Allfabetização

Este postal é - creio - uma fotografia retirada dum dos dois filmes que há dias vi sobre as campanhas de alfabetização, as tais em que eu gostaria de ter participado em Agosto último se ... Esta cena do filme era comovente: uma mulher que até aí não sabia comunicar por escrito, conseguir fazê-lo. A procura das sílabas, o gesto hesitante, o voltar atrás para corrigir ou desenhar melhor a letra !!! Deve ser bestial um tipo descobrir que sabe ler, não achas? (1974)

Escrevivendo e Photoandando

No verão de 1996 resolvi não ir de férias. Não tinha companhia nem dinheiro e não me apetecia ir para o Mindelo. "Fechado" em Setúbal, resolvi escrever um livro de viagens a partir dos meus postais ilustrados que reavera, escritos sobretudo para casa em Luanda ou para a mãe do Rui e da Susana. Finda esta tarefa, o tempo ainda disponível levou me a ler as cartas que reavera [à família] ou estavam em computador e rascunhos ou "abandonos" de outras para recolher mais material, quer para o livro de viagens, quer para outros, com diferente temática.

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Depois, qual trabalho de Sísifo ou pena de Prometeu, a tarefa foi-se desenvolvendo, pois havia terras onde estivera e que não figuravam na minha produção epistolar. Vai daí, passei a pente fino as minhas fotografias e vários recorte, folhetos e livros de "viagens", para relembrar e assim escrever novas notas. Deste modo o meu "livro" foi crescendo, página sobre página. Pelas minhas fotografias descobri terras onde estivera e juraria a pés juntos que não, mas doutras apenas o nome figura na minha memória; o nome e nada mais. Disso dou por vezes conta nas linhas seguintes.

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Mas não tendo sido os deuses do Olimpo a impor me este trabalho, é chegada a hora de lhe por termo. Doutras viagens darão conta edições refundidas ou novos livros, se para tal houver tempo e paciência.

VN

domingo, 26 de fevereiro de 2023

José Luís (1951 / 1987) - Memória(s) a 26 de Fevereiro

 * Victor Nogueira


2023 02 26 José Luís (Luanda 1951 05 29 _ Paço de Arcos 1987 02 26)

Maria Amélia Marques Martins
Para mim é uma das mortes mais sofridas...a dor da alma que leva a essa atitude, tem que ser muito grande. O meu Abraço!
6 h
João Carrapiço
RIP
 h
Elias Quadros
Que a Luz eterna o alumie!
4 h
Armanda Gonçalves
Lembro bem esse dia muito triste
4 h
Isabel Magalhães
Descansa em paz Zé Luís e com muita luz.✨🙏


2022 02 26 / 2014 02 26  Foto MENS - Zé Luís no Rio Cuanza, em 1969. Em 1987, numa tarde deste mesmo dia 26 de fevereiro, em Paço de Arcos, faleceu o meu irmão caçula, nascido em Luanda (1951)
Elias Quadros
Que Deus o tenha!
52 sem
Armanda Gonçalves
Abraço forte recordo com carinho especial o teu irmão
52 sem

Maria Lúcia Borrões
Tão jovem ainda... Era precisamente da minha idade e partiu 3 dias depois de Zeca Afonso. Lamento 💔
5 ano(s)
Filomena Ramos
.. não sabia, Victor.
Beijinho pa ti 😘
5 ano(s)
Victor Barroso Nogueira
Já passaram muitos anos, Filomena Ramos
5 ano(s)

João Carreira
... fiz esta travessia do Cuanza , na barcaça , a caminho de Cabo Ledo e também em 1968 /69 ...
7 ano(s)
Elsa Santos
Triste mas lindo.
7 ano(s)




2021 02 26 e 2018 02 26 Os 3 "manos" - Luanda - Rua Frederico Welwitsch - 1951

Naquele tempo, ao fim do dia, ia muitas vezes ao cinema. Naquele dia 26, à noite, em 1987, ao regressar a casa, o telefone tocou. Era o Jacinto, guarda da noite no Edifício Sado, onde eu trabalhava, no Planeamento Urbanístico.

"Onde é que se meteu, doutor, que andamos à sua procura há horas? Tenho uma notícia para lhe dar. Sente-se. O seu irmão morreu!” E foi assim, de chofre, que soube que o meu irmão se suicidara. Numa das outras vezes telefonara-me para a Câmara, para se despedir de mim. Disse-lhe que esperasse por mim, que não era pelo telefone que nos despedíamos para sempre, que iria ter com ele para lhe dar um último abraço. 

Meti-me no carro rumo a Paço de Arcos e dessa vez consegui chegar a tempo, adiar, sem ilusões, aquilo que para ele seria uma determinação e tentara  já por diversas vezes!

