Allfabetização

Este postal é - creio - uma fotografia retirada dum dos dois filmes que há dias vi sobre as campanhas de alfabetização, as tais em que eu gostaria de ter participado em Agosto último se ... Esta cena do filme era comovente: uma mulher que até aí não sabia comunicar por escrito, conseguir fazê-lo. A procura das sílabas, o gesto hesitante, o voltar atrás para corrigir ou desenhar melhor a letra !!! Deve ser bestial um tipo descobrir que sabe ler, não achas? (1974)

Escrevivendo e Photoandando

No verão de 1996 resolvi não ir de férias. Não tinha companhia nem dinheiro e não me apetecia ir para o Mindelo. "Fechado" em Setúbal, resolvi escrever um livro de viagens a partir dos meus postais ilustrados que reavera, escritos sobretudo para casa em Luanda ou para a mãe do Rui e da Susana. Finda esta tarefa, o tempo ainda disponível levou me a ler as cartas que reavera [à família] ou estavam em computador e rascunhos ou "abandonos" de outras para recolher mais material, quer para o livro de viagens, quer para outros, com diferente temática.

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Depois, qual trabalho de Sísifo ou pena de Prometeu, a tarefa foi-se desenvolvendo, pois havia terras onde estivera e que não figuravam na minha produção epistolar. Vai daí, passei a pente fino as minhas fotografias e vários recorte, folhetos e livros de "viagens", para relembrar e assim escrever novas notas. Deste modo o meu "livro" foi crescendo, página sobre página. Pelas minhas fotografias descobri terras onde estivera e juraria a pés juntos que não, mas doutras apenas o nome figura na minha memória; o nome e nada mais. Disso dou por vezes conta nas linhas seguintes.

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Mas não tendo sido os deuses do Olimpo a impor me este trabalho, é chegada a hora de lhe por termo. Doutras viagens darão conta edições refundidas ou novos livros, se para tal houver tempo e paciência.

VN

domingo, 17 de março de 2013

Photoandando pelo Porto, cidade granítica

de Victor Nogueira (Notas) em Domingo, 17 de Março de 2013 às 23:  36

A 1ª vez que estive no Porto, ,em 1949, com a minha mãe, tinha 3 anos e ficámos a morar em casa do meu avô Luís, na Travessa da Carvalhosa. Guardei algumas memórias, não da cidade mas da vida em família. E dum espectáculo a que assistimos ficou a minha foto numa revista, espectáculo esse com a Amália Rodrigues e o Estevão Amarante. Ia com o meu avô Luís muitas vezes para o café. e ao cinema e lembro-me dum filme que vimos, do Walt Disney, Steamboat Willie, com Mickey Mouse. que podem ver aqui - http://www.youtube.com/watch?v=8nfEIHcsR8c
 
