes, lá no liceu ninguém se chama pelo nome! Todos têm um número atribuído, e uns se chamam aos outros pelo número!” Outro: “Eh pá, vais apanhar uma carecada do caraças! Faz mas é tudo o que dizem pra fazeres, senão… tás lixado, ainda te fazem umas picadas pela cabeça toda!”.
. Com estes avisos todos, no dia 1 de Outubro atravessei a D. Antónia Saldanha, primeiro na parte alcatroada, e depois pela parte de terra batida, a seguir à Fernão de Magalhães, lá desemboquei na Rampa do Liceu, bem ao meio. Logo dali vi o grande movimento à entrada do Liceu e pela Rampa jardinada, com uma maior concentração à entrada e no espaço interior, pelas escadas acima. Subi a íngreme Rampa e o filme que me fôra contado pelos mais velhos tornava-se agora mais real, podendo ouvir-se um movimento de “algazarra” no amontoamento de estudantes, quase todos rapazes, do lado exterior.
.Era a caça ao caloiro. “Ó miúdo és do 1º ano?!..” E lá me mandaram colocar a jeito, baixando a cabeça, enquanto um bramia a tesoura de contentamento, dando-lhe aqueles movimentos entusiasmados que produziam o som metálico de abrir e fechar repentina e constantemente a tesoura, outro ensaiava a técnica da circunferência perfeita, colocando um angolar na coroa da minha cabeça, desenhando uma circunferência com a esferográfica no couro cabeludo. E euuu...
Depois era só cortar o cabelo que constituía o círculo até fazer uma careca, tão ou mais perfeita que a de um seminarista. Hagh! O executante, após a feitura da coroa, pegava na sua Bic e rubricava a obra de arte, apondo um carimbo à moda de um punho assente de cima pra baixo na mesma.
. “Caloiro… Baixa a Careca!! E lá baixava eu a tola! E eles, que andavam em grupo, lá malhavam com os dedos todos unidos neste maçarico.
.A obediência e a simpatia que cada caloiro demonstrasse era meio caminho andado para que tudo corresse normalmente, porque quem espigasse tava tramado. Apanhava forte e feio, com a palma da mão, com pequenos sacos com sal grosso, ou com as colheres de pau, algumas lindamente decoradas a cores, para que o caloiro medisse e reflectisse, antes que se armasse em corajoso protestante! Mas o melhor mesmo, por segurança, era arranjarmos um padrinho, um mais velho de preferência conhecido, daqueles considerados, ou com algum status, e não importava o tipo de status entre os mais velhos, tinha era que ter peso. “ Hê malta!!.. Este é meu conhecido, meu afilhado!” Aí rolava tudo bem melhor e o malhanço numa careca era não mais que um cumprimento.
Gente do meu tempo… um doidão chamado Álvaro, um Albano, o Zé Peneda, o Valdemar Parreira, o Rui Monteiro, o Paquito e o Dente (vulgo Alex do chá das seis), e muitos outros que por aqui andarão, todos da turma G 65/66.
.Um abraço a todos.
Manel S.
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NOTA -
1 comentário:
Deixa-nos uma sensação de regresso ao tempo inconsequente em que tudo era de alegria, quando as pequenas tragédias passavam, como fumo!...
Maria Mamede