O MPLA tê-lo-ia convidado para ficar, teria querido ficar em Angola, a nossa terra, mas quando após a independência, em 1976, o MPLA mobilizara todos os angolanos face à guerra civil que se avizinhava, veio para Portugal, dizendo-me que lhe bastara o horror duma guerra, a que vivera, na frente de combate e com as vítimas do exército colonial, onde havia sido incorporado como enfermeiro. Morreu sem terminar o curso de Medicina.


2020 02 26 e 2015 02 26 Foto de família - O Zé Luís (1951 - 1987) em Lisboa, com a bicicleta


2019 02 26 (Zé Luís - Luanda, 1951 – Paço de Arcos 1987)
Naquele tempo, ao fim do dia, ia muitas vezes ao cinema. Naquele dia 26, à noite, em 1987, ao regressar a casa, o telefone tocou. Era o Jacinto, guarda da noite no Edifício Sado, onde eu trabalhava, no Planeamento Urbanístico.

"Onde é que se meteu, doutor, que andamos à sua procura há horas? Tenho uma notícia para lhe dar. Sente-se. O seu irmão morreu!” E foi assim, de chofre, que soube que o meu irmão se suicidara. Numa das outras vezes telefonara-me para a Câmara, para se despedir de mim. Disse-lhe que esperasse por mim, que não era pelo telefone que nos despedíamos para sempre, que iria ter com ele para lhe dar um último abraço.

Meti-me no carro rumo a Paço de Arcos e dessa vez consegui chegar a tempo, adiar, sem ilusões, aquilo que para ele seria uma determinação e tentara já por diversas vezes!

O MPLA tê-lo-ia convidado para ficar, teria querido ficar em Angola, a nossa terra, mas quando após a independência, em 1976, o MPLA mobilizara todos os angolanos face à guerra civil que se avizinhava, veio para Portugal, dizendo-me que lhe bastara o horror duma guerra, a que vivera, na frente de combate e com as vítimas do exército colonial, onde havia sido incorporado como enfermeiro. Morreu sem terminar o curso de Medicina.

Ricardo Jorge Mateus Pina abraço. bela e corajosa homenagem. 4 ano(s) Graça Maria Teixeira Pinto Horas tristes ! 4 ano(s) Isabel Magalhães 🌹❤🌹 4 ano(s) Maria Jorgete Teixeira São cheios de tristeza e saudade estes teus belos versos que eu já conhecia. Um abraço para ti! ❤ 4 ano(s) Milu Vizinho Querido amigo, comuvi-me ao ler este, estes versos, são cheios de tristeza e saudade, estes teus lindos versos, que eu já conhecia. Um forte abraço

2017 02 26 Foto de família  em Luanda - 1951 - Victor, Emília, Zé Luís (Luanda 1951.05.29 / Paço de Arcos 1987.02.26), Manuel -

IN MEMORIAM do meu irmão Zé Luís, Em 1987, a 26, ao fim do dia resolvi ir ao cinema e depois de chegar a casa à noite, o telefone tocou. Era o Jacinto, o guarda do edifício da Câmara onde eu trabalhava, no Planeamento Urbanístico, : "Doutor, Temos andado à sua procura. Sente-se, tenho uma notícia para lhe dar: O seu irmão morreu." Desta vez a tentativa de suicídio não falhara.. Vítima do stress da guerra os psiquiatras haviam dito que apenas eu o poderia salvar e não os pais, mas o meu poder era limitado. 


Litogravura de José Luís NS

elegia

 1. - À mana que nunca tive e gostaria de ter tido.

À minha outra mana inventada, de Moçambique e da Casa de Aguiar e Belmonte, sempre ocupada com o trabalho, mas sempre atenciosa e carinhosa e de quem gosto muito, muito, mesmo muito, que me pergunta sempre pelos sobrinhos e que aprecia imenso o meu filho Rui Pedro e cujos filhos me atendem sempre com simpatia ao telefone.

Ao meu único irmão, de verdade, Zé Luís, morto de morte matada por ele próprio e por muitos outros no tempo que para ele terminou

naquela tarde de 26 de Fevereiro de 1987 ............................. ).

 2. - Ao meu irmão que adorava o mano, a cunhada e os sobrinhos.

 Ao meu irmão, que não morreu na Guerra Colonial, apesar de ter estado em zonas de combate como furriel miliciano enfermeiro, na nossa terra, Angola, incorporado obrigatoriamente e a lutar no Exército Português de ocupação contra os manos dele e meus, do MPLA ou não, e a tentar salvar a vida aos «camaradas» de armas ou vê-los regressar mortos, ensanguentados e desfeitos. Mas morreu depois, 13 anos depois, encerrado em si mesmo, sem concluir o curso de Medicina, por causa da guerra que o marcou para sempre. E que não continuou em Angola, apesar dos convites do MPLA, porque, após a independência do nosso País, de novo incorporado obrigatoriamente como cidadão angolano, veio para um país estrangeiro porque já lhe bastara o horror duma guerra. (1).