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Voltei em 1962/1964, para frequentar o 5º ano do Liceu, sucessivamente no Grande Colégio Universal, na Rua da Boavista, e o Almeida Garrett, perto da rua de Cedofeita.  São desse tempo as notas respigadas do Diário que na altura escrevia, desde 1958. Embora gostasse das pessoas do Porto, do calor humano que sentia nas ruas, a cidade para mim era triste, feia, escura  e suja e com aquilo que eu chamava muita “parolice”. Uma parte do tempo morei em casa do meu avô Barroso, na Rua dos Bragas, e outra em casa do meu avô Luís, na Rua de Santos Pousada e também em Rio Tinto. Aliás o meu avô Luís, alentejano, dizia que o Porto era uma aldeia grande, falando também do tempo em que a viagem desde Lisboa levava 5 dias e as pessoas precavidamente fazerem testamento antes de se meterem à jornada na mala-posta.
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Quando íamos pela rua de Cedofeita muitas vezes o meu avô Barroso dizia-me a propósito  do vernaculismo tripeiro: "Tu não ouças, Victor, tu não ouças que as pessoas falam muito mal." E à 2ª feira sabia-se qual o resultado do "glorioso" na véspera - se as pessoas fossem caladas e tristes nos eléctricos, o FC Porto havia perdido, caso contrário iam mais alegres. Por essa altura a Câmara do Porto fez uma campanha para que os munícipes mantivessem a cidade limpa e ou no Comércio do Porto (lido pelo meu avô Barroso) ou no 1º de Janeiro (lido pelo meu avô Luís) publicavam-se umas notas diariamente. Numa delas o jornalista dizia que interpelara uma moradora que varria o lixo para a rua, se não sabia da campanha para uma cidade limpa, ao que esta lhe retorquira "Então que queria que eu fizesse ao lixo, que o guardasse em casa? Eu cá sou muito asseada !" fechando-lhe a porta na cara. Nada como no Alentejo, onde  nas aldeias as pessoas varrem e lavam os passeios e as ruas defronte das casas.
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Voltei em 1966, para frequentar a Faculdade de Economia do Porto, mas ao fim de poucos dias pedi  a transferência para o ISCEF (Económicas), em Lisboa; para esta minha decisão deve ter contribuído o facto do Porto ser para mim uma cidade triste e sem sol, mas também a linguagem vernácula dos meus colegas à mesa do café, demasiado incomodativa para quem na altura era tão “bem educado” que nem “merda” dizia, quanto mais os palavrões que naturalmente entremeavam a conversa deles. Nesta altura o meu avô Barroso continuava a morar na Rua dos Bragas onde viria a morrer em 1976, e o meu avô Luís na Rua Fernandes Tomás, perto do Padrão e de S. Lázaro.
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1962/63
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No dia 19 de Dezembro de 1962 houve   um tremor de terra, que atingiu maior intensidade em Lisboa. (Diário III - pag. 137)
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Por cá tudo bem. Tem feito algum frio e há uns dias que não conseguia pegar na caneta para escrever. No dia de Natal fomos a Goios. Gostei do passeio. Ontem o tio [Zé Barroso] foi a Vila Nova de Gaia, a Matosinhos e à Foz do Douro e eu fui com ele.
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Anteontem houve um tremor de terra, mas aqui no Porto parece que só se abriram brechas num prédio. Em Lisboa é que o sismo teve maior intensidade, tendo abatido alguns telhados e rachado as paredes de muitos prédios. (...) Já estou a gostar um bocado mais do Porto. Contudo não modifiquei a minha opinião: é uma cidade triste e velha. (NSF - 1962.12.21)
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VI NEVAR PELA 1ª VEZ QUANDO IA PARA CASA DO AVÔ LUÍS, E À TARDE, QUANDO FOMOS AO CAFÉ ASTÓRIA. (1963.01.13 - DIÁRIO III)
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Como tem chovido a cântaros, limitámo-nos a ir comer qualquer coisa ao café Águia, o café dos estudantes. Foi o que deduzi das inúmeras placas académicas que ornam as paredes. (1963.01.06 - Diário III)
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 As pessoas aqui no Porto, tanto homens como mulheres, falam um português vernáculo que nem fazeis ideia. Aí [em Luanda] quem fala assim são os carroceiros.
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(...) Aí em Luanda (que é uma aldeola na opinião de muito parolinho) respeita se a ordem de chegada. Aqui não.
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NOS ELÉCTRICOS É A MESMA COISA. É UM VALE TUDO. E NÃO SÃO CAPAZES DE OFERECER O LUGAR A UMA SENHORA OU A UMA PESSOA IDOSA.
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 VAI SE A UM CAFÉ À NOITE, ESTÁ TUDO CHEIO DE ESTUDANTES (RAPARIGAS) A FUMAREM ATÉ ALTAS HORAS. QUANDO É SÓ ISSO! (...)
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 Tirando a parte central (com os seus anúncios luminosos, o Porto, quase se pode dizer, é a cidade das trevas O mesmo não se pode dizer de Luanda, que embora não seja uma cidade luz, sempre é melhor neste ponto (NSF - 1963.01.28).
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Vi cair granizo  pela 1ª vez. Tem estado muito frio. (1963.02.06 - Diário III))
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Andei pela primeira vez de trolley   no dia 10/03 [1963] quando fui a casa do avô Luís. (...) É um bom meio de transporte, nada ruidoso, o que não sucede com os eléctricos. (Diário III - pag. 157)
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No dia 24.03 [1963] fui com o avô Luís e a Arminda [sobrinha da D. Alexandrina] ver o barco liberiano que encalhou na Foz do Douro.  Nunca apanhei maior aperto, que me lembre. Os eléctricos iam cheios e em todas as paragens cabia mais um passageiro! (Diário III - pag. 156)
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No dia 3 [02.1963] fui com o avô Barroso ao Palácio de Cristal. Gostei bastante do jardim e das belas vistas para o rio [Douro], com bastante arvoredo. Vimos o leão e diversos animais. (Diário III - pag. 162)
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Em 23 [02.1963] fomos ao Palácio de Cristal ver o circo no Pavilhão dos Desportos. Gostei de alguns números, mas outros não valiam um real.
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Sempre apreciei os espectáculos de circo    e quando era mais miúdo desejava ser proprietário de um, para poder correr mundo, pois seduzia-me a vida ao ar livre. Em Luanda é raro haver espectáculos destes.  Mas sempre que os havia, lá estava eu. Mesmo agora não desprezaria fazer uma digressão com uma dessas companhias. O circo atrai todos, jovens e velhos. (Diário III - pag. 151)
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Desde que estou no Porto tenho visitado diversas igrejas, como a da Trindade, por sinal muito bonita, a   Sé, muito escura e fria por dentro, a da Lapa, a do Carmo. Todas têm obras em talha dourada. Hoje, 22 Maio [1963] visitei a Igreja dos Clérigos, assim como a Torre. Subi os 225 degraus até ao cimo, equivalentes a 6 pisos. De lá [do cimo] abrangem-se belas vistas do Porto. Fazia muito frio e as escadas estavam muito escuras. (1963.05.22 - Diário III)
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Uns dias antes [de visitar o Museu Etnográfico no Largo de S. João Novo] tinha ido a Gaia, atravessando a Ponte D. Luís, a pé. A meio desta havia um ligeiro vibrar. Voltei para o Porto de trolley. Nas imediações da Sé, que visitei de novo, na sua quase totalidade, apreciei o mercado da Ribeira, um mercado ao ar livre, muito sujo e barulhento. (1963.05.28 - Diário III)
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O Presidente da República, Américo Tomás, veio ao Porto inaugurar a Ponte da Arrábida (1963.06.22/23 - Diário III)
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Fomos ao Palácio de Cristal . Diverti me bastante, com a Fernanda e a Elvira [primas da D. Alexandrina] Jantámos no Restaurante Santa Luzia, na Feira do Palácio de Cristal"§. Andámos nos carros eléctricos 1963.05.16 - Diário III) (...).
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À noite não fui gozar o S. João [nas Fontainhas]. Preferi ir para a cama. Acordei às duas da manhã. Disso se encarregaram as minhas tias, Isabel e Teresa,  batendo-me suavemente (irra!) com os alhos e falando pelos cotovelos. (Diário III - pag. 1963) ( )
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À tarde fomos, o avô Luís e família, à Ponte da Arrábida, tendo percorrido a auto-estrada [neste tyempo a AE eram ... 5 km, até aos Carvalhos]. Em seguida fomos ao Palácio [de Cristal] onde jantámos. Escusado será dizer que andei nos automóveis eléctricos. Andei também nos barcos do lago. A princípio não sabia guiar aquilo, mas... aprender até morrer! (Diário III - 1963.06.30)
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À noite fui ver "Os Canhões de Navarone, no Asilo do Terço  Não sei porquê pensava que este era de raparigas. Mas afinal é para rapazes. (...) O cinema é ao ar livre, embora coberto com lonas. (1963.09.23 - Diário III)
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Vi na rua [de Santa Catarina] um grande ajuntamento. Logo compreendi o motivo: uma goesa vestida com um traje regional [sari e véu]. Foi preciso a polícia para dispersar aquela parolada toda, que assim demonstrava a sua estupidez, com ditos, assobios e piadas imbecis. (1963.10.24 - Diário IV)

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1966
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Se por   "ambiente do Porto" se entender a sociabilidade e amabilidade das suas gentes, talvez eu concorde. Mas em Lisboa também há pessoas simpáticas. Se a referência é a cidade em si, discordo, pois Luanda é mais moderna, embora com 4 séculos de existência, e mais airosa. Mas nem tu és de Luanda nem eu do Porto. (MEB - 1966.12.12)
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1967
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Não conhece Lisboa?

Então falemos um pouco desta tão cantada cidade, paraíso dos turistas. Podemos talvez fazer umas comparações com o Porto. Como todas as grandes cidades tem ruas ladeadas de casas, umas velhas, outras novas, automóveis, gente, muita gente, barulho (de prédios em construção, de buzinas, de travagens, pessoas que falam, pessoas de todos os feitios, para todos os gostos).

