* Victor Nogueira
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   QUADRAS SOLTAS EM DESALINHO
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        Em ti com meu sentido
Começo a escrever
Como fora perdido
Razão do meu viver,
   ,
        A brincar ou a sério
Lá vou eu versejando
Será mau despautério
Na vida ir cantando?
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        Uns fumam, outros bebem,
Outros com putas vão,
Mas mérito não tem
Estar em perdição.
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        Bem custoso é ser sozinho,
Ser deserto sem obra,
Sem dar ou vir carinho,
Picado por má cobra.
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        D. Roberto é alegre,
Bem faz rir a chorar;
Não há quem soletre
Porquê o seu pesar!
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        De longe, aos meus amigos
Escrevo ou telefono,
Haja ou não rodrigos,
Ou ligo gramofono,
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        Bem olha sem que veja
Onde param teus lábios;
Não há quem os meus beija
Com ua flor, bem sábios.
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        É triste rodopio
Estar de mãos vazias,
Sem bom canto nem pio
Preso a nostalgias.
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        É tudo brincadeira
P'ro meu mal apartar;
Matar alguma asneira
P'ra no mundo ficar.
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        P’ra quê esta tenção
De sozinho errar?
É bem ou maldição
Assim continuar?
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        Terá algum sentido
O que mal faço ou digo?
P'ra quê andar perdido
Ouvindo: “Não, contigo”?
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         Há emparelhamento
 Que valha a maldição
 De viver em tormento
 Em grande assombração?
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         Passo por minha tela
 Os meus grandes amores
 Não há sebo nem vela
 Que deem novas cores! 
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        Também, quem tal diria
No tempo dos quanta,
De tal bem me riria
Com tão bela estampa.
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         Venha Deus, o Diabo
 Encontrar solução
 P'ra isto, que diacho
 Ensinar-me a lição.
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         É bom pegar no carro?
 Ou ir fotografar?
 Onde lançar o sarro,
 Sem a pena agravar?
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         Depressa ou devagar
 Vai o tempo escorrendo,
 En pé, a escrevinhar,
 A noite aparecendo.
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         Amanhã, novo dia!
 Quantos mais seguirão?
 São bem como a enguia
 Não se agarram, não.
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         Pois agora são cinco
 As quadras ‘inda em falta
 A mioleira trinco
 Para pôr fim à pauta.
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         Agora só são quatro
 Isto é, quinze versos..
 Bem digo: "Vade retro!"
 Que finais tão travessos.
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         Três, a conta Deus fez,
 Sou quase a terminar,
 Serei eu tão má rez,
 Que não possa acabar?
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         Vejam lá, isto vai!
 Terá algua leitura?
 Parece que não cai
 A boa, má feitura!
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         Houve engano na contagem
 Doze seria ao lado;
 Assim fica esta ponta
 Como estou, chalado!
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  1989.09.03
  
SETUBAL