 ((1) - O nome dele, como o de muitos outros que morreram depois de terminada a guerra mas por causa dela, não figura em nenhum monumento aos mortos em combate ! É um dos soldados desconhecidos, morto em vida, na terra de ninguém ! 

 3. - À minha mãe, que ao chegar a casa encontrou o filho morto de morte matada por ele próprio, que resistiu e não enlouqueceu mas entristeceu com uma tristeza funda e sem fim, ficando para sempre marcada.

 4. - Não sei se foi após a morte do meu irmão que assumi definitivamente que o nascimento marca o início da caminhada para a morte, que a morte de quem quer que seja, incluindo a minha, é um dado adquirido e inelutável. Embora face à constante preocupação da minha mãe se eu me atrasava lhe dissesse, meio a sério, meio a brincar: "Mãe, eu sou imortal, não te  preocupes quando me atraso !".

 ECCE HOMO

 Era o dia 26 de Fevereiro

O Pituca morreu!

Encerrado em si

hirto no seu pijama azul

as mãos bonitas e o rosto frio

um vergão em torno do pescoço

o rosto violáceo

o ar sereno.

.

Longe vai o tempo da minha alegria

das nossas brigas

da nossa amizade

.......................silenciosa

.......................tímida

.......................desajeitada.

Fica-me no pensamento

a lembrança de ti

nas coisas que me deste

.......................os livros os posters

.......................os bibelots as estatuetas

.......................africanas as tuas pinturas

.......................a Marilyn e o Pato Donald

.......................os discos e as cassetes.

Memória da infância perdida

nas palavras silenciadas

Meu irmão!.

1987.Dezembro.22 (1989.Março.10) - Setúbal

.É TEMPO DE CHORAR

.É tempo de chorar

silenciosamente

os nossos mortos

.

irmãos encerrados

encurralados

.

É tempo de chorar

enquanto

para lá desta hora

a vida se renova

por entre

.............os bosques e

.............os regatos

...................................sussurantes

...................................do imaginar o son (h) o estilhaçado

É tempo de chorar o tempo que voa!

.

...................................(IN MEMORIAM do meu irmão Zé Luis, morto de morte matada

...................................por ele próprio e por muitos outros no tempo

...................................que para ele terminou naquela tarde de

......................................................................26 de Fevereiro de 1987 ............................. )

..

 1989.Fevereiro.03 - Setúbal

 

Luisa Neves Triste. ABRAÇO. Maria Célia Correia Coelho Dolorosas recordações, algumas, outras bonitas e ternas .Um abraço Victor . 9 ano(s) Belaminda Silva Triste. Beijinho 9 ano(s) Ana Maria Madail Tristes recordações.. Um abraço amigo. 9 ano(s) Laura Rijo Recordações...abraço. 9 ano(s) Graça Maria Teixeira Pinto A guerra, continua a fazer vitimas.Silenciosamente, mas faz, não tenhas dúvidas.Chamam-lhe stress de guerra...Bj, Victor Nogueira! 9 ano(s) Arminda Griff Só amanhã poderei colocar tua leitura em dia! Beijocas muitas. 9 ano(s) Maria João De Sousa Sei que partilhaste comigo esta excelente elegia... mas não a encontrei no mural... acho que a ligação está bem pior do que eu... obrigada, Victor Nogueira! Muito boa publicação! 9 ano(s) Maria Mamede Obrigada por partilhares Amigo, esta tua elegia, bela e triste. Bj. 9 ano(s) Elsa Cardoso Vicente

Obrigada pela partilha, tocou-me profundamente, recuei, revivi emoções, vidas, mortes, as próprias fotos...Praia do Bispo, e por outras paragens, felizmente corri angola toda com os meus pais... Luanda onde vivia, nasci no lobito...por estas recordações todas, obrigada e abraço...

9 ano(s)

Clara Roque Esteves

Meu amigo, a tua avaliação estava correcta. O dia do nosso nascimento é o primeiro dia do caminho para a nossa morte. E, sabendo-a inevitável, como é difícil lidar com ela...Também perdi os meus pais. Nem quero imaginar-me a perder o meu irmão. A tristeza da tua escrita de hoje deixa-me algum amargo de boca, Bela mas muito cheia de saudade. E aí estás tu, eterno, ECCE HOMO, tentando trocar as voltas à vida e ao tempo. Comovi-me com os poemas, até me comovi com a irmã imaginada. Para ti, Vítor Victor Nogueira, um grande abraço de admiração pelo ser humano que és. Beijinhos gratos pela partilha.

9 ano(s)Editado Maria Jorgete Teixeira Memórias tão dolorosas que parecem furar os olhos...corajosamente partilhadas... beijinhos, Victor! 9 ano(s) Isabel Maria Abraço Victor. 9 ano(s) Maria Natália Bravo Só me ocorre partilhar contigo, um bocadinho da ternura que me liga ao meu mano. Um beijo, Vitor. 9 ano(s)

https://www.facebook.com/notes/10219934009005978/


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