É mais alegre que o Porto: mais luminosa, mais ampla, com muitas ruas modernas, tal como em Luanda. Mas, como no Porto, também possui os seus bairros antigos, de vielas estreitas e tortuosas [como na Ribeira], tão estreitas que o vizinho do prédio em frente facilmente nos dá uma "bacalhoada". Esta é a parte que eu conheço pior. As outras são-me mais familiares.

Gosto de andar por estas ruas, cheias de gente, que anda em todas as direcções, com os mais variados destinos. Gosto... e não gosto. Podemos andar à vontade, sem encontrar alguém conhecido. Mas... nem sempre nos agrada a solidão que transpira por estas ruas. Cada qual preocupa-se quase exclusivamente consigo; é o preço das grandes cidades, onde os homens frequentemente se transformam em máquinas, em autómatos.

Enganar-me-ei ao dizer que no Porto respira-se um ar mais humano, menos artificial ?!!! De qualquer modo foi esta a impressão que me ficou da visita feita esta Páscoa e confirmada esta semana.

Mas entre o Porto humano, que me atrai, e esta Lisboa alegre, sem dúvida, cheia de sol, mas por vezes fria, irritante, continuo a preferi-la (MFR - 1967.08.02)
1968
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A Faculdade de Engenharia foi pintada de branco e encarnado, como o edifício do Banco de Angola em Luanda. No quintal em frente ao 330 da Rua dos Bragas [onde morava o meu avô materno] construíram um imóvel que vai até à esquina com a Rua de Cedofeita (a padaria foi demolida). Quem não gostou da brincadeira foi o avô Barroso, em cujo quarto deixou de bater o sol nos meses mais frios do ano. (NSF - 1968.05.04)
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Está uma tarde cinzenta e tristonha, ou não fosse o Porto a Londres portuguesa, fria e húmida, duma frialdade e duma humidade que nos trespassam invadindo todo o nosso ser até à medula; mas apesar disso, ao calcorrear as ruas do centro, bordejadas por edifícios pesados e graníticos, enegrecidos pela acção do tempo, parece-me que me encontro entre seres humanos, menos indiferentes que os da pombalina baixa lisboeta, pois uma misteriosa comunhão se estabelece entre nós.
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Dou por mim a reparar na multidão, que deixa de ser uma massa anónima, que se decompõe em pessoas. Respira- se um outro "ar", quiçá menos refinado ou "aristocrático" mas mais humano, mais caloroso. Esta sensação apodera-se de mim sempre que venho passar as férias ao Norte.
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A semana passada estive em Évora - o contraste entre estas duas cidades é flagrante. (ACG - 1968.09.12)

A CIDADE CONTINUA HÚMIDA, ESCURA, PESADA, TRISTE, FRIA. OS AZULEJOS DOS SEUS GRANÍTICOS EDIFÍCIOS PRECISAM DUMA BOA BARRELA. OS ELÉCTRICOS VÃO SENDO PROGRESSIVAMENTE SUBSTITUÍDOS PELOS CONFORTÁVEIS TROLLEYS E MODERNOS AUTOCARROS.

COMO EX LIBRIS DA CIDADE, A SUJIDADE E O DESMAZELO IMPERAM NOS TRANSPORTES PÚBLICOS, TAL COMO SUCEDIA (AINDA SUCEDERÁ?) EM LUANDA E AO CONTRÁRIO DE LISBOA.

A CASA DA RUA DOS BRAGAS FOI PINTADA DE VERDE CLARO E AS PORTAS DE VERDE MAIS ESCURO. NO TERRENO QUE SE ESTENDE DA CAPELA DOS ANJOS À RUA DE CEDOFEITA CONSTRUIU SE UM COMPRIDO PRÉDIO DE DOIS OU TRÊS ANDARES, DE TRAÇO ARQUITECTÓNICO ESQUISITO. NA ESQUINA ABRIU UM CAFÉ, MUITO "MAL FREQUENTADO"-. E FALO ASSIM, POIS COMO CLASSIFICAR OS ESTUDANTES, QUE OCUPAM CADEIRAS E MESAS DURANTE HORAS, A TROCO DUMA BICA OU DE UM PINGO (O ALFACINHA GAROTO) ?! (NSF - 1968.09.16)
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1969
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 Não encontrei nenhum postal de jeito no quiosque do café onde vim lanchar com a Belinha, depois de vermos um filme risonho: “O Gendarme Casa-se”. Cheguei ontem de Lisboa, permanecendo aqui uns dez dias. O avô e as miúdas encontram-se bem. Só falei com o avô Barroso pelo telefone.  Almoçarei com ele depois de amanhã; à tarde daremos uma volta pelos arredores e iremos à casa do Mindelo que se encontra quase pronta. Saudades da Belinha. (NSF 1969.10.12)
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Afinal sempre vou ao Porto passar parte das férias. Ficarei em Rio Tinto até ao fim do mês. O José João dá-me boleia a partir de Lisboa. As aulas recomeçam a 5 de Janeiro. Essa saúde, como vai ?
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Não sei se vos escreverei antes do Natal. Se o não fizer, aqui ficam os meus votos de felicidades e um saudoso e amigo abraço para todos.  Talvez aceite o convite da Maria Arnalda e passe uns dois dias com ela e família [na Figueira da Foz].. (NSF 1969.12.18)
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Lisboa está cheia de movimento e colorido. Encontrei há pouco o casal Armindo Gonçalves no Rossio. Sigo amanhã para o Porto com o José João. Vou jantar com um amigo meu e depois vamos ao cinema.  (NSF 1969.12.19)
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As fé[rias] [....]ido bem aqui no Por[to ...]ei todos bem. Hoje fomos ( [...], o José João, o Zé e o avô Barroso) ao Mindelo ver a casa que este está lá a construir, [...] airosa. Desde há quase [...] que ansiosamente aguardo [notícias] vossas, em vão! E no en[...] -vos vários postais, ( [...] ao Porto! Regressaremos a [...] próximo sábado, 3 Janeiro. Te[... de] ir ao médico (Dr. Dinis [da Gama] )2ª feira, pelo que só devo regressar a Évora no dia [segui]nte, já com 24 nem sempre [...] primaveras. É madru[gada ... ] de 69. Mais logo, [...] talvez vos escreva m[ais longamente]. Um bom ano para vós. E também para o casal Bragança, Maria Antónia, Leonor e família (NSF 1969.12.31)
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 1970 
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Estamos num novo ano, uma nova década que se inicia. O dia está a pôr-se bonito (São 14 horas). As férias estão quase a terminar e os exames aproximam‑se. Recebi ontem e finalmente notícias vossas. A véspera de Natal passei-a com o avô Luís e o dia de Natal com o avô Barroso. Logo talvez vá lá a casa. Afinal, e com certa mágoa, resolvi não aceitar o convite da Maria Arnalda, por falta de ocasião propícia (NSF 1970.01.01)
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Finalmente aqui estou notícias. A Mãe que desculpe esta demora. Cheguei a Lisboa sábado à noite e parto amanhã de manhã para o Porto, onde ficarei em casa do avô Luís. Dentro duns dez dias passarei de novo em Lisboa, rumo ao burgozitomedieval. Vamos ver se vos escrevo mais longamente. Preciso de saber informações sobre o curso de Economia (há semanas que a Mãe deixa para o dia seguinte). Preciso também dum certificado de residência de um de vós para a passagem das férias. O Banco pagou-me as massas. (NSF 1970.03.11)
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Afinal não embarquei para o Porto. Uma série de sintomas, que o Dr. Dinis da Gama diz serem de gripe, forçaram-me a permanecer em Lisboa. Mas não é nada de grave. Talvez já amanhã regresse a Évora, para passar o resto das férias. Desde ontem que estou em casa do sr. Pacheco.  Não vos esqueçais de enviar-me para Évora um certificado de residência, vossa, aí em Luanda. Para além das sebastiânicas notícias sobre a Faculdade de Economia (nomeadamente estrutura e quadro das cadeiras do curso) Ah!, já me esquecia: o Dr. Dinis da Gama envia-vos cumprimentos. Que é feito da Leonor? Não chegou a dar-me as tão prometidas notícias!  (NSF 1970.03.19)
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São quase horas de jantar. Passei o dia com malta amiga numa Quinta dos arredores; foi agradável! Estudei umas coisas e a agora escrevo-vos, brevemente. Uma direcção da Associação[dos Estudantes do ISESE]  terminou o mandato e outra tomou posse: passei de Vice-Presidente a Secretário. Claro, estou na nova Direcção. Rever os estatutos, tornando-os mais flexíveis e funcionais, e dinamizar a Junta dos Delegados de Curso são as duas principais metas que nos propomos. Dentro de 13 dias começam as férias. Vou ao Porto, onde quero ver se consigo participar num Encontro sobre Cinema Português. (NSF 1970.12.06)
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É um domingo maravilhoso. Ontem estive em Setúbal. Falei com o dr. Armindo [Gonçalves]. Jantei com a Noémia. Amanhã ou depois encomboio para o Porto, onde ficarei até 1 ou 2 de Janeiro. Bom Natal. Gostei das últimas cartas da Mãe..(NSF 1970.12.20)
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Enquanto que o avô Barroso e o tio aguardam que a Maria Luísa saia da missa, eu vim até ao café para aquecer um pouco. Está muito frio! Encontrei todos bem, dentro da relatividade do costume. Almocei e jantarei na Rua dos Bragas. Lá para o meio da próxima semana regressarei a Évora, c/ uma breve estadia em Lisboa. Talvez vá a Aveiro com o avô Luís, na próxima 2ª feira. Se tivesse trazido papel escrever‑vos‑ia mais longamente. Um postal, por várias razões, não o permite. Estou na casa do Mindelo, que me agradou. Está mobilada com bom gosto. Como vai isso por aí? Gostei da última carta da Mãe e fiquei contente pela sua alegria. O ar do café está turvo, mas o frio foi‑se. O pior será o ar gélido daqui a pouco. Espera‑se uma reforma do ensino em Portugal. Dentro de dias será tornada pública. Aguardo‑a com interesse (NSF 1970.12.25)
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Hoje tentei pôr a correspondência em dia, mas aquilo está tão atrasado que devem ser necessários uns longos serões. A partir da recepção deste postal devereis começar a escrever‑me para Évora. Espero que tenhais recebido o SDS que enviei na véspera de Natal.. Que mais dizer? Estou na estação dos  CTT da Batalha; a escrivaninha treme que se farta com o esforço que um "hominho" faz para fechar um envelope. Uma mulherzinha procura quem lhe preencheu um telegrama para dar‑lhe qualquer coisa. E ao contar‑me isto poisa‑me a mão no braço. Gosto da gente do Porto; parece‑me mais humana que a de Lisboa e de Évora. (NSF - 1970.12.26)
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1971
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Com uma breve estadia em Lisboa, muito enfastiado, faço horas, ou dias, para regressar a Évora; hoje, amanhã ou depois. Efeitos, talvez, duma noite mal dormida, duns dias estupidamente passados. Linda disposição para o primeiro dia do ano. Mas amanhã, bem dormido ou já em Évora, talvez me passe a neura. Estou na Farmácia [Sanitas] onde a tia [Esperança] procede ao inventário.  (NSF 1971.01.01)
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 Cheguei há pouco, vindo de Lisboa. É bom encontrar de novo as paredes e as caras familiares, até que o aborrecimento de Évora nos faça esquecê‑lo. Dizem que está frio; não o tenho sentido, e a brisa da noite que entra pela janela escancarada é repousante e refrescante. Vou pôr este no marco [do correio] para apanhar a tiragem da uma da madrugada, e comer qualquer coisa, pois não tive tempo de jantar em Lisboa. Em cima da mesa estava um bilhete da Mãe, já do ano passado. Creio ter recebido todas as cartas. Além das "broas" e da massa de Dezembro. Em Lisboa e no Porto todos ficaram bem. (NSF 1971.01.02/03)
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1972
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Curso sobre o Movimento Operário Português - Confronto SCRL, Porto 1972 Janeiro/Fevereiro
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1974
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(Sabes, não estou contente pela nossa ausência um do outro) Bem, este postal já começou a ser escrito há muito. Depois .... ficou arrumado a um canto. Já estou no Porto. Jantei em casa do avô Barroso e daqui a pouco vou para casa do avô Luís. A viagem foi boa, embora tenha chovido a meio do caminho. A paisagem é simplesmente maravilhosa - tão verdejante! Gostaria de viver por estas bandas. E tu? Gostaria de ver contigo estas paisagens! Sábado deves escrever‑me para Lisboa e 2ª para Évora. OK? O tio Zé, a 1ª pergunta que me fez foi "Então a tua mulher, onde está?"  Ah! Ah! Ah! Não há nenhum filme de jeito aqui no Porto. Safa! (MCG 1974.04.1

Safa, que o Porto é frio, duma frialdade enregelante. Estou aqui num café na Rua Formosa, aguardando o pequeno-almoço. A casa do meu avô Luís está superlotada - os meus tios [Zé João e Lili] estão lá - e resolvi ficar numa pensão, que só de pensar nela me arrepio. Ali a Pensão Brasil (3 estrelas) já deve ter tido uma certa categoria - no tempo em que as pensões eram uma casa, mas agora está em franca decadência, porca, suja e desleixada. 100 paus é a diária dum quarto num quinto andar. Enfim...
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O velho, dono da pensão, estava ontem às voltas com um dedo entalado, enrolado num pano que enchia a casa de cheiro a vinagre. Aconselhei o a pôr o dedo em água quente e hoje lá me foi dizendo que estava melhor. (...)
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No Porto, nova aventura: onde ficar? Pego na lista telefónica, retiro uma série de endereços de pensões e... nova preocupação. E então, os preços?! Pego em mim e venho andando, tentando adivinhar a categoria da pensão - e consequente modicidade do preço - pela fachada. E assim caí [nesta] espelunca. (MCG - 1974.09.22)
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1975
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Almocei com o Carlos e o Luís Filipe, mais duas companheiras de trabalho daquele. O almoço estava mesmo saboroso. Fui ao cinema: o filme era uma "chachada": mulheres nuas, relações sexuais nas posições mais variadas, enfim, km de celulóide para vender, sem gosto ou interesse. Já era tarde para jantar em P.Arcos e dei uma volta, acabando por vir dar a um restaurantezeco aqui no Cais do Sodré, mesmo na rua dos bares e das prostitutas. Na cadeira ao meu lado ronrona um enorme gato. São 20h30m e sinto-me cansado e desolado. Se estivéssemos juntos seriam 15 dias maravilhosos; assim ... passeio o meu enfado pelas ruas que percorro.  Amanhã vou para o Porto, ver a família de quem tenho saudades. Mas não vou contente, porque me sinto sózinho, para além da tua ausência. Devo regressar na 3ª feira próxima, direito a Évora.
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Que mais dizer-te, amiga? Que sinto a tua ausência, que estou desolado, que isto tudo é uma estupidez: tentar conciliar o inconciliável! O bife já veio e o gato lambe as patas.
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As tuas férias, como têm corrido? E o teu pai, como está? Deixo-te as minhas saudades e carinho. Saudades dos meus pais e tios. Cumprimentos á tua família. (MCG 1975,03.25)
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Aqui vim até ao Porto, aproveitando a boleia do José João. As aulas recomeçam 4ª feira próxima - 2 ABR. Como vos disse - em postal anterior - as coisas não se proporcionaram para ir até Angola, com era minha intenção. Por cá as coisas vão correndo embora tudo leve a crer que o futuro não será muito pacífico. Há uma ruptura - consequente - entre as forças da esquerda reformista (Partidos Socialista e Comunista, nomeadamente) e a esquerda revolucionária; ainda não se encontrou uma plataforma comum de entendimento. Entretanto a direita aguarda ou trama na sombra. Enfim ... A família por cá vai andando, penso que na normalidade do costume. Politicamente o avô Barroso é mais progressista que o avô Luís. Quanto à CELESTE,  tudo como dantes: [...]. O mal também deve ser dela e das suas estruturas mentais e contra isto ...., batatas. Estou farto deste desassossego e desentendimento.(NSF 1975.03.26)
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No Porto as ruas e as pessoas são diferentes. A cidade é suja de papéis e lixo pelas ruas. E nas paredes os cartazes do PC são mais atractivos. Nalgumas praças há bancas dos partidos políticos de esquerda. (MCG - 1975.03.26)
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Apesar do boletim meteorológico, este fim de semana pascal foi soalheiro e límpido. Com o meu avô Luís; José João e resto da família fomos almoçar a Viana do Castelo. Gosto muito destas paisagens.
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Por cá fiz algumas compras. Pouca coisa: duas camisas e, como não podia deixar de ser, livros. Entretanto encontrara em Évora a lista dos temas de Geografia e dos livros aconselhados para literatura. Em Évora procurarei tratar disso. (MCG 1975.03.31)
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Depois de Leiria, a caminho de Lisboa, enquanto espero pelo almoço, te envio um aceno. Está um dia lindo de sol. No entanto esta parte da cidade é corriqueira. A única que acho interessante é aquela em que ficámos, meses atrás [quando vieste conhecer a minha família]. Do Porto o meu avô Luís mandou "um abraço para a cachopa" (Ah!Ah!Ah!) enquanto o meu tio Zé [Barroso] ficou muito "preocupado" com os nossos diferendos, porque tu és "boa rapariga", até "apreciaste os escritos dele" Enfim ... O resto da família manda-te cumprimentos. Bem, tenho de voltar ao restaurante. (MCG 1974.04.01)
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1994
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Finalmente hoje á tarde fui dar um passeio turístico, aqui pelos arredores {do Mindelo], de estradas estreitinhas, com muros de pedra e latadas, ou campos verdejantes. Tirei algumas fotografias para a colecção. Nada mais tenho programado a não ser irmos a Braga, na próxima 6ª feira, e ao Porto um dia destes. Os dias melhoraram, estão mais quentes, mas não me apetece ir á praia. Fora isso vou ás compras e passeio‑me por Vila do Conde e Póvoa de Varzim.
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Bem, tenho de ficar por aqui, que o barulho é muito, com o Rui a ouvir TV enquanto a Susana e a minha Mãe falam comigo enquanto escrevo. (MFP 1994.08.23)
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Então, como vai essa disposição? Então com uns dias de sol e céu azul andas com a torneira das lágrimas em rios caudalosos? Vamos lá a pôr um sorrisinho aberto e primaveril, valeu?!
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Gosto muito deste postal, embora nunca tenha estado no claustro do afamado Convento de Sta.Clara.
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A ida ao Porto ficou adiada para amanhã, pelo que daqui a pouco vamos até á Póvoa ao cinema.
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Suponho que os arcos que se vêm para lá da fonte são um dos ramais terminais do chamado Aqueduto de Santa Clara, que outrora transportava água para Vila do Conde e constitui um dos seus "ex‑libris".  Por aqui me fico, com um abraço e ternurinhas   (MFP 1994.08.24)
 

ADENDA -
Filmes que vi no Porto em 1962/63
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No dia 13 [Maio 1963] fui ver "O Parque das Ilusões ", no "Águia d'Ouro". Era um filme português, sem pés nem cabeça, como é costume. Interpretado por Laura Alves, Américo Coimbra, Eugénio Salvador. (Diário III - pag. 165)

No domingo, 26 [Maio.1963] vi dois filmes no Coliseu: "Atlas" e "Uma Rapariga nos teus Braços". Gostei mais deste último.(Diário III - pag. 171)

Vi dois filmes: "Radio Patrulha “ no Olímpia, e "O Pombo que Conquistou Roma” , no Rivoli. Gostei muito do primeiro [bastante bom] ,  o segundo comia‑se [uma comédia razoável]. (MEB - 1963.05.25) [Diário III - pag. 168)

[Em Junho de 1963] vi no programa 7ª Arte o filme "O Homem das Sete Vidas", com Danny Kaye. Era sofrível. (Diário III)

Á tarde fui ao Coliseu [do Porto] ver o filme "A Noiva", o último que vi em Luanda antes do meu embarque. Vê‑se com agrado, com boas interpretações de António Prieto e Elsa Daniel. As músicas ouvem‑se com muita satisfação, excepto "Los ojos del diablo", de que não gostei muito. (1963.06.01 - Diário III)

Fui ao Batalha ver o filme "A Coragem é a Senha". Embora fosse cómico, não gostei muito dele. Esperava outra coisa. (1963.07.08 - Diário III)

Fui ao Coliseu [do Porto] ver os filmes "Robin dos Bosques" e "A Conquista do Oregon". Eram sofríveis. No Águia vi "A Epopeia do Pacífico”, filme razoável, com algumas cenas bastante boas. Na TV vi "A Vida de Tom Edison”, com Spencer Tracy. Óptimo (1963.07.21 - Diário III)

Na TV vi o filme "Bola ao Centro", que não era grande coisa [a gravação sonora era má]. (1963.07.30 - Diário III)

Vi na 7ª Arte, da TV, o filme western "7 Homens Maus". Tinha algumas cenas boas, mas no conjunto não me agradou. (1963.08.06 - Diário III)

Vi no Olímpia (Porto) o filme "Alamo", com John Wayne. Gostei, não obstante o princípio ser um tanto ou quanto parado. Na TV  vi "Madame Curie", de que gostei. (1963.08.18/21 - Diário III)

Fui ao Coliseu ver "O Império do Crime" com James Cagney. Era regular. (1963.08.23 - Diário III)

Fui ao cinema [em Monte Real] ver "O Diabo às 4 horas", com Frank Sinatra e Spencer Tracy e  "Que Rico Par de Meias",  uma comédia bastante "chalada", com a Marujita Diaz. (1963.08.27/31 - Diário III)

Vi na TV o filme "A Vida de Reuter", que era bom (1963.08.27/31 - Diário III)

Fui ao Olímpia (Porto) ver "O Homem que Matou Liberty Valance", com James Stewart e John Wayne. Nos três filmes do John Wayne (O Dia mais Longo, Álamo e este) [este] tem sempre um papel irónico ou coisa que valha. (1963.09.11/14 - Diário III)

Na 7ª Arte vi "A Nobreza Corre nas Veias", com Mickey Rooney, Elizabeth Taylor e Donald Crisp. A Liz Taylor tinha nessa altura 12 anos (1944). Gostei imenso do filme que, principalmente no fim, era emocionante.  (1963.09.15/18 - Diário III)

Á noite vi "Os Canhões de Navarone", no Asilo do Terço. Gostei do filme, que era deveras emocionante.  (1963.09.23 - Diário III)

Na RTP vi "Aniki-Bóbó" de Manuel de Oliveira. O filme é interpretado por um grupo de miúdos e passa‑se no Porto, nomeadamente na Ribeira. O filme não era mau, na minha opinião o melhor filme português que já vi. O argumento é razoável.  (1963.09.24/25 - Diário III)

Fui ao Águia ver o filme "O Senhor Xis", que se via com agrado, embora tivesse alguns contra‑sensos. O principal actor, que também realizou, é Nigel Patrick, que tem algumas semelhanças com John Wayne.  (1963.09.26/28 - Diário III)

Fui ao Batalha ver "55 Dias em Pequim". Era bom, com cenas emocionantes, e baseava‑se no cerco de Pequim pelos "Boxers" em 1900. Não gostei muito do desempenho da Ava Gardner. Charlton Heston e David Niven saíram‑se bem.

Na "7ª Arte" da TV vi "Uma Furtiva Lágrima" com Alfredo Kraus no papel do cantor lírico Gayam [?]. O filme tinha árias de ópera bastante agradáveis. (1963.10.01 - Diário IV)

Fui ver no Rivoli "Balalaika", filme essencialmente musical. Foi produzido há umas dezenas de anos mas vê‑se com agrado. (1963.10.2/4 - Diário IV)

Fui ao Batalha ver "A Quimera do Ouro", com o Charles Chaplin. Foi realizado em 1925 e reeditado em 1942, com música e comentários de Chaplin. O filme tinha saltos bruscos, como se estivesse cortado. Via‑se com um certo agrado. (1963.10.05 - Diário IV)

À tarde fui ao Coliseu (do Porto) ver o "Amor sem Barreiras" (West Side Story). O filme é óptimo, com um bom colorido, música e bailados. O argumento inspira‑se no "Romeu e Julieta" [de Shakespeare]. Trata‑se da rivalidade entre dois grupos de West Side [bairro de New York]: os Jactos, americanos, e os Tubarões, porto‑riquenhos.  Termina com uma briga em que morrem os dois chefes e um outro é assassinado. Gostaria de vê‑lo outra vez [Acabei por ver este filme umas 4 vezes, no Porto]. (1963.10.07 - Diário IV) (1)

Na TV vi o filme "Ninotchka", com a Greta Garbo. Não era mau mas não era grande coisa. Era para rir. (1963.10.08 - Diário IV)

A TV apresentará o filme "A Família Minniver", com Greer Garson, Walter Pidgeon (intérprete de "Mme. Curie") e Teresa Wright. O filme era bom e valeu um ÓSCAR a William Willer (realizador) e a Teresa Wright (actriz secundária). O argumento e a música eram agradáveis. (1963.10.15/16 - Diário IV)

A TV apresentará, cerca das 20:00, o filme "A Loja da Esquina", com James Stewart. O filme era bom, bastante cómico. O realizador foi o mesmo de "Ninotchka", Ernst Lubitschk. Com poucas excepções desenrola‑se na loja da esquina. Um rapaz corresponde‑se com uma rapariga, no fim ficando surpreendido por se encontrarem. Ela não era outra senão uma das empregadas da loja onde ele trabalhava. (1963.10.22/23 - Diário IV)

À tarde fui ao "Carlos Alberto" ver "Uma Parisiense" e "O Salário do Diabo", o primeiro com Brigite Bardot, Charles Boyer e Henri Vidal, o segundo com Jeff Chandlers (que vira na "Epopeia do Pacífico") O primeiro era uma comédia um pouco livre (e está censurado!). Via‑se com agrado. Da segunda vez que estive em Pointe Noire vira a apresentação deste filme.

Ao segundo não assisti ao princípio. Era razoável, com algumas cenas emocionantes. Passava‑se no Oeste moderno. (1963.10.29 - Diário IV)

Ontem vi "A Grande Valsa”, a vida romanceada de Johann Strauss. O filme era bom e gostei das "Grande Valsa" e "Danúbio Azul". (1963.11.4/6 - Diário IV)

Terminou [no "Museu do Cinema" da RTP]  o filme "O Taxi 9297" de Reinaldo Ferreira. Pelos comentários do cineasta António Lopes Ribeiro o filme está tecnicamente bem feito. Contudo o entrecho não é grande coisa. Opinião pessoal. (1963.11.10 - Diário IV)

Umas observações ao filme da 7ª Arte "Nunca Digas Adeus", com Errol Flynn e Eleanor Parker. Uma comédia boa, embora não seja uma obra prima. A música de fundo era boa, mas o princípio um pouco parado. Tenho pena de não ter visto "Objectivo Burma", com o mesmo actor, já falecido [Acabei por ver este filme mais tarde]. (1963.11.12 - Diário IV)
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Foto Victor Nogueira

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  • Alice Coelho beijinhos

  • Isabel Magalhães Lamento, mas acho que exageras na maneira como falas do Porto e da sua gente, que tão bem te acolheu. O Porto não tem tanta luminosidade, como a capital, mas tem sol, tem calor humano. Muitas pessoas não entendem a simplicidade das pessoas do Porto, como são genuínas e verdadeiras e confundem com "parolice".

  • Fernanda Angius · 3 amigos em comum
    Conheci o Porto em 1957. Tinha casado recentemente e fui de Vespa de Lisboa até ao Porto. Fiquei chocada com o vocabulário das "senhoras" que, no Coliseu (na época o mair cinema da cidade), no intervalo de um famoso filme da não menos famosa atriz, Elysabeth Tailor, "Ela e os seus maridos", comentavam as cenas mais ou menos ousadas. Eram palavras interditas na boca de uma senhora vestida de peles e adornada com jóias valiosas. Eu também não ouvira da boca de meu pai um palavrão.... e eu também não dizia merda...

  • Fernanda Angius · 3 amigos em comum
    Fiquei com a nmesma impressão de cidade triste suja, sobretudo quandoo, ao passar numa das ruas da Ribeira, descendo para o Douro, uma senhora deitou pela janela fora os restos da hortaliça que preparava para o almoço e que só por um jogo de corpos nos não caiu em cima.

  • Fernanda Angius · 3 amigos em comum
    Porém, a cidade que eu hoje frequento bastante é muito diferente. Ganhou em vida e em alegria e julgo que a linguagem dos tripeiros já não choca ninguém num tempo em que uma criança de 12 ou 13 anos diz à professora: "Ó Sôtoura, va-se...!"

  • Fernanda Angius · 3 amigos em comum
    Esta foto é certamente o retrato da cidade de Raúl Brandão...


  • Victor Nogueira Isabel Magalhães Parece-me que não leste com atenção. Logo no início da minha nota escrevi - «Embora gostasse das pessoas do Porto, do calor humano que sentia nas ruas (…)»
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    Em 1966, em carta para a minha mãe, dizia: «Se por "ambiente do Porto" se
    entender a sociabilidade e amabilidade das suas gentes, talvez eu concorde. Mas em Lisboa também há pessoas simpáticas»
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    Dois anos depois, em 1968, escrevia a alguém que me não lembro quem era: «mas apesar disso, ao calcorrear as ruas do centro, bordejadas por edifícios pesados e graníticos, enegrecidos pela acção do tempo, parece-me que me encontro entre seres humanos, menos indiferentes que os da pombalina baixa lisboeta, pois uma misteriosa comunhão se estabelece entre nós.
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    Dou por mim a reparar na multidão, que deixa de ser uma massa anónima, que se decompõe em pessoas. Respira- se um outro "ar", quiçá menos refinado ou "aristocrático" mas mais humano, mais caloroso. Esta sensação apodera-se de mim sempre que venho passar as férias ao Norte.»
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    Em 1970, no Natal, relatava para casa, em Luanda: «Estou na estação dos CTT na Batalha; a escrivaninha treme que se farta com o esforço que um "hominho" faz para fechar um envelope. Uma mulherzinha procura quem lhe preencheu um telegrama para dar-lhe qualquer coisa. E ao contar-me isto poisa-me a mão no braço. Gosto da gente do Porto; parece-me mais humana que a de Lisboa e de Évora»
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    E em muitas cartas refiro as saudades, como nesta à Celeste, em 1975: « Amanhã vou para o Porto, ver a família de quem tenho saudades. »
    .
    Tendo vivido em muitas terras, todas com usos e costumes diferentes, e convivido com muita gente, de todas as classes e camadas sociais, tenho a minha opinião sobre o que me pareceu positivo ou negativo, tal como tu sobre a “moirama”. Mas o Porto perdeu para mim o encanto que teve enquanto os meus avós e o teu pai foram vivos. O Porto é para mim agora uma terra onde me perco por ter perdido as referências físicas, uma terra cujas pessoas me parecem menos calorosas, mais agrestes e com pouco espírito cívico, sobretudo na condução automóvel, para além do que refiro na altura por quem usava os transportes públicos.
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    E todas as terras há o equivalente dos “parolos”, sejam chamados de “saloios”, “galegos”, “futricas”, “campónios”, “calcinhas” …. Talvez a “humanidade” do Porto fosse resultado de ser uma “aldeia grande”, a aldeia grande a que se referia com bonomia o meu avô e teu pai.
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    E no entanto também me cativaram as gentes das aldeias e dos montes do Alentejo, da Beira Baixa – sobretudo da Covilhã - de Trás-os-Montes e do Barreiro. Ao contrário do que me sucedeu e sucede em Lisboa, Setúbal ou Évora. E os meus amigos e colegas de Évora não se zangam comigo pelo que digo de évoraburgomedieal, talvez porque os alentejanos – como sucedia com a Celeste e o teu pai e meu avô – tenham um sentido do humor e da ironia – sentido do humor e da ironia que faz com que repitam as anedotas sobre eles e se riam delas.
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    E hoje já não fico no Porto; quando vou ao Norte ou fico por vezes em tua casa ou, com mais frequência, na de Verão que era a do meu avô materno, no Mindelo.
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    Mas tu, a Teresa e o Carlos têm sempre um lugar no meu coração e afecto, que acredito me retribuem.
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    Bjos

  • Margarida Ourives Não conheço o porto, infelizmente

  • Margarida Piloto Garcia Estas crónicas da tua vida deixam-me sempre uma espécie de saudade do que não vivi. Não tive esta vida tão fascinante, por aqui e por ali, com vários personagens carismáticos. No entanto sinto que desperdicei no tempo aquilo que a escrita deveria ter guardado para mais tarde recordar. Mal conheço o Porto mas viajo contigo pelas tuas memórias.

  • Graca Maria Antunes Estes diários ou crónicas, como diz acima a Margarida, trazem até nós ecos de um tempo perdido.O Porto dessa altura, as pessoas que faziam parte da tua vida e as andanças de um jovem à procura do seu caminho... Digo-te, Victor Nogueira, que gosto de ler!. Conheço mal o Porto, mas partilho a opinião de uma cidade escura, triste...Mas há muito tempo que não vou lá...

  • Victor Nogueira Olha, Isabel Magalhães Fui reler o que escrevi sobre Lisboa no meu Livro de Viagens e encontrei esta passagem duma carta minha à tua prima Fernanda, em 1967. E sabes como eu também gostava dela e das irmãs, a Elvira e a Amélia, ou da tia Maria, tia minha por empréstimo, afecto meu que por elas também era retribuído

    «Não conhece Lisboa ? Então falemos um pouco desta tão cantada cidade, paraíso dos turistas. Podemos talvez fazer umas comparações com o Porto.

    Como todas as grandes cidades tem ruas ladeadas de casas, umas velhas, outras novas, automóveis, gente, muita gente, barulho (de prédios em construção, de buzinas, de travagens, pessoas que falam, pessoas de todos os feitios, para todos os gostos).

    É mais alegre que o Porto: mais luminosa, mais ampla, com muitas ruas modernas, tal como em Luanda. Mas, como no Porto, também possui os seus bairros antigos, de vielas estreitas e tortuosas [como na Ribeira], tão estreitas que o vizinho do prédio em frente facilmente nos dá uma "bacalhoada". Esta é a parte que eu conheço pior. As outras são‑me mais familiares.

    Gosto de andar por estas ruas, cheias de gente, que anda em todas as direcções, com os mais variados destinos. Gosto... e não gosto. Podemos andar à vontade, sem encontrar alguém conhecido. Mas... nem sempre nos agrada a solidão que transpira por estas ruas. Cada qual preocupa‑se quase exclusivamente consigo; é o preço das grandes cidades, onde os homens frequentemente se transformam em máquinas, em autómatos.

    Enganar-me-ei ao dizer que no Porto respira-se um ar mais humano, menos artificial ?!!! De qualquer modo foi esta a impressão que me ficou da visita feita esta Páscoa e confirmada esta semana.

    Mas entre o Porto humano, que me atrai, e esta Lisboa alegre, sem dúvida, cheia de sol, mas por vezes fria, irritante, continuo a preferi-la» (MFR - 1967.08.02)

    Vês, como eu não digo mal dos tripeiros. Aliás a casa dos meus pais em Luanda sempre foi uma casa de portas abertas e onde todos eram bem acolhidos e se sentavam à nossa mesa, desde o operário ao doutor, qualquer que fosse a cor da pele. Afinal os meus pais são do Porto, de Cedofeita, como fazia questão de frisar o meu pai.

  • Judite Faquinha Victor! Para mim, as opiniões são muito complexas... tirando as cidades que mencionas-te!!!Eu te digo uma cidade que me disseram vai ver que vale apena! Em Espanha, Vigo... pois a minha opinião, foi o que sentis-te pelo Porto!!! Escura e triste, já lá vão três decacdas... não estão as pessoas em causa!!! Eu gosto muito do Porto e de toda a sua envolvência...mas a parte mais antiga é como Lisboa, muito velhas e porcas, as pessoas do Porto, e todo o Norte são mais hospitaleiras do que nós!!! Não tenho qualquer dúvida, além da sua frasiolugia, a que eu me abituei desde 79!!! Também cá, nós não é costume nosso dizer palavrões, mas ás vezes sai!!! No Norte chegamos, é uma festa mas, fazem questão de nos mostrarem a sua terra... não têem carro mas á logo apareçe um outro amigo... á ordem com o seu carro salvar a situação, e nos levam a todo o lado que para eles é lindo!!! Deste lado isto não se encotra, eu não conheço!!! quanto á tua vivência, é espetacular... eu também vi os canhões de navarone, e tenho o livro!!! Obrigada Victor bjs.

  • Judite Faquinha Victor desculpa!!! Eu não mencionei...o Alentejo, porque é lindo demais, limpo e cuidado de outra maneira... um monte ao longe brilha a sua brancura com barras azuis ou amarelas, lindas, nas vilas e cidades por onde andei, sempre encontrei limpeza... eu adoro o Alentejo... a minha segunda mãe e segundo pai eram de Estremoz, e os meus amigos do peito são todos Alentejanos... só tenho um de Alhos Vedros, e outro da sona de Castelo Branco!!! bjs.
  • Yolanda Botelho Pára de dizer mal do Porto,uma cidade linda, mas só para quem a sabe compreender.....linda repito.Se calhar não entendeste a alma dos portuenses,nem a sua forte personalidade.Nem toda agente gosta do Porto e ainda bem...é sinal que não é banal.
  • Victor Nogueira Yolanda Botelho estás mesmo a desiludir-me. Tu leste o que eu escrevi ? Ora faz favor de ler não só o corpo da nota como os meus comentários subsequentes ! Francamente, Yolanda, deixas-me mesmo triste com os teus comentários que indicam que não me leste. Olha, rio-me, encolho os ombros e prossigo nas minhas jornadas